segunda-feira, novembro 30, 2009

A entrevista de António Barreto ao "i" e o desaparecimento de Portugal

“Estamos à beira de iniciar um percurso para a irrelevância, talvez o desaparecimento.”, afirmou António Barreto ao “i.

Bom, tenho grande respeito pessoal e intelectual por António Barreto, mas será exactamente isso que me leva a considerar que Barreto, num momento de rara fraqueza, apenas terá pretendido, com esta boutade (nada mais é do que isso), garantir um título que levasse os portugueses a ler a sua entrevista, onde existem análises e afirmações bem mais estruturadas e interessantes. Como Barreto, enquanto sociólogo, bem sabe, as sociedades e civilizações nascem, evoluem, atingem o seu apogeu e, eventualmente, acabam por entrar num período de decadência e desaparecer, dando lugar a outras. Entre guerras, dramas, luta política, catástrofes, vitórias e derrotas, desastres e cometimentos de excepção... É assim a História do nosso mundo e assim aconteceu com o antigo Egipto, os impérios romano e otomano, o comércio fenício, o apogeu da civilização mediterrânea, os Incas e os Aztecas, os grandes impérios europeus do século XIX e por aí fora. Um dia, o homem, até mesmo nosso próprio planeta extinguir-se-ão. Acenar, pois, com a irrelevância portuguesa (não terá sido já mais irrelevante no passado dos séculos XVIII e XIX do que é hoje enquanto membro da UE e da zona euro?), talvez com o seu desaparecimento (quando? como? anexado pela Espanha? incluído no horizonte de uma possível decadência da civilização ocidental?), dito assim, como o afirma António Barreto, algo aí ao entreabrir da porta, pode ser de facto chamativo (e a entrevista merece leitura), mas (e que me desculpe Barreto) não será muito honesto, muito menos rigoroso (e Barreto habituou-nos ao rigor) e, até, reputo, a puxar ao demagógico, contribuindo assim para encorajar a onda populista que por aí vai grassando, em vez de conduzir a uma análise rigorosa dos problemas e ao caminho para a sua resolução.. E, caro António Barreto, de si não esperamos isso: estamos habituados a esperar sempre o melhor. Culpa sua, claro.

Link Wray & Dick Dale (5)

Link Wray - "Jack the Ripper"

domingo, novembro 29, 2009

Da verde Irlanda...

Seria interessante que governo e partidos da oposição dedicassem algum do seu mui precioso tempo a pensar nisto. E, já agora, que os "media" e o "povo da SIC" deixassem por momentos de saltitar de "escândalo" em "escândalo" e dedicassem algum espaço e tempo, no primeiro caso, ou os cinco minutos de fama concedidos pelos fóruns de opinião, no segundo caso, para pressionarem governo e partidos da oposição a reflectirem e tomarem medidas para que por cá o caso se não repita. Por último, talvez não fosse também nada má ideia que alguns comentadores e políticos, antes de se precipitarem ao apontar e/ou copiar casos de sucesso efémero, analisassem esses casos com maior seriedade.

SIX - FIVE Special (1)

1. Jim Dale - "Sugar Time"; "The Train Kept A-Rolling"
2. The Ken-Tones - "The Gipsy In My Soul"
3. Desmond Lane - "Midgets"

Algo que não me sai da cabeça...

Como benfiquista, o que me tem mantido irritado desde ontem é a convicção de que raramente o meu clube terá encontrado um Sporting tão fácil de vencer em Alvalade e que isso só não terá acontecido porque o SLB esteve todo o tempo com medo de perder.

sexta-feira, novembro 27, 2009

A LPFP, as forças policiais e os "jogos de alto risco"

Talvez fosse chegada a altura da LPFP, responsável pela organização dos campeonatos profissionais de futebol em Portugal, chegar a um acordo com as forças policiais para evitar este triste espectáculo de, em vésperas de jogos importantes, estas virem a público com aqueles patéticos comunicados de “jogo de alto risco”, com “não sei quantos efectivos destacados”, etc, etc, que em nada contribuem para a segurança do evento, para a pacificação dos adeptos ou para dar garantias aos cidadãos e famílias que, em festa, se querem deslocar ao estádio para participarem no espectáculo. Antes pelo contrário, desnecessário dizer, pois contribuem para estabelecer um clima de quase guerra civil sem qualquer conexão com a realidade vivida.

Assegurem pois, com discrição e eficiência – ou seja: com profissionalismo - a segurança dos cidadãos e a normal realização do evento nas áreas sob a sua responsabilidade e deixem-se de fanfarronices e de atitudes auto-progagandísticas, perfeitamente a despropósito. Mais ainda quando os presidentes de SLB e SCP já vieram a público, em conjunto com a CML, dar um excelente exemplo de comportamento aos adeptos de ambos os clubes.

É fartar, vilanagem...

Fico a aguardar o dia em que o "Público" passe a citar o "Diabo" ou o "Jornal do Crime". Quanto ao conteúdo da notícia aguardo (?) a sua análise pelo Jadnovista oficial do regime.

Link Wray & Dick Dale (4)

Dick Dale & His Del-Tones - "Misirlou"

Ministro Vieira da Silva: a verdade inconveniente

Vieira da Silva terá ou não razão ao falar de espionagem política no caso das escutas ao primeiro-ministro; mas parece já não restarem dúvidas de que existe uma agenda política, já muito pouco escondida, na actuação da magistratura. Mas Vieira da Silva cometeu dois erros fatais ao falar publicamente daquilo que ele pensa ser a tal “espionagem política”: em primeiro lugar, ao intrometer-se no terreno da magistratura, cometeu um claro atentado contra a separação de poderes, um dos pilares fundamentais do Estado de Direito; em segundo lugar, com o pretexto de defesa da sua honra, deu oportunidade a que a própria magistratura, derradeira garantia dos direitos e liberdades dos cidadãos, ao questionar PGR e STJ e ao propor, em última análise, a divulgação das escutas, secundando PCP e PSD, também o fizesse, o que é gravíssimo e inaceitável mas deixa a Vieira da Silva o ónus de causador primeiro de tal grave acto.

Moral da história? Talvez seja esta a oportunidade para pensarmos que, ao contrário do que diz a vox populi, nem sempre é defensável que os políticos digam ao povo a verdade.

quinta-feira, novembro 26, 2009

Dos "media", das pressões e da sua autonomia

Vamos lá deixar-nos de hipocrisias: enquanto houver Estado e orgãos de comunicação social existirão sempre pressões da parte daquele, qualquer que seja o governo em funções, em relação às notícias publicadas ou por publicar, traduzam-se essas pressões por facilidades de financiamento, transferência de recursos por via da publicidade ou quaisquer outras mais criativas. Independentemente de tiradas moralistas, inquéritos de e a quem quer que seja ou da transformação destes actos em arma de arremesso político à revelia do debate de propostas e ideias verdadeiramente alternativas.

É que só existe mesmo uma maneira de os orgãos de comunicação social se tornarem independentes deste ou de outro tipo de pressões, públicas ou privadas: salvaguardarem a sua autonomia financeira por via da capacidade para conquistarem e fidelizarem audiências e, assim, conseguirem também maiores receitas publicitárias. Por muita razão que tenham ao virem a público queixarem-se do Estado (e tenho poucas dúvidas que, em alguma ocasião, já terão tido razões para se sentirem por ele injustiçados), ao fazê-lo, estão simultaneamente a evidenciar algo mais: que as suas próprias fraquezas lhes não permitem uma existência autónoma e independente e que, portanto, o problema não é serem do Estado agora enteados: é o não poderem deixar de ser filhos!

História(s) da Música Popular (148)

David Ackles - "Road To Cairo"

Julie Driscoll (C/ Brian Auger & The Trinity) - "Road To Cairo"
"Under The Influence" - The original songs of the "British Invasion" (XXXI)
Não me lembro quando descobri David Ackles: o “Em Órbita”, a quem tanto devem os devotos, onde me incluo, já tinha passado à sua fase de música antiga e barroca quando da data de saída do meu álbum de descoberta de Ackles, “American Gothic" (1972), e o resto perde-se-me na memória dos tais tempos ou, mais prosaicamente, na falta dela. Mas o que é facto é que lá cheguei (a Ackles) e ali conservo, no bom e velho vinil, esse seu álbum, o terceiro e, aliás, o único que possuo. Curiosamente, gravação e edição inglesas, com produção de... Bernie Taupin, esse mesmo, o que sempre conhecemos ligado a Elton John. Ackles (Illinois, 1937-1999) é aliás muito pouco conhecido, mesmo entre os “maluquinhos” destas aventuras da música popular, embora nomes como Elvis Costello e Phil Collins clamem a sua influência. Em Portugal quantos reconhecerão a sua existência?

Bom, de qualquer modo só mais tarde descobri ser Ackles o autor de um tema emblemático, embora já tardio, da “British Invasion”, na interpretação de Julie Driscoll com Brian Auger & The Trinity, todos eles, mais Long John Baldry com quem tinham partilhado os anteriores “Steampacket”, herdeiros da tradição britãnica dos “blues” e R&B. O tema chama-se “Road To Cairo”, esse sim, um clássico do velho “Em Órbita” dos anos 60, e terá sido gravado em 1968. Pois aqui ficam o original de Ackles e o "cover" de Driscoll.

quarta-feira, novembro 25, 2009

"Licht und Schatten" - o expressionismo alemão no cinema (3)

"Der müde Tod", de Fritz Lang (1921)

25 de Novembro de 1975

Uma curta frase sua (sobre a indispensabilidade do PCP para a construção democrática) salvou a democracia e assegurou a vitória da tolerância e da liberdade. A democracia é isto mesmo.

O governo e a educação: falta de convicção, cobardia ou oportunismo político?

