Para que não se diga que só aqui venho pelo futebol (mais um jogo para esquecer), pelo champanhe ou pelos morangos, entendi ser o tempo de lhe dizer o que já há muito devia ter feito. Considero meritório o trabalho que tem vindo a desenvolver com a divulgação das capas de Cândido Costa Pinto para a Colecção Vampiro, bem como cartazes de filmes e outros cartazes. Há quem não entenda este tipo de iniciativas, problema deles, mas assim também se faz história. Para além de bonitas revelam o quanto os editores de então se preocupavam com a apresentação dos livros. A minha avó dizia que os olhos também comem, e se é possível comprar livros pelos começos, ou pelos finais, uma boa capa de livro é um passo largo para a sua aquisição. As capas do Vespeira para a”Ulisseia”, também as do Cruzeiro Seixas, as do José da Câmara Leme para a “Portugália”, as do Bernardo Marques, do Lima de Freitas para a “Livros do Brasil”.Para além, e não é de somenos, o quanto as editoras, para além de valorizarem as obras, ajudavam os artistas a (sobre)viver com estas colaborações. Conheci o pintor Artur Bual numa exposição no S.N.I. Alguns anos mais tarde, numa patuscada, na cave que ele possuía na Amadora, de atum, azeitonas, queijinhos frescos, um garrafão de tinto, lembrei-lhe o S.N.I. Muito calmamente respondeu: “Fomeca, meu caro, muito espaço no estômago”. Não acrescentou nem mais uma palavra. Claro que o Mário-Henrique Leiria, meu mestre de gin, e não só, amiúde dizia que “posso morrer de fome mas não peço esmola”, ou ainda “para vivir de rodillas vale más morir de pie.” Mas isso era o Mário-Henrique Leiria, um louco genial, e não podemos exigir que todos fossem, ou sejam, como ele. By the way: um dia quando o JC publicar mais uma capa do “Panorama”, que já há tempos não faz, contar-lhe-ei uma história, a “sad story,”
Mtº obrigado. Tenho mais algumas capas da "Panorama" e outras coisas do BM, mas há que fazer "render o peixe". Não gosto tanto das do Lima de Freitas. Quanto ás capas do CCP, devo dizer que muitos livros da Vampiro nem sequer os li; comprava-os pelas capas. Interessante citar o Mário Henrique Leiria, pois outro dia até convenci uma amiga de quarenta e picos anos, que por isso desconhecia o MHL, a comprar os livros dele. Abraço
Mário-Henrique Leiria. Receio bem que, daqui por uns anos, quase ninguém saiba quem foi ,o que por aqui andou a fazer. Como tantos e tantos outros. Conheci-o antes do 25 de Abril, por mero acidente liquido no “Expresso Bar”, ali ao Largo da Trindade. Uma atracção imediata, um espanto que não mais se esquece. Um excelente contador de histórias rasgadas por um humor colorido, gritante, irresistível, demolidor, corrosivo, mas a desfazer-se em ternura Um louco genial, que gargalhava frente à angustia. Era cruel e entendia que a “crueldade é somente um processo quotidiano de exprimir qualquer coisa”, ou como disse o O’Neill: “um amigo que desconfia da amizade. Por instinto. No fundo tem medo que o apanhem nas filigranas de uma ternura qualquer”. Aliás como viemos a saber pela leitura de “Depoimentos Escritos”, Estampa 1997, um livro cruel, lindíssimo. Nele se conta a história de uma paixão que teve por uma alemã, Dietlinde de seu nome, “uma ariana pura” e como ansiava ter uma vida calma com fedelhos pendurados nos joelhos, doces natais. A ariana fugiu com outro, que ela considerou ser o amor da sua vida , e para além de o deixar destroçado e exigir o divórcio ainda lhe levou quadros, discos de música de Natal, música russa e brasileira, jazz. No meio do processo o Mário acaba por se apaixonar, loucamente, pela advogada da mulher, um amor impossível. Não recordo se o MHL tem alguma capa na Colecção Vampiro, sei apenas que traduziu, maravilhosamente,“ O Imenso Adeus” do Raymond Chandler, nº 101 da Colecção, e com uma bela capa de Cândido Costa Pinto. By the way: terei que lhe contar a história da “Panorama” por outra via. Sou um palavroso, não tenho qualquer poder de síntese. Perguntam-me as horas e eu começo por dizer como se fabricam os relógios na Suiça.