Se o Governo anterior do PS e de José Sócrates estava firmemente convencido da justeza da sua política para a educação, em geral, e considerava a avaliação dos professores e o seu reflexo nas respectivas carreiras parte integrante e essencial do seu projecto para o sector, deveria ter tido a coragem política suficiente para enfrentar o reaccionarismo corporativo dos sindicatos da educação, colocando aos portugueses, de forma clara, a questão essencial: quem deveria dirigir a política de educação? Os professores e os seus sindicatos, com relevo para a Fenprof, ou o governo do país, democraticamente eleito. Em última análise, e no auge da contestação (disse-o aqui), se alternativa não restasse, deveria o governo ter apresentado a sua demissão e forçado eleições antecipadas, pedindo aos portugueses - a todos eles, eleitores - que se pronunciassem. Calculismo e cobardia política, apanágio dos fracos, não tornaram possível essa decisão.

Se o actual governo do PS e de José Sócrates estivesse firmemente convencido, no essencial, da justeza da sua política para a educação, etc... deveria ter tido a coragem política para, perante o oportunismo dos partidos situados à sua direita e o conservadorismo dos colocados à sua esquerda, se manter fiel aos seus princípios, deixando à oposição o ónus de derrotarem a política de reformas esboçada ou já iniciada (e que, não o esqueçamos, foi bandeira do governo) ou para, no caso de abertura de um deles, negociar os termos de um acordo possível sem abrir mão do essencial: uma avaliação credível, o que pressupõe a existência de quotas, e uma carreira na qual apenas progrediriam os que demonstrassem mérito inequívoco para tal.

Pelo caminho que as coisas estão a tomar (e oxalá me engane), o governo ou nunca esteve, e não está, convencido da justeza da sua política para o sector ou a cobardia e o oportunismo políticos tomaram conta da governação. No primeiro caso, terá andado quatro anos a enganar os portugueses e a gastar energias em vão; no segundo caso, começa a mostrar indícios de não estar á altura dos duros desafios que se avizinham.

The best of SUN rockabilly (8)

Warren Smith - "Miss Froggie"

terça-feira, novembro 24, 2009

Função pública e justiça social

Baseia-se a fiscalidade na maioria dos países democráticos ocidentais, principalmente naqueles em que a protecção social aos cidadãos encontra maior e melhor acolhimento, no princípio da progressão contributiva, isto é, em que aqueles, empresas ou famílias, que auferem maiores rendimentos mais contribuem para em termos fiscais em favor de uma redistribuição que contemple, por via das prestações sociais, os detentores de menores rendimentos. Foi e é a aplicação deste princípio que permitiu e continua a permitir a existência de sociedades mais progressivas e equilibradas, mais igualitárias sem prejuízo das liberdades e iniciativa individuais. Mais civilizadas, portanto.

Tendo dito isto, penso talvez valesse a pena pensar, nas sociedades actuais em que um desemprego elevado constitui quase um problema crónico que origina problemas sociais graves e um "déficit" continuado nos orçamentos de Estado, em aplicar princípio semelhante em termos de emprego. Como? Muito simplesmente, transferindo, através da contenção salarial, recursos daqueles cujo emprego e carreira são garantidos para a vida e são pagos através desses mesmos orçamentos para uma melhoria das prestações sociais em favor dos desempregados e dos pensionistas mais pobres. Por si só, não iria melhorar o problema estrutural do "déficit" orçamental, mas constituiria uma medida indiscutível de justiça social sem contribuir para o seu agravamento. À consideração, portanto, dos sindicatos do sector. Com um sorriso sarcástico, pois claro!

Les Belles Anglaises (XXXV)








Jaguar XK 14o (1954-1957)

Juizes: do desejável recato

Não será essa a causa da crise da justiça, nem sequer um dos principais entraves à correcção da forma como é administrada. Mas, confesso, não gosto de ver juizes e magistrados envolvidos em debates televisivos, entrevistas aos telejornais, autores de artigos de opinião fora das revistas jurídicas. Como nunca gostei de os ver envolvidos com o futebol. Não penso essa presença em algo contribua para a resolução de quaisquer problemas, antes tendendo a agravá-los. A investigação judicial e a administração da justiça, a sua independência, exigem, quanto a mim, um certo recato, a necessária dignidade reflectida no ritual nada gratuito da sala de um tribunal, pouco compatíveis com o contributo para o justicialismo populista a que, na situação actual, essas aparições públicas acabam sempre, independentemente da vontade de cada um, por dar origem.

Que contributo deu o debate de ontem do “Prós & Contras” para a resolução dos problemas da justiça em Portugal? Nenhum, ou muito pouco, escancarando, isso sim, à evidência, mesmo para o cidadão desprevenido, a actual luta político/corporativa, nos dois sentidos, que se trava entre a magistratura e os políticos e que está no cerne da crise. Aquilo que vulgarmente se designa por justicialização da política e politização da justiça e para as quais, verdadeiramente, não se vislumbra solução.

segunda-feira, novembro 23, 2009

Isabel Alçada e Ana Jorge: duas entrevistas diferentes e os mesmos sinais capitulacionistas

Quando leio ou oiço uma entrevista com um político, principalmente se me é relativamente desconhecido e/ou chegou há pouco tempo a lugar de relevo, mais ainda se à governação, procuro preferencialmente conhecer que ideias tem para o país, para a governação ou área que dirige, o que pensa da Europa e do Mundo. Claro que será sempre interessante conhecer um pouco da sua vida, do seu CV, dos seus gostos e opiniões que ajudem a formar uma ideia sobre a sua personalidade: as ideias e as políticas não existem no vazio, sem um “mensageiro” e com a “fulanização” da vida política essa informação, digamos, complementar torna-se cada vez mais relevante. Mas o essencial, o “santo dos santos” nunca deixará de ser a política e as ideias que cada um tem e pretende levar por diante, implementando-as. É isso a política.

Vem isto a propósito das recentes entrevista com Isabel Alçada (televisiva – que já aqui analisei) e Ana Jorge (“Pública” de ontem), curiosamente ministras que terão, pelo menos, um ponto em comum: ambas sucedem a ministros de fortes convicções; concorde-se ou não, com ideias políticas claras para os seus sectores - e como tal contestados. Coincidentemente, em ambas as entrevistas também algo em comum: uma subalternização do política, das ideias, por troca, no caso de Isabel Alçada, pelo “charme”, as relações públicas e no caso de Ana Jorge pelo seu percurso de vida, por uma intimidade revelada. Em ambos os casos, não deixam de ser más notícias. Talvez um sinal profético, em conjunto com uma certa ausência de marca governativa desde a posse no actual executivo, de que o governo, face á maioria apenas relativa, terá decidido capitular sem dar combate.

A "tal" presença na área...

Desde que me lembro de existir que as grandes equipas do meu clube - as que ganharam títulos, prestígio e adeptos - privilegiaram modelos de jogo que exigiam “pontas de lança” com forte presença na área. Foi assim com o grande José Águas, com José Torres (o Canadá Dry de boa memória), com Michael Maniche, com Zoran Filipovic, com Mats Magnusson, até com o mais modesto Reinaldo. Lembro-me perfeitamente que Sven Goran Eriksson, mal chegou ao clube, tentou logo encontrar uma solução desse tipo à revelia de Fernando Martins, que tentava impor um tal Cláudio Adão.

Não se trata de um capricho: desde os anos 60 do século passado que as equipas visitantes privilegiam, quando de visita ao Estádio da Luz, modelos de jogo que passam invariavelmente por um bloco muito baixo, meio-campo "de combate" colado à defesa e avançado(s) [quando o(s) há!...] móvel, isolado, a tentar fazer pela “vidinha” e ver o que consegue arrancar. Com sorte, dantes perdiam por dois ou três. Hoje em dia, com a evolução dessas equipas, arriscam-se a empatar ou ganhar.

Que quer isto dizer? Apenas que depender só de Cardozo (o único jogador no plantel do SLB com essas características quando existem, para aí, cinco ou seis soluções para defesa-esquerdo nenhuma delas com qualidade acima da mediania) é um risco demasiado extremo. Quando ele não está, como aconteceu nos dois últimos jogos, a equipa “safa-se” à tangente (Naval), ou não se safa (V. de Guimarães). Vem aí o mercado de Janeiro e talvez não fosse má ideia pensar um pouco sobre o assunto.

Link Wray & Dick Dale (3)

Link Wray & the Wraymen - "Mustang"

domingo, novembro 22, 2009

Jerónimo de Sousa e "A Vida dos Outros"

Jerónimo de Sousa manifestou-se hoje em conferência de imprensa sobre o "caso das escutas". Em função das suas afirmações, transcritas pelo "Público" e que aqui tomo a liberdade de reproduzir, coloco-lhe algumas perguntas, que julgo pertinentes"

“Não se trata de procurar saber os seus conteúdos, mas naturalmente procurar manter essas provas para processos futuros e a sua destruição irreversível seria sempre uma perda”, afirmou Jerónimo de Sousa aos jornalistas, em conferência de imprensa.

Pergunta: se, de acordo com o PGR não existem indícios de crime, Jerónimo de Sousa está a referir-se a provas de quê? Ou acha que, mantendo-se as escutas em arquivo, poderá ter hipótese de quebrar o segredo de justiça - cometendo, aí sim, um crime - ou apenas pensa um dia poderá ser poder e tais escutas lhe darão então muito jeito?

”O líder do PCP reconheceu não dispor de elementos “para avaliar o acerto da decisão” do Procurador-geral da República, Pinto Monteiro, sobre o arquivamento das últimas cinco conversas entre Armando Vara e o primeiro-ministro, José Sócrates, mas considerou “não haver no quadro legal forma de escrutinar se essa decisão concreta é justa ou injusta”.

Pergunta: se o único meio possível de Jerónimo de Sousa avaliar da justeza da decisão do PGR seria divulgar as escutas, será isso que Jerónimo de Sousa estará a propor, ultrapassando toda e qualquer legalidade e institucionalizando e legalizando as escutas como forma de combate político?

“Mas, independentemente de todas as questões e interrogações que este caso continua a levantar, em todas as circunstâncias, sejam quais forem as pessoas envolvidas, seria muito grave que quaisquer formalismos legais determinassem a anulação definitiva de matéria de prova indispensável à descoberta de eventuais crimes”, observou.

Pergunta: "quaisquer formalismos legais" são, para o secretário-geral do PCP, os elementos essenciais e estruturantes do Estado de Direito Democrático? Será que Jerónimo de Sousa se esqueceu dos tempos em que o PCP combateu a ditadura e do modo como sofreu na pele as suas consequências? Ou será que apenas aderiu ao pensamento dominante (peço desculpa) “malagueta no cú dos outros não arde”?

Jerónimo de Sousa acusou o PS, PSD e CDS-PP de, “através da lei”, terem feito “uma blindagem de três figuras principais do Estado em relação designadamente aos processos de escuta”.

Pergunta: Jerónimo de Sousa aceita que qualquer por decisão de um qualquer juiz de primeira instância se escutem as principais figuras do Estado? Ou concorda com isso apenas porque acha que é sempre possível existir algures um juiz do seu partido que a isso se preste?

Um comentário: deve Jerónimo de Sousa ter visto este filme. Mas, se é que a cura é ainda possível, talvez não fosse má ideia revê-lo vezes sem conta...


"Das Leben der Anderen"", de Florian Henckel von Donnersmarck (2006)

Exploitation (15)

"The Million Eyes of Su-Muru", de Lindsay Shonteff (1967)

sábado, novembro 21, 2009

"For sentimental reasons" - original doo wop classics (8)

The Five Satins - "In The Still Of The Night"

Odete Santos, a queda do muro, a NEP e o revisionismo de Khrushchev

Ontem, no programa “Os Pontos nos “is” (o programa seria bem melhor com um apresentador/moderador mais bem preparado), da RTP Memória, sobre o vigésimo aniversário da queda do muro de Berlim, a ex-deputada comunista Odete Santos retomou as teses pró-albanesas dos anos sessenta do século XX ao, recuando no tempo, responsabilizar a NEP e o “revisionismo” Khrushcheviano pela implosão da URSS e do bloco soviético em 1989. Não deixa de ser interessante, tal confissão, mas pergunto, colocando-me da pele de Odete Santos mas tentando ir um pouco mais longe: não teria sido a necessidade de implementação da NEP, nos anos 20, um sintoma de que já nessa altura o proletariado soviético, dirigido pelo seu auto-proclamado partido de “vanguarda”, o PCUS, se manifestava incapaz de fazer triunfar a revolução nos termos definidos e nas condições existentes? Não estaria esse mesmo proletariado já a perder na luta de classes, então travada, sendo obrigado a fazer concessões que, segundo Odete Santos, estariam na génese da sua derrota futura? Para Odete Santos, a ascensão de Stalin ao poder corresponderia àquilo que se depreende das suas palavras ser um reforço da linha bolchevique anterior à NEP ou ao triunfo de uma nova burguesia, sobre a pequenas burguesia da NEP, alicerçado nos planos quinquenais e na colectivização forçada? Tudo isto significa que Odete Santos admite que o PCP andou todos estes anos a defender uma linha política incorrecta ou só o terá feito após o XX Congresso?

Estas foram as questões interessantes levantadas por Odete Santos e que teriam merecido uma discussão substantiva (ninguém lhes pegou...), já que a “traição” de Gorbachev, as provocações da CIA e outros primarismos semelhantes não merecem sequer um segundo de atenção e só apoucam quem os profere. Fora isso, Medeiros Ferreira fez uma interessante incursão pelos meandros da política internacional de 45 a 89, o que se saúda.

sexta-feira, novembro 20, 2009

Presos preventivos: a dignidade necessária

Nunca será de mais insistir no facto de os cidadãos em prisão preventiva, indiciados ou acusados da prática de crime, serem cidadãos inocentes até prova em tribunal com sentença transitada em julgado. Assim sendo, seria de todo de evitar aquelas cenas televisivas, muito pouco dignas de um estado democrático e tolerante, de presos preventivos transportados pelo braço de forma brusca, ou até empurrados, pelos guardas prisionais quando da sua chegada a tribunal, como se dos mais perigosos criminosos se tratassem. Exige-se a dignidade necessária, se fazem favor.

Beat (8)

Those Two - a poem by Alan Ginsberg

That tree said
I don't like that white car under me,
it smells gasoline
That other tree next to it said
O you're always complaining
you're a neuroticyou
can see by the way you're bent over.

Sword & Sandals (8)

"La Guerra di Troia" de Giorgio Ferroni (1961)

O Estado e os seus investimentos publicitários

Nos últimos tempos (digamos que nas duas últimas décadas, para não ir mais longe), com o desenvolvimento e crescente sofisticação dos mercados publicitários e, principalmente, da actividade de “sponsorship”, generalizou-se a prática de o Estado, através das empresas e instituições que controla ou onde o seu peso é determinante, transferir valor para outras empresas, instituições ou eventos - financiando-os - recorrendo a essas mesmas actividades acima nomeadas. Como? Por exemplo, ao ter contratado Luís Filipe Scolari como “endorsee” de uma campanha de publicidade para a Caixa Geral de Depósitos o Estado estava, de facto, a contribuir para o pagamento do salário do treinador, uma vez que todos sabemos esses valores entravam na contabilidade dos seus proveitos garantidos quando a FPF fazia as suas contas ao salário a pagar a “Filipão”. Outro exemplo? O patrocínio da Santa Casa da Misericórdia ao Rallye Dakar era garantia indispensável para assegurar a sua partida de Lisboa com a subsequente exploração do facto, em termos de popularidade, pelo governo de então. Também por alguma razão encontramos a TAP, empresas do grupo PT e o Grupo Espírito Santo, estes dois últimos associados na própria PT onde o Estado detém acções com direitos especiais, como patrocinadores principais do Estoril Open, possibilitando a realização de um evento que o Estado assume prestigia o país. Claro que poderemos sempre contra-argumentar dizendo que a esse investimento corresponde uma contrapartida para a empresa/instituição patrocinadora. Em alguns casos isso até pode ser verdade. Mas não só o a avaliação desse retorno não é facultada a muitos dos accionistas das empresas onde o Estado, de facto, manda (os contribuintes), como muitas vezes nem sequer é efectuada ou o é recorrendo a técnicas que quase ousaria classificar como fraudulentas, como é o caso da avaliação recorrendo ao valor bruto em publicidade do espaço/tempo ocupados pelas menções encontradas nos “media” (ver aqui).

No caso da publicidade a questão é mais complicada, já que não só técnicas sofisticadas de avaliação e controle estão desde há muito mais desenvolvidas e implementadas, como também, distribuídas as campanhas por vários “meios”, isso torna mais difícil e menos imediata uma análise pelo cidadão comum.

Significa isto que o Estado não possa, nas campanhas de publicidade desenvolvidas pelas empresas que controla, beneficiar os “media” amigos e prejudicar os “inimigos”. Claro que não, não significa, pelo menos dentro de alguns limites enquadráveis na avaliação. Estou mesmo certo isso, aqui e ali, acontece. Mas também significa que não é o facto de Francisco Louçã solicitar uma listagem dos investimentos do Estado em publicidade nos últimos anos (presumo que incluindo a sua distribuição pelos vários “media”) ou de José Pacheco Pereira afirmar, na “Quadratura do Círculo”, a sua estupefacção pelo facto do Estado preferir o DN e o JN ao “Público”, nas suas campanhas, alegando a maior tiragem deste último, que levará a oposição parlamentar a qualquer conclusão válida que possa colocar em causa as decisões do governo nesta área. O assunto é muito mais complexo e qualquer mediano técnico de "marketing" dessas empresas/instituições, munido dos elementos necessários, soltará uma boa gargalhada perante a argumentação apresentada e rebatê-la-á com a facilidade com que Eusébio marcava um “penalty”. Quanto aos deputados Louçã e JPP, talvez fosse o tempo de se informarem devidamente antes de falarem do que não sabem, começarem a fazer política com seriedade e deixarem de ser actores de um espectáculo que acaba por só favorecer o governo.

quinta-feira, novembro 19, 2009

Jdanovismo camarário?

Lê-se no “Público” de hoje, a propósito da já célebre igreja da autoria do arquitecto Troufa Real para o Restelo, que “em 2007, a propósito da escultura de Rui Chafes que o escritório de advogados de José Manuel Júdice colocou em frente à sua sede, na Avenida da Liberdade, o presidente da autarquia, António Costa, mostrou-se de acordo com uma sugestão do PCP para a constituição de uma comissão municipal de estética. Este organismo serviria para evitar a profusão de "mamarrachos". A comissão, que de resto se destinava apenas à arte pública, acabou por não vingar.”

Que tal sugestão aberrante tenha vindo do PCP, nada a estranhar: talvez exista no partido alguém que se sinta com perfil para candidato a Jdanov da autarquia lisboeta. Que António Costa se tenha mostrado de acordo... já me deixa mais preocupado. Mas, no fim de contas, como a tal comissão não vingou, terá vingado em seu lugar o bom senso! Mas lá que se chegou a pensar...