3 comentários:
Para que não se diga que só aqui venho pelo futebol (mais um jogo para esquecer), pelo champanhe ou pelos morangos, entendi ser o tempo de lhe dizer o que já há muito devia ter feito.
Considero meritório o trabalho que tem vindo a desenvolver com a divulgação das capas de Cândido Costa Pinto para a Colecção Vampiro, bem como cartazes de filmes e outros cartazes. Há quem não entenda este tipo de iniciativas, problema deles, mas assim também se faz história. Para além de bonitas revelam o quanto os editores de então se preocupavam com a apresentação dos livros. A minha avó dizia que os olhos também comem, e se é possível comprar livros pelos começos, ou pelos finais, uma boa capa de livro é um passo largo para a sua aquisição. As capas do Vespeira para a”Ulisseia”, também as do Cruzeiro Seixas, as do José da Câmara Leme para a “Portugália”, as do Bernardo Marques, do Lima de Freitas para a “Livros do Brasil”.Para além, e não é de somenos, o quanto as editoras, para além de valorizarem as obras, ajudavam os artistas a (sobre)viver com estas colaborações.
Conheci o pintor Artur Bual numa exposição no S.N.I. Alguns anos mais tarde, numa patuscada, na cave que ele possuía na Amadora, de atum, azeitonas, queijinhos frescos, um garrafão de tinto, lembrei-lhe o S.N.I. Muito calmamente respondeu: “Fomeca, meu caro, muito espaço no estômago”. Não acrescentou nem mais uma palavra.
Claro que o Mário-Henrique Leiria, meu mestre de gin, e não só, amiúde dizia que “posso morrer de fome mas não peço esmola”, ou ainda “para vivir de rodillas vale más morir de pie.”
Mas isso era o Mário-Henrique Leiria, um louco genial, e não podemos exigir que todos fossem, ou sejam, como ele.
By the way: um dia quando o JC publicar mais uma capa do “Panorama”, que já há tempos não faz, contar-lhe-ei uma história, a “sad story,”
Mtº obrigado. Tenho mais algumas capas da "Panorama" e outras coisas do BM, mas há que fazer "render o peixe". Não gosto tanto das do Lima de Freitas. Quanto ás capas do CCP, devo dizer que muitos livros da Vampiro nem sequer os li; comprava-os pelas capas. Interessante citar o Mário Henrique Leiria, pois outro dia até convenci uma amiga de quarenta e picos anos, que por isso desconhecia o MHL, a comprar os livros dele.
Abraço
Mário-Henrique Leiria.
Receio bem que, daqui por uns anos, quase ninguém saiba quem foi ,o que por aqui andou a fazer. Como tantos e tantos outros.
Conheci-o antes do 25 de Abril, por mero acidente liquido no “Expresso Bar”, ali ao Largo da Trindade. Uma atracção imediata, um espanto que não mais se esquece. Um excelente contador de histórias rasgadas por um humor colorido, gritante, irresistível, demolidor, corrosivo, mas a desfazer-se em ternura
Um louco genial, que gargalhava frente à angustia. Era cruel e entendia que a “crueldade é somente um processo quotidiano de exprimir qualquer coisa”, ou como disse o O’Neill: “um amigo que desconfia da amizade. Por instinto. No fundo tem medo que o apanhem nas filigranas de uma ternura qualquer”. Aliás como viemos a saber pela leitura de “Depoimentos Escritos”, Estampa 1997, um livro cruel, lindíssimo. Nele se conta a história de uma paixão que teve por uma alemã, Dietlinde de seu nome, “uma ariana pura” e como ansiava ter uma vida calma com fedelhos pendurados nos joelhos, doces natais. A ariana fugiu com outro, que ela considerou ser o amor da sua vida , e para além de o deixar destroçado e exigir o divórcio ainda lhe levou quadros, discos de música de Natal, música russa e brasileira, jazz.
No meio do processo o Mário acaba por se apaixonar, loucamente, pela advogada da mulher, um amor impossível.
Não recordo se o MHL tem alguma capa na Colecção Vampiro, sei apenas que traduziu, maravilhosamente,“ O Imenso Adeus” do Raymond Chandler, nº 101 da Colecção, e com uma bela capa de Cândido Costa Pinto.
By the way: terei que lhe contar a história da “Panorama” por outra via. Sou um palavroso, não tenho qualquer poder de síntese. Perguntam-me as horas e eu começo por dizer como se fabricam os relógios na Suiça.
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