Link Wray & Dick Dale (2)

Dick Dale and his Del-Tones - "Pipeline"

Selecção: um final de qualificação à Scolari

Depois de ter passado metade da fase de qualificação a inventar, fazendo tudo ao contrário do que era habitual em Scolari só porque sim, por necessidade de afirmação estúpida de personalidade, perante a iminência do não apuramento Carlos Queiroz fez finalmente aquilo que Scolari faria: deixou de fantasiar, escolheu os mais experientes, fechou o grupo e começou a jogar para o resultado, para o “meio a zero”. E até ainda teve tempo e engenho (pouco) para ensaiar uns laivos “contra-natura” de popularidade fácil. Claro que lá conseguiu finalmente qualificar a selecção. Lá longe, no seu exílio dourado do Uzbequistão, “seu” Filipão deve ter soltado uma enorme gargalhada...

quarta-feira, novembro 18, 2009

As negociações na educação

A leitura das notícias que vão saindo sobre as negociações em curso referentes à avaliação dos professores e respectivo estatuto da carreira docente em conjunto com a entrevista da passada semana à RTP da ministra Isabel Alçada passam para a opinião pública a ideia de que o governo perdeu completamente a iniciativa neste processo e não tem para ele qualquer estratégia definida excepto o querer ver-se livre de "chatices". Mau sinal. Muito mau sinal, mesmo.

História(s) da Música Popular (147)

The Reflections - "Poor Man's Son"

The Rockin Berries - "Poor Man's Son"
"Under The Influence" - The original songs of the "British Invasion" (XXX)
O “Gato Maltês” confessa ter um “fraquinho” por um quase ignoto grupo da “British Invasion” que, basicamente, teve dois sucessos, ambos “covers” de originais americanos: “He’s In Town” (#3, 1964), escrito pela dupla do Brill Building Gerry Goffin e Carole King e gravado originalmente pelos Tokens (esses mesmos, os do “Lion Sleeps Tonight”) e “Poor Man’s Son” (#5), um original de 1965 dos americanos Reflections. Estou, e os mais “calhados” nestas coisas já o entenderam, a falar dos Rockin’ Berries (Birmingham, 1961) e o “fraquinho, como todos eles mais ditado pela emoção do que pela razão, ficará por explicar.

Quanto aos Rockin Berries gravariam um outro original de Goffin e King e dos Tokens, “You’re My Girl”, mas já sem grande sucesso. De qualquer modo, acho “He’s In Town” e “Poor Man’s Son” suficientes para lhes assegurar um lugar de algum destaque na história da “British Invasion” e, mais do que o necessário, para comigo terem ficado desde os tempos de adolescência.

Senhores jornalistas: e que tal algum bom senso e contenção?

Quem ouvir, ler ou vir a comunicação social deste início de semana pode pensar que a selecção portuguesa de futebol (10ª classificada no “ranking” FIFA e onde jogam atletas do Man. United, Chelsea, Real Madrid, Juventus, etc) vai hoje jogar uma final do campeonato do mundo ou da Europa contra uma das grandes potências da modalidade, Brasil, Alemanha, Espanha, Itália, etc. Não vai. Vai jogar o apuramento para a fase final de um Mundial onde estarão 32 equipas contra o 42º classificado do mesmo “ranking” (um país que é mais um protectorado da UE), um jogo onde até pode empatar ou mesmo perder por um golo de diferença desde que também marque.

Haja contenção e bom senso, se fazem favor, até porque, de acordo com esse mesmo "ranking", a selecção portuguesa tinha obrigação de já estar apurada!

terça-feira, novembro 17, 2009

Link Wray & Dick Dale (1)

Link Wray - "Batman Theme"

O Bloco de Esquerda e o almoço

Segundo nos informam os “media” e o próprio “site” do Bloco de Esquerda, este terá questionado o governo sobre o almoço de despedida, que o BE classifica como privado, oferecido por três empresas públicas do sector dos transportes, entre as quais a Refer e a CP, à secretária de estado cessante Ana Paula Vitorino, almoço esse pago com recurso aos cartões de crédito dessas empresas. Faz bem o BE, por um lado, pois essa (questionar o executivo, controlar os actos governativos e zelar pela boa gestão das empresas públicas) é uma das funções essenciais dos deputados e que estes devem exercer sem inibições e sempre que julgarem necessário. Mas, por outro lado, terá o BE razão? Pessoalmente, e apenas pelo que me foi dado ler pois não possuo mais qualquer outra informação sobre o assunto, acho que não. Porquê?

Nas empresas de maior dimensão e mais estruturadas é habitual existir uma verba, normalmente incluída no orçamento aprovado para cada direcção ou departamento, destinada a pequenas acções de relações públicas: pequenas ofertas a funcionários que deixam a empresa, refeições oferecidas a empregados, colaboradores ou àqueles com quem a empresa se relaciona na sua actividade (fornecedores, clientes, entidades oficiais, etc – os chamados “stakeholders”), pequenas ofertas de Natal (não, não estou a falar de corrupção, mas daqueles presentes de poucas dezenas de euros normalmente denominados no jargão da gestão como “good will offers) e acções de teor semelhante. Enfim, e para não ser exaustivo, um conjunto de actos de gestão que a empresa assume como podendo contribuir para um seu bom ambiente interno e correcto relacionamento com o “meio-ambiente” em que se movimenta. Habitualmente, e em proporção com meios financeiros movimentados, é um verba modesta, desse modo pouco ou nada afectando os resultados da empresa.

Parece-me ser este o caso - perfeitamente justificado, portanto – de um almoço, que nada tem de privado, oferecido a uma secretária de estado cessante. Numa empresa pública, mormente, como é o caso, naquelas que apresentam prejuízos elevados, essas acções devem ser eliminadas? Penso que não, pois isso em nada iria contribuir, antes pelo contrário, para uma melhoria dos seus resultados e do relacionamento interno e externo da empresa. Bom senso e parcimónia, isso sim, devem presidir à respectiva orçamentação e controle de execução. E é exactamente a isso (a floresta), a não ao simples e, parece-me, mais do que justificado almoço (a árvore), que os deputados (quaisquer, e não apenas os do BE) devem estar atentos.

Conforme tenho repetidamente afirmado, é bem tempo de nos deixarmos destes "fait-divers" populistas para voltarmos a falar de política.

Zombie (2)

"Bury Me Dead", de Bernard Vorhaus (1947)

segunda-feira, novembro 16, 2009

A propósito do Bósnia e Herzegovina-Portugal, senhores jornalistas e comentadores

Sim, eu sei que sou um “chato”, “picuinhas”, perfeccionista, que isto não interessa nada. Mas, que raio, os nossos jornalistas e comentadores desportivos gostavam que chamassem Eusibio ao Eusébio, Zimao ao Simão ou Mutino ao Moutinho? Acho não gostariam.

É que pronunciar as palavras de modo mais ou menos correcto na sua língua original não custa mesmo nada, demorou-me menos de 5’. Por isso, aqui vai, para não chamarem Zenika a Zenitsa e outros disparates do género. Mas, principalmente, para se habituarem a ser profissionais, rigorosos.
Pronunciation of Letters
Letter
Pronunciation

c

like ts in lets
č (hard)
like ch in church
ć (soft)
like ch in cheese

similar to J in June
đ
like j in jam
g
like g in game
h
like h in ham
j
like y in yacht
lj
like l in lure
nj
like Spanish ñ
r
trilled
š
like sh in sheep
ž
like s in measure
a
like a in sofa
e
like e in met
i
like ee in feet
o
like o in dog
u
like oo in boot

Ora vamos lá dar a táctica...

Tenho lido por aí que, face à diferença para com os Bósnios, o seleccionador Carlos Queiroz teria como função primordial para o jogo de quarta-feira fill the gap, em termos de altura, da equipa portuguesa para com o adversário. Para isso, a principal opção, em termos de jogadores, seria a substituição de Duda por Miguel Veloso. Não discordando de tal opção, mas por motivos bem diferentes (já veremos), acho se deve ir um pouco mais longe e perguntar: qual o melhor antídoto para evitar o jogo aéreo Bósnio na área portuguesa? Tem Portugal jogadores que possam colmatar, de modo eficaz, esse gap de alturas existente entre as duas selecções? Vejamos...

Penso (este maldito hábito...) que se a selecção portuguesa quer evitar a “força aérea” Bósnia lhe resta um antídoto bem eficaz: ter mais posse de bola (a percentagem no último sábado foi apenas 50% - 50%) e não a perder de forma infantil, como aconteceu no jogo anterior, obrigando à falta no último terço do campo; ganhar essa mesma bola mais à frente, evitar jogadas “à linha” do ataque contrário e bolas paradas (“cantos” e livres) nesse mesmo último terço. Como o pode fazer? Em primeiro lugar, pensar se um 4X4x2 “losango”, com a entrada de Tiago e a saída de Nani, com Simão a jogar atrás de Liedson e recuando quando necessário (circula melhor a bola do que Nani), não poderia ser uma boa solução (mas Nani é o jogador português que melhor acelera no último terço do campo, é verdade: um dilema para Queiroz resolver). Em segundo lugar, tapando as alas com laterais que defendam com eficácia e aí Veloso (mais do que por causa da sua altura: tem só 1,80 e até não me parece seja exímio no jogo aéreo) será melhor solução do que Duda para o lado esquerdo. Hugo Almeida no lugar de Liedson? Não me parece: o jogador do SCP pressiona melhor lá na frente e é bem mais rápido na última desmarcação - embora menos eficaz a galgar terreno em transições rápidas, mas não será essa a opção. Perante defesas pouco rápidos, Liedson parece ser uma boa solução. Quanto a Ricardo Costa a lateral, para a equipa ganhar altura, não ia por aí: actualmente não tem rotinas de jogo no lugar nem com esta equipa.

Uma questão final: Moutinho pode ser uma boa solução durante o jogo para dar mais capacidade pressionante e de circulação bola ao meio-campo, se e quando isso se revelar necessário. Durante o jogo, friso, e não a 10’ do fim.

Once upon a time "Amapola"

"Amapola", um original de Joseph LaCalle, "Deborah's Theme" (Ennio Morricone), Jennifer Connelly enquanto jovem (nós envelhecemos e elas vão crescendo bonitas...) e Sergio Leone. Um filme de culto (1984). Um nó na garganta.
Para mim, uma tarde durante o Carnaval de 1986 no antigo Cinema Roma.

domingo, novembro 15, 2009

Porfírio Rubirosa e o enriquecimento ilícito

Se alguém, homem ou mulher, tiver um(a) amante que lhe decida oferecer carros de luxo, jóias ou relógios caros, contas na Suiça e uma mansão na Riviera pode ser acusado(a) de enriquecimento ilícito? Sim, estou a lembrar-me desse mesmo, o célebre Porfírio Rubirosa. Que teria Rubirosa de fazer para provar a licitude na obtenção dos seus bens? Dormir com o juiz ou juíza? Ou, pura e simplesmente, e segundo reza a lenda, bastaria despir-se à sua frente para fazer prova convincente?

The Roulette Years (9)

Joey Dee & The Starliters - "Peppermint Twist, # 1 & 2"

Das escutas, ou a verdadeira "essência das coisas"

Num comentário a este “post”, um habitual leitor deste “blog” afirma, no caso das escutas a José Sócrates, não estar eu a querer perceber a “essência das coisas”. Não é verdade: para mim, a essência das coisas é, e será sempre, o Estado de Direito Democrático e os correspondentes direitos, liberdades e garantias. Estejam em causa José Sócrates, o Manel da Horta ou o Zé dos Anzóis. O PS ou qualquer outro partido. E a defesa das instituições democráticas e da dignidade dos seus mais altos cargos, claro, por isso não admitindo que o PM, PR ou presidente da AR possam ser escutados por decisão de um qualquer juiz da comarca de Alguidares de Baixo. Como por aqui também já tive ocasião de afirmar a um outro leitor, e citando Brecht, nunca me ouvirão dizer “primeiro vieram buscar os comunistas, mas como não era comunista não me importei”.

Tendo dito isto, claro que, e respondendo ao meu estimado leitor, não posso tirar quaisquer ilações políticas, pelo menos em relação a José Sócrates, de escutas ilegais, ofendendo princípios fundadores do Estado de Direito, obtidas através da violação do segredo de justiça (o que constitui crime) e das quais só conhecemos pequeníssimos excertos publicados em alguns jornais. Bem esteve o CDS, pela voz do deputado Diogo Feio, ao afirmá-lo (ora aqui está uma ilação política que já pude tirar...). Também não posso sequer admitir que o próprio primeiro-ministro sobre elas se pronuncie – e este já perdeu também boa oportunidade de estar calado! Do que se passa com as escutas, posso, isso sim, tirar ilações políticas face ao que parece ser a “bandalheira” (peço desculpa pelo termo) generalizada que parece grassar na PGR, cujo principal responsável admite divulgar escutas ilegais pelo facto da própria PGR não ter sabido garantir o segredo de justiça e nada faz quanto às sistemáticas violações desse mesmo segredo. Tiro também ilações políticas (aliás, tenho vindo a tirá-las) quanto ao clima de justicialismo populista que se desenvolve neste país, muitas vezes com a conivência dos próprios responsáveis governativos ao admitirem, por exemplo, que a polícia resolva a tiro quaisquer fugas de suspeitos; onde, à semelhança do que acontece nos períodos revolucionários ou nas guerras civis (uma foi aqui mesmo ao lado), tudo vale contra aqueles com quem antipatizamos ou com os quais temos divergências, principalmente se são políticos, ricos e “famosos” ou, pura e simplesmente, pobres imigrantes.

Mas então, significa isto que não posso tirar ilações políticas do caso TVI/PT. Claro que posso, e já em devido tempo as tirei e por aqui me exprimi. Mas para isso, não sendo alienígena nem virgem, muito menos ofendido na virgindade perdida, não preciso para nada de escutas. Conhecendo este país e tendo exercido funções de gestão, sei perfeitamente que um negócio que envolva uma empresa onde o Estado efectivamente manda (e este sempre foi o caso da PT e também, actualmente, do BCP) não se efectua sem que dele o governo (este ou qualquer outro) tenha conhecimento e o aprove, intervindo ou não directamente no processo (lembram-se da OPA do Sonae sobre a PT e da posição da CGD?). Aliás, competindo aos governos a condução política do país, para que fim se julga o Estado detém participações accionistas em empresas? Será melhor que as não detenha? Numa maioria dos casos, claro que sim. Mas, não sendo um ultra-liberal, haverá casos em que por questões estratégicas para o país isso se possa justificar, sendo o controle e interferência políticos o preço a pagar por outro eventual tipo de benefícios.

Então o primeiro-ministro mentiu? Não sei: provavelmente sim, ou então estava mal informado pelo seu governo (não sei o que será mais grave...). Mas as minhas ilações políticas sobre o caso já tinham sido retiradas muitos antes, sequer, de José Sócrates ter prestado declarações na AR e estas em nada as alteraram.

Por fim, mais algumas ilações políticas que não tenham directamente a ver com este caso? Claro. Retiro-as, também, da entrevista da ministra Isabel Alçada à RTP1, que, no meio desta “salganhada” populista, dos escândalos da imprensa tablóide (começo a perguntar-me qual não a é...), passou quase despercebida e é de importância política essencial. Talvez constituísse mesmo, como aqui afirmei, um bom motivo para voltar à política. Mas, perante uma boa escandaleira e um caso de bisbilhotice de "mulher de soalheiro", quem está mesmo interessado em discutir política?

PS: Hoje, o “Correio da Manhã” já afirma em primeira página que nas tais escutas José Sócrates se terá referido a Manuela Ferreira Leite de forma ofensiva. Estão bem a ver onde tudo isto já chegou?

"Bloco Central"

Indispensável ouvir o "Bloco Central" de hoje, o programa de debate político entre Pedro Adão e Silva e Pedro Marques Lopes na TSF.

sábado, novembro 14, 2009

Da enorme falta de convicção da selecção portuguesa

O que mais me impressionou negativamente nesta exibição de hoje da equipa portuguesa? A falta de convicção no momento do remate, do último passe, do derradeiro “sprint” ou da desmarcação para o golo. A falta de “rush” no último terço do terreno, em suma, aquela centelha extra que, no “rugby”, é capaz de empurrar decisivamente um ¾ para o ensaio. No último terço do terreno tem de existir um outro ritmo, uma outra intensidade.

Já agora: Deco realizou mais uma exibição ao nível (baixo) das suas últimas na Premiership. Toma demasiadas vezes as opções erradas: agarra-se à bola e procura a falta quando devia fazer fluir o jogo; escolhe frequentemente o pior passe e perde muitas vezes a bola em zonas onde proporciona contra-ataques perigosos aos adversários. Se a selecção portuguesa conseguir o apuramento para a África do Sul, bem pode Carlos Queiroz pensar em alternativas, de modelo e de sistema, que minimizem o problema.

Exploitation (14)

"Naked Angels", de Bruce D. Clark (1969)

sexta-feira, novembro 13, 2009

Escutas, bisbilhotice e virgens ofendidas

Pergunta minha, que não sou jurista: não sei se José Sócrates, no exercício das suas funções de primeiro-ministro, mente muitas vezes, poucas ou ""assim-assim. Parto do princípio que, como todos nós e bem mais como acontece com quem exerce funções políticas de Estado, mentirá algumas. Umas vezes por necessidade, outras por vício. Em circunstâncias mais ou menos graves e com consequências diversas para a boa governação e para a opinião que dele formam os portugueses. Mas será ético (à atenção especial do BE...), para já não falar de lícito, que sejam utilizadas escutas ilegais de um processo em que José Sócrates nem sequer está envolvido, parcialmente transcritas (sabe-se lá com que rigor?...) por alguma imprensa e conseguidas através de violação grosseira do segredo de justiça (o que constitui crime), pura bisbilhotice tablóide, no fundo, para questionar politicamente o primeiro-ministro sobre o seu comportamento? Não se estará, com este comportamento, a virar tudo do avesso?

Já agora: alguém tem dúvidas de que neste país de virgens ofendidas um negócio como o da venda da TVI se faça sem que o Estado, intervindo ou não no processo, tenha conhecimento prévio do assunto? País de tristes, este... que parece querer chegar à fase do vómito.

"Les haricots sont pas salés" - old time cajun music (10)

"O invencível pensamento do camarada Mao ilumina o palco da arte revolucionária" (4)

De como a entrevista da ministra Isabel Alçada à RTP1 é uma boa oportunidade para voltar a falar de política

Maria de Lurdes Rodrigues não devia nada à beleza, vestia-se mal e, pelo menos de início, as palavras saiam-lhe com pouca fluência num discurso quase sussurrado. Mas tinha ideias, uma estratégia política para o seu sector e coragem q.b. para a pôr em prática. Isabel Alçada parece ser a sua antítese: é uma mulher interessante e charmosa, veste-se com bom gosto, o discurso é fluente mas, mesmo com esforço, difícil foi, na entrevista de ontem a Judite Sousa (RTP1), vislumbrar-lhe uma qualquer ideia política, por muito ténue que fosse. Minto: frisou que a avaliação deve ter repercussões na carreira dos professores. Esqueceu-se contudo que, actualmente, também tem, só que como todos são avaliados de igual modo assim mesmo, todos juntos para parecerem muitos, caminham ao longo de toda essa sua carreira.

Pois, dir-me-ão, a prioridade é “pacificar o sector”, como se uma boa dose de conflito controlado não fosse absolutamente necessária para que sociedades e instituições progredissem. Ah!, e negociar, dialogar, ouvir, perscutar. Esquece-se também, e o governo demonstrou-o bem ao fazer do seu programa eleitoral base de negociação governativa, que sem uma ideia estruturada de partida, uma noção clara daquilo que se pretende e do que, portanto, é essencial e acessório, parte-se sempre para qualquer negociação numa posição de fraqueza, principalmente tendo em conta que a parte contrária (a Fenprof; o resto está lá para enfeitar) tem – e sempre o teve – uma ideia bem clara do que pretende e do modo como a sua sobrevivência nela – nessa mesma negociação - se joga.

Pois o que a simpática e charmosa ministra Isabel Alçada deveria ter para nos dizer eram respostas a perguntas do tipo: concorda que a avaliação incida fundamentalmente sobre a prestação dos professores nas suas funções efectivas de ensino e outras actividades na escola e que seja efectuada maioritariamente pela sua hierarquia? Concorda que qualquer avaliação séria não dispense a existência de quotas? Concorda que cada professor (dentro de uma mesma categoria, claro) tenha uma classificação e um salário dependente fundamentalmente do seu mérito e esse salário seja mais elevado para quem leccione em áreas degradadas, zonas problemáticas ou onde, de algum modo, se esteja em presença de alunos com reais ou potenciais problemas de aprendizagem? Concorda em dotar progressivamente as escolas, após preparação nesse sentido, de maior autonomia na contratação e na definição (dentro de parâmetros pré-definidos) das condições salariais dos seus docentes? Também na sua gestão? Concorda com o fim do anacronismo que consiste em as direcções das escolas serem eleitas pelos seus pares e não nomeadas por quem (ministério, autarquia, instituição local, etc) tem a responsabilidade de apresentar resultados? Concorda em dar liberdade às escolas para, dentro de maiores padrões gerais de exigência mas excluindo qualquer ideia de regresso a um passado repressivo, estabelecerem os seus códigos de conduta? Concorda que, entre o populismo e demagogia reinantes entre o “povo da SIC” de que “quem não sabe “chumba” e já está” e o laxismo do aluno “bom selvagem” que é necessário acompanhar ad eternum, existe um enorme campo de actuação que pode ajudar, com êxito, a recuperar alunos com problemas mas que é preciso explicar isso claramente à opinião pública e mostrar os resultados obtidos?

Pois é, simpática e charmosa ministra Isabel Alçada, isto é exactamente o que preocupa este cidadão defensor de uma escola pública competente e formadora dos meus futuros concidadãos. Mas quando vejo e oiço o sindicalista Mário Nogueira, que, apesar das manifestações e juras em contrário, se está nas tintas para essa mesma escola pública e apenas pretende perpetuar o domínio do seu partido sobre ela, sair de uma reunião no Ministério ensalivando com o mesmo ar com que o Lobo Mau se apresta a deglutir os “três porquinhos” e, depois, a vejo na televisão numa acção de relações públicas onde as ideias estão ausentes, fico preocupado. Fico mesmo muito preocupado. E olhe, tem pouco tempo para demonstrar estou enganado.
Nota: nenhuma das televisões ligou o que quer que fosse à entrevista. O "povo da SIC" gosta é "sangue" e esse está nos "escândalos políticos" e nos "ricos e famosos".

A estratégia pós-eleitoral do PSD e a sua relação com as escutas a José Sócrates

Um "post" meu datado de 20 de Setembro e a sua grande actualidade.

quinta-feira, novembro 12, 2009

Tango aus Berlin (6)

Zarah Leander - "Frag´ mich nicht, ob ich Dich liebe"

Lapidar...

"Sendo ilícito, esse enriquecimento já é crime no ordenamento jurídico português. A inversão do ónus da prova, sendo inconstitucional, não pode ter acolhimento num Estado de Direito”, justificou Pedro Silva Pereira, citado pelo "Público".

Comentário: Aplaudo entusiasticamente e espero estas declarações do ministro Silva Pereira ponham um certo cobro à demagogia e populismo justicialista por aí à solta.

Revisitar o TGV

É hoje em dia possível viajar de avião entre Lisboa e Madrid por menos de €50, ida e volta. Na minha última viagem, há menos de três semanas, paguei €40 e há quem já tenha pago menos do que isso. Por outro lado, a possibilidade de efectuar o “check in” via "internet" acaba por contribuir para encurtar o tempo de viagem: é possível chegar à porta de embarque apenas cerca de ½ hora antes da partida (ou até menos). Isto significa que é também possível, no total, fazer a viagem por avião em menos de hora e meia (o tempo de voo são 50’), não entrando em linha de conta com os cerca de 20’ de metropolitano entre Barajas e o centro de Madrid, já que esse mesmo tempo pode ser gasto entre a futura estação do TGV e o local final de destino em Madrid. Há quatro anos, era impossível fazer o mesmo percurso por menos de €150 (era quanto eu pagava comprando o bilhete nos defuntos leilões "on-line" da TAP) e nos voos “clássicos” exigia-se uma comparência um pouco menos tardia.

Pergunta: todos estes dados têm sido considerados para a actualizar os estudos sobre o TGV Lisboa-Madrid? Pode, nestas condições, o combóio de alta velocidade continuar a ser competitivo com o avião?

Sou um defensor da ligação Lisboa-Madrid por combóio de alta velocidade, pois parece-me penalizador para Portugal, em termos competitivos, ser a única região da Península a ficar fora da respectiva rede ibérica. Mas, em primeiro lugar, tudo tem um limite, mesmo as decisões onde a racionalidade económica pode ceder, por vezes, o passo a questões de ordem política; e, em segundo lugar, refazer as contas perante este novo cenário irá certamente alterar os parâmetros do negócio, com todas as suas consequências, inclusivamente para o bolso dos contribuintes. A ter em consideração...

quarta-feira, novembro 11, 2009

Gilbert & Sullivan (8)

Gilbert & Sullivan - "Princess Ida"
"A Lady Fair"

Afinal... não estou assim tão sózinho

Algo que vale a pena ler sobre as já célebres escutas a José Sócrates

Mau gosto

Ontem à noite, penso que durante o Telejornal das 20h, na RTP1 (peço desculpa por alguma falta de rigor, mas vi de relance), o deputado do PSD Aguiar Branco explicava aos jornalistas a sua posição (penso, falava em nome individual) sobre um eventual referendo ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, recusando-o (soube hoje propõe uma alternativa jurídica ao casamento, mas isso não vem ao caso). Durante a intervenção do deputado, o responsável pela peça jornalística não encontrou nada de mais relevante para mostrar do que, em grande plano, as mãos de Aguiar Branco, focando com nitidez a aliança usada, talvez como prova da sua heterossexualidade e de que, portanto, não estaria o deputado a ser juiz em causa própria nem o moveriam interesses inconfessáveis. Pior mau gosto seria difícil de imaginar. Disgusting!

Arte Popular" no "Estado Novo" (13)


Carlos Botelho - pinturas murais da sala das Beiras.
Museu de Arte Popular, 1948

11 de Novembro: "Remembrance Day"

"Hoje, dia 11 de Novembro, em que se celebra o dia o armistício que pôs fim á Grande Guerra (às 11 horas de dia 11-11-1918), milhões de britânicos usam esta papoila na lapela, símbolo do seu respeito por aqueles seus concidadãos que morreram nessa guerra e nas restantes, fossem elas justas ou injustas. Em Portugal, quando eu era criança e ainda havia alguns sobreviventes da participação portuguesa na Flandres, o meu pai, que nunca sequer foi militar, mesmo do serviço obrigatório, ostentava durante alguns dias, na sua lapela, não me lembro se nesta altura se em Abril, quando do aniversário da batalha de La Lys, uma miniatura de capacete militar, símbolo da sua homenagem aos que aí tinham morrido e também da sua contribuição para que essa memória se mantivesse viva. Talvez fosse também uma maneira daqueles que contestavam a ditadura isolacionista afirmarem essa sua oposição e a adesão aos ideais da República, admito-o, mas penso isso acabava por se diluir na homenagem sincera aos antigos combatentes. Depois, os já raros sobreviventes da Grande Guerra foram desaparecendo e Portugal não tinha participado na II Guerra, a da geração do meu pai. E, com a guerra colonial, o termo combatente ou antigo combatente tomou conotações ideologicamente muito definidas, à direita: a ditadura fomentou-o, à esquerda radical deu-lhe algum jeito e os antigos combatentes, infelizmente, deixaram que isso assim acontecesse. É pena, pois Portugal tem bem razões para se lembrar de todos aqueles que, um dia, pelas boas ou más razões, independentemente da sua vontade ou determinados por ela, em ditadura ou democracia, mesmo que numa guerra injusta, morreram ou se sacrificaram, por vezes sabe-se lá porquê e até contra as suas ideias e ideais, nos campos de batalha de uma qualquer guerra. Até por que é a uma dessas guerras, embora injusta e muito por essa razão, que Portugal deve a democracia e a liberdade, enfim, um passo muito grande no caminho daquilo que conhecemos como fazendo parte da civilização."
Escrito neste "blog" a 11 de Novembro de 2007

terça-feira, novembro 10, 2009

Robert Enke (1977-2009), o último dos bons guarda-redes do meu clube.

Expliquem-me, como se eu fosse muito estúpido.

O STJ declarou a nulidade das escutas efectuadas ao primeiro-ministro no âmbito do caso “Face Oculta”. Segundo sabemos, o caso “Face Oculta” tem a ver com um processo de alegada corrupção com centro num negócio de sucatas que envolve um empresário de Aveiro e o dirigente do PS Armando Vara. A notícia do “Público” refere também que nas escutas, agora consideradas nulas, Armando Vara e José Sócrates terão falado sobre negócios na área da comunicação social, v.g., a venda da TVI por parte da Prisa. Pergunta minha, que não sou jurista, independentemente da questão essencial dos direitos, liberdades e garantias que, para simplificar, não vou para aqui chamar: que tem uma coisa a ver com a outra? Será que é ilegal o primeiro-ministro e um administrador do BCP, amigos e camaradas de partido, falarem ao telefone sobre um caso de tal importância na vida política e empresarial portuguesa? Até sobre questões confidenciais relacionadas com o caso?

Expliquem-me, se fazem favor, como se eu fosse mesmo muito estúpido.

5 estórias fúteis 5 do tempo do "muro" (5)

Hungria (não me lembro em que ano, mas talvez em 1977).

Atravesso de carro a fronteira entre a Jugoslávia e a Hungria e descubro me tinha esquecido de comprar “after-shave” (na “liberal” Jugoslávia, com sorte, era possível ter alguma escolha). Pânico - se existe algo que contribua para me enervar é a questão da barba – já que pensei comprar um “after shave” na Hungria exigiria dons talvez não ao meu alcance. Chego a Budapeste e lá me dirijo a um armazém, assim tipo Rua dos Fanqueiros ou “Paga Pouco”. Surpresa!: havia duas marcas à disposição. Uma assim ao estilo “Floyd” dos anos 50, que presumo tivesse um cheiro nauseabundo a condizer. Mas outra, ali mesmo à mão de semear (ou de comprar), com ar ocidental e a marca Elizabeth Arden - que não conhecia, nunca tinha usado e nunca mais voltei a encontrar (desde que há Nivea que por aí me fico) - a desafiar a minha compra. Agarrei no frasco com força, como se fosse a primeira pepita de oiro descoberta por garimpeiro. Até hoje, acho foi a melhor compra que fiz na vida!

5 estórias fúteis 5 do tempo do "muro" (4)

Checoslováquia, ainda em 1988. Quase toda a gente andava na rua transportando sacos de “oleado” ou napa. Normalmente vazios. Confesso, ao princípio não percebi bem qual a ideia. Perguntei a alguém “de confiança”. Muito simples: nunca se sabia quando aparecia algo de primeira necessidade para comprar (produtos frescos, fruta, o que quer que fosse). Por isso mesmo, era melhor estar prevenido!

5 estórias fúteis 5 do tempo do "muro" (3)

Estive, se bem me lembro, umas quatro vezes na Hungria, antes e depois da queda do “muro”, uma das quais quando fui a Viena ver a última final em que o “glorioso” participou (e perdeu...).

Na maioria dos países “ditos” socialistas (a muito específica Jugoslávia era excepção) as taxas de câmbio eram oficialmente fixadas muito acima do seu valor real, pelo que a solução óbvia era trocar dinheiro, a um câmbio muito mais favorável, no mercado negro (havia um ou outro país, não me lembro bem qual ou quais, onde era obrigatório trocar uma determinada quantia por dia, mas sempre inferior ao que um português da classe média gastaria, principalmente se fosse de carro e tivesse, portanto, de meter gasolina). Como na Hungria se comia bem e havia vinho Tokay e discos e CDs na Hungaroton, de música erudita, para comprar, recorria frequentemente ao expediente. A “coisa” passava-se assim: alguém nos abordava na rua, combinava-se o câmbio, entrava-se no primeiro vão de escada e o negócio estava feito. Claro que todos sabíamos os cuidados a ter e tomávamos as devidas precauções. Tudo foi correndo bem, até que numa das últimas vezes, talvez porque facilitasse já me achando o maior em tais práticas ilícitas, acabei mesmo por ser vigarizado. Nada de importante, diga-se, pois no cômputo geral, das várias ocasiões, acabei por sair com um saldo bem favorável.

5 estórias fúteis 5 do tempo do "muro" (2)

Checoslováquia, na mesma viagem.

Não gosto de comer nos hotéis onde fico alojado, a não ser quando o cansaço a isso obriga; faz parte das viagens descobrir a gastronomia, a cultura e ambiente locais. Antes de, para aí ao terceiro dia, descobrir o restaurante do centro de cultura soviético, onde se comia razoavelmente, bebia um vinho búlgaro aceitável e um excelente caviar a preços de um refeição média de Lisboa, tinha de procurar restaurante, locais difíceis de lobrigar (excepto nos hotéis) em alguns países “do lado de lá”, utilizando uma expressão cara ao meu pai. Como gosto de descobrir as cidades a pé, lá me punha ao caminho e, depois de me informar, descobria finalmente um restaurante. Sempre vazio ou quase. Quando pedia uma mesa para duas pessoas, resposta imediata: “tem marcação”? Como a ”Coca Cola” do Pessoa, ao princípio estranhava e respondia: “mas o restaurante tem imensas mesas vagas; porque é preciso marcar”? Mas rapidamente percebi: a comida era apenas comprada em função das reservas feitas previamente. Não havia reserva, não havia comida!

Foi a partir daí que descobri a minha salvação no regime soviético e no abençoado restaurante do seu centro cultural onde não só não se exigia marcação (privilégios?) como, acrescente-se, durante todo o tempo era um “corrupio” de empregados a atender o telefone do local. Nunca soube das razões, mas presumo não tivessem telefone em casa.

5 estórias fúteis 5 do tempo do "muro" (1)

Checoslováquia, 1988.

Chego ao aeroporto de Praga vindo de Viena. Apanho um táxi para o hotel, perto do centro da cidade. Estávamos em Junho e disputava-se a fase final do Europeu de futebol, aquele que a Holanda ganhou com o célebre golo de Van Basten. Primeira preocupação, claro, já que estava em turismo e, portanto, tinha todo o tempo livre: saber se poderia ver na TV os jogos mais importantes. Tento junto do taxista, que “arranhava” algum inglês. Resposta: “sim, pode ver no seu hotel”. “Eu vou ver num Sony a cores. Só meu!”. Percebi logo uma coisa: como era taxista conseguia divisas para comprar produtos importados nas lojas exclusivas. Minutos depois tive a confirmação: quando chego à porta do hotel e lhe pergunto o preço da “corrida”, diz-me um preço em coroas (a moeda local). Mas, ao ver que tinha na carteira “shillings” austríacos, de imediato acrescenta: “olhe, mas se me der essa nota (ao câmbio oficial, um valor significativamente inferior) também serve.”

No hotel, de 4 estrelas, percebi logo a excitação da Sony a cores - só dele: apenas no "lounge" existia um aparelho de TV a cores. Nos quartos, o preto e branco era a norma. Mas lá vi o golo de Van Basten, e espero o mesmo tenha acontecido com o meu simpático taxista.

segunda-feira, novembro 09, 2009

História(s) da Música Popular (146)

"Act Naturally" - Buck Owens & The Buckaroos

"Act Naturally" - The Beatles
"Under the Influence" - The original songs of the "British Invasion" (XXIX)
O tema “Act Naturally” condensa em si mesmo três curiosidades: incluído no álbum “Help” (1965), foi o último "cover" gravado e editado pelos Beatles (embora o álbum inclua também “Dizzy Miss Lizzy”, de Larry Williams) antes daquela “salganhada” (desculpa, LT) final com o Phil Spector em que o grupo gravou, mas não editou, “Save The Last Dance for Me” (um original Pomus-Shuman e dos Drifters) não se ficando por aí em matéria de “cover versions”; é interpretado por Ringo Starr, o que, longe de ser facto inédito, era pelo menos relativamente raro; o próprio Ringo tornou a gravar o tema em 1988, agora em dueto com o seu intérprete original, Buck Owens.

E quem era o “tal” Buck Owens (1929-2006)? Um cantor e guitarrista “country”, nascido no Texas mas californiano de adopção, que, ao longo da sua muito longa carreira, consegui alcançar a bonita soma de 21 number one hits, dos quais “Act Naturally”, em 1963, terá sido exactamente o primeiro. O tema foi escrito por um tal Johnny Russell (não me perguntem mais nada...) e reza a lenda que estando Russel com uma namorada e tendo recebido um convite para se juntar a uns amigos numa sessão de gravação em LA terá dito à “pikena” que a razão para a sua viagem seria “'they are going to put me in the movies and make a big star out of me!”, exactamente os primeiros versos da futura canção. Enfim, digamos que “ sí non è vero, è benne trovato!”, o que acontece muitas vezes nestas histórias da música popular. Mas o que é facto é que, pelo menos, foi premonitório, dado a muito honesta carreira que Ringo viria a fazer na arte cinematográfica.

"Wir sind das Volk"



"Good Bye, Lenin" de Wolfgang Becker (2003)

domingo, novembro 08, 2009

O "polvo" e a minha - talvez ingénua - confiança na democracia

As nacionalizações, fruto das circunstâncias políticas no pós-25 de Abril, dos grandes grupos económicos, que, embora à sombra do proteccionismo salazarista, tinham conseguido uma dimensão e estruturas que lhes permitiam algum grau de autonomia face ao Estado, forçaram esse mesmo Estado a criar e fazer crescer rapidamente uma nova burguesia empreendedora que assegurasse a base económica necessária à sobrevivência democrática. Foi esta a base inicial, com especial incidência a norte onde um conjunto de médias empresas, muitas delas exportadoras, tinha conseguido sobreviver às nacionalizações, que, posteriormente fortalecida com o surto de obras públicas “cavaquistas”, gerou a actual promiscuidade entre Estado e negócios, cujos aspectos menos claros e mais criticáveis foram, durante muito tempo, objecto de um consenso entre os partidos de governo (PS, PSD e CDS) para que se mantivessem na sombra, para sobrevivência do regime.

A passagem do país à maioridade mediática - com o “Independente”, a abertura das televisões à iniciativa privada, os canais por cabo e a "internet" - a emergência de uma nova geração de políticos no CDS, travestido de PP, e talvez também a luta pelo domínio das novas oportunidades de negócio que os fundos estruturais e as novas tecnologias trouxeram consigo, colocaram em causa esse consenso estabelecido, e os partidos do regime viram aí aberta uma nova área de luta política para onde foram também arrastadas as polícias de investigação criminal e a comunicação social. Assim, hoje temos a sensação que tanto essa investigação criminal como o jornalismo navegam à medida dos interesses dessa luta política e partidária, servindo os interesses de uns ou outros consoante a conjuntura, a oportunidade e a correlação de forças existente no seu seio.

Aquilo que foi gerado, a seu tempo, pela necessidade de crescimento e consolidação do regime democrático pode também gerar o seu fim? Acredito que não. Apenas ingenuidade optimista? Não penso assim: as democracias e as sociedades abertas, ao contrário das ditaduras e dos regimes totalitários, contêm em si mesmas os genes geradores da sua própria renovação.

Absolut album covers (6)

O Sindicato da Construção Civil do Norte e o acidente de Andorra

Leio que o presidente do Sindicato da Construção Civil do Norte, Albano Ribeiro, afirmou que a obra onde se encontravam a trabalhar os cinco operários portugueses mortos em Andorra não oferecia condições de segurança. Não questionando a razão de Albano Ribeiro, pergunto-me por que razão o sindicato e o seu presidente só agora denunciam o problema, “à posteriori”, pois se o tivessem feito em devido tempo talvez tivesse sido possível salvar as vidas desses cinco operários cuja perda agora se lamenta. Ou será que alertar para este tipo de situações, que possam pôr em risco o bem estar e a integridade física dos seus associados e outros trabalhadores do sector, não é também tarefa deste e de outros sindicatos?

Conclusões: não estarão, deste modo, o Sindicato da Construção Civil do Norte e o seu presidente a afirmar a sua própria negligência e a agir da mesma forma que muitas vezes está na base das críticas que dirigem ao Estado e às associações empresariais, isto é, a agir apenas depois do facto consumado? Ou estarão apenas, de uma forma que demonstra pouco respeito para com as vítimas e seus próximos, para com todos nós que lamentamos o sucedido, para com a inteligência dos portugueses, a querer, de modo oportunista e rasteiro, retirar dividendos da tragédia alheia?

sexta-feira, novembro 06, 2009

George Romero (2)






"Dawn of the Dead" (1978)

O debate do programa do governo e o discurso de Luís Amado

Pelo que me foi dado ouvir e ler (não tive oportunidade de ver em directo), o debate do programa de governo nada, ou quase nada, mais foi do que uma marcação de territórios, um Haka tentando mostrar aos diversos adversários, antes do combate, “olhem bem a minha força”, “vejam que mau que eu sou”. Agora irá mesmo começar o jogo e, tal como no "rugby", de uma conquista de território se trata, de ver qual dos contendores sai derrotado, isto é, abdica de uma maior parcela do seu território/programa em favor do adversário.

Uma excepção: coube a Luís Amado (por quem não nutro especial simpatia, acrescente-se) o melhor discurso do debate, respondendo àquele que tem sido o “leit-motiv” da argumentação oposicionista (principalmente do PSD de Ferreira Leite/ Cavaco Silva) e colocando a discussão no seu terreno correcto: o problema central de Portugal não é o déficit externo ou o endividamento, não sendo a sua resolução, portanto, o problema principal com que o governo se depara. Os objectivos essenciais são políticos; são a modernização e o aumento de competitividade do país, pois só eles poderão fomentar o crescimento e resolver, de forma sustentada, os desequilíbrios existentes no nosso tecido empresarial e social. As questões atrás focadas (graves, sem dúvida), tal como o desemprego, constituem, isso, sim fortíssimos constrangimentos a ter em conta para que esse objectivo seja conseguido de forma mais célere, equilibrada e indolor. Com menores custos sociais, também.

Adriano Correia de Oliveira na RTP Memória

Hoje, às 22.27h, na RTP Memória, José Niza e Rui Pato falam sobre Adriano Correia de Oliveira, o melhor intérprete da canção coimbrã e da poesia de Manuel Alegre e um dos "pais fundadores" da música popular portuguesa tal como hoje a conhecemos. Junta-se-lhe Isabel, filha de Adriano C. de Oliveira.

quarta-feira, novembro 04, 2009

Um bom exemplo


Durante algum tempo era obrigado a viajar em classe executiva nas minhas deslocações profissionais ao serviço de uma entidade privada. Diga-se, desde já, que não podendo, por sistema, aproveitar as tarifas mais reduzidas, com restrições que normalmente inviabilizam quem tem de viajar com datas e voos em aberto ou sujeitas a alteração, o preço de uma viagem em executiva correspondia, “mais coisa menos coisa”, e consoante os voos, ao de uma tarifa normal, pelo que o encargo extra resultante era, ao fim de um ano, quase negligenciável

Claro que nunca me passou pela cabeça, nem sequer nos meus mais surrealistas sonhos, optar por viajar em turística e, com a diferença de custo, quando ela existisse, fazer-me acompanhar por mulher, amiga ou amante: a obrigatoriedade tinha a ver com questões de representação, conveniência e facilidades colocadas à minha disposição pela minha entidade empregadora, normas que não me competiria nunca incumprir. No limite, quando me fazia acompanhar por colega de empresa que não tinha direito a voo em classe executiva, já dentro do avião perguntava a alguém do pessoal de cabina se poderia passar para turística por troca com um outro passageiro que não se importasse de fazer o “upgrade” para executiva (o que, como devem calcular, era fácil), o que me permitia viajar junto com esse colega, conversando e/ou trabalhando.

Penso que a obrigatoriedade dos deputados viajarem em executiva nas suas deslocações ao serviço da República se justificará, pelo menos na maioria das vezes, pelo que a deveriam cumprir. Sempre! Espanto-me que só agora (vá lá saber-se porquê?), e apenas por determinação expressa do Presidente da Assembleia da República, sejam os deputados forçados a agir de acordo com estipulado, não aproveitando para o desdobramento das viagens em benefício familiar ao bom estilo “compre um leve dois”. Esperemos que o bom exemplo de Jaime Gama frutifique, e a metodologia seja extensível aos outros serviços do Estado em que as viagens em classe executiva sejam a norma. E, já agora, que os bónus em milhas só possam ser utilizados por esses mesmos deputados nas suas viagens em trabalho político de representação parlamentar. Os deputados eleitos devem essa manifestação de respeito (no mínimo, essa) a quem os elegeu.

Os Beatles, o "rock n' roll" e a URSS - algumas notas despretensiosas a propósito de um "post" do "IÉ-IÉ" (II)

Bom, em primeiro lugar trata-se de um movimento contestatário do “statu quo”, um pouco anárquico e, por definição, isso é algo com o qual as ditaduras, mais ainda as mais fechadas, como era o caso da soviética, lidam mal. Mesmo, muito mal. Acresce que o movimento tinha muito de afirmação da liberdade do indivíduo perante o sistema, do direito à diferença e à marginalidade, algo que não se vislumbra como poderia ser tolerado na URSS de então. Mais ainda: contestava os comportamentos, a moral dominante e a reprodução dos valores culturais e sociais existentes, desprezava a política nas suas formas de organização tradicional (o Maio 68, a luta pelos direitos cívicos e contra a guerra do Vietnam introduzem novas formas de contestação política), o modo de vestir e comportar socialmente e estes - todas estes - tanto na URSS como no mundo democrático de então, não diferiam assim tanto como possa, à primeira vista, parecer. Musicalmente, integrava também, em si mesmo, um certo apelo à individualidade ou à constituição de pequenos grupos com recusa da erudição das grandes orquestras ou dos grandes solistas patrocinados pelo Estado: uma guitarra e instrumentos improvisados, como os dos "blues" originais ou do "skiffle", resolviam bem o problema. Por último, falando ainda em termos “de sociedade”, sugeriam, ou faziam amiúde recurso a, alguma violência (“mods” e “rockers”, “teddy boys”, “hell angels”) e se, em todas as sociedades, o monopólio da força pertence ao Estado, numa democracia, por definição, existirá alguma tolerância em relação a fenómenos desse tipo, desde que contidos no seu âmbito e na sua amplitude, mas numa ditadura como a soviética, em que apenas um “partido de classe” (o representante da “classe operária”) dirige o Estado e a sociedade, impondo-lhe os seus valores, qualquer contestação a esse monopólio constitui uma manifestação intolerável.

Tudo isto nos conduz para uma outra área, a do político no seu sentido mais restrito. O “rock n’ roll” não tem uma natureza de classe definida: embora nasça, influenciado pelos “blues”, da cultura dos negros mais pobres do sul, torna-se um movimento essencialmente geracional, chegando às "high school", universidades, intelectuais da “Village” e burgueses da classe média californiana. Junta pretos e brancos, alguns ricos mas também muitos pobres. Tem uma ideologia difusa, de contestação, e esse modelo de contestação e o que é contestado vão mudando, ao longo do tempo, consoante se modificam também os valores dominantes do “sistema”: contestam-se, à vez com importância variável a cada momento, a segregação racial, a moral sexual, a autoridade parental, a guerra, o primado do dinheiro, valoriza-se a droga e o “escapismo”, etc, etc. Exaltam-se os valores adolescentes e juvenis - o amor, a música, a dança, a moda, as férias –, digamos que aquilo que pode ser associado a alguma futilidade, muito longe, portanto, do cumprimento dos Planos Quinquenais, da exaltação patriótica, da superioridade da doutrina do “partido”, do colectivo, valores dominantes na URSS de Stalin ou Nikita Khrushchev . Por último, o essencial do movimento político e cultural do “rock n’ roll”, embora depois “exportado” para o reino Unido e para França (Maio 68), tem origem na pátria do capitalismo (USA), em plena guerra fria, sendo quase visto na URSS como que uma quinta coluna destinada a corroer por dentro a juventude soviética, logo, o futuro da pátria do socialismo e do movimento comunista mundial.

Tudo isto poderia ser, claro está, ainda mais aprofundado, o que não está nos objectivos deste, mesmo assim, já demasiado longo “post”. Deste modo, limitei-me apenas a lançar algumas pistas sobre o assunto, esperando que alguém com acesso a mais meios, paciência e capacidade o possa fazer. Que tal meteres mãos á obra, LT?