domingo, dezembro 28, 2008

Tristeza...

Coincidem nos portugueses dois tipos de atitudes muito características que só aparentemente se excluem ou são incompatíveis, frequentemente, mesmo, habitando na mesma pessoa que as exterioriza consoante o tempo, o modo e o lugar. Por um lado, um certo “bota-baixismo”, um radicalismo maximalista e, por isso mesmo, inconsequente e inócuo nos resultados, muito visível nos fóruns de opinião e nos comentários da blogosfera: tudo é mau, péssimo, mesmo, e a culpa, quase sempre, é dos políticos, dos governantes, dos “ricos e poderosos”, de quem “anda na estrada” para se divertir e não para trabalhar, como dizem os taxistas. A solução proposta é quase sempre razoavelmente simples: se fossem adoptadas as soluções propostas por ouvintes, telespectadores e autores dos comentários de rodapé, que com poucas excepções passam pelo combate a esses mesmos “ricos e poderosos” que eles – autores dos comentários - gostam de ver nas revistas “do social” porque, no fundo, gostariam de ser “como eles, ”viver-se-ia na abundância, no paraíso da justiça terrena, na “terra do leite e do mel”, no jardim das delícias. É a frustração por vidas mal vividas, pela “sepultura de barras cinzelada que deixa ver a vida que não temos”, pelo dia-a-dia cinzento e sem esperança, pela contradição entre a miséria que se não pediu e a abundância tantas vezes prometida e sempre adiada. Claro que os tais “ricos e poderosos” se põem muitas vezes (demasiadas – tão demasiadas) “a jeito”, mas, apesar das desigualdades, nunca se viveu tão bem em Portugal como no último decénio. A enorme maioria, e não apenas alguns.

Mas a este sentimento junta-se um outro, só aparentemente incompatível: uma enorme falta de rigor e uma total condescendência crítica para com situações e pessoas. Este tipo de atitude é principalmente visível na imprensa desportiva, por exemplo, que constrói ídolos tão rapidamente como essa imagem se auto-destrói quando muitos desses praticantes vão competir para campeonatos muito mais exigentes. Também já por aqui falei - um pequeno fait divers e assunto que conheço bem - nas classificações dos guias de vinhos, onde qualquer nota abaixo de 15 (em 20), quase inexistente nesses mesmos guias, significa que cá por casa nunca se beberá tal coisa nem se oferecerá aos amigos. Mas este é também sentimento dominante quando muitos tentam olhar com nostalgia o passado, incapazes de uma atitude crítica como se essa fosse condição para destruir as memórias das quais se molda a quase totalidade do seu presente. Ou em algumas personalidades da política, das artes e do espectáculo, que, a páginas tantas, já ninguém é capaz de explicar das razões da sua tão apregoada genialidade. Esta é uma atitude característica das sociedades pouco livres, demasiado dependentes do estado e das corporações, pequeninas e provincianas, em que domina o sentimento “é melhor estar quieto porque não consigo fazer nada e, no fim, ainda me lixo”. Em que muitos tem medo de enfrentar os seus próprios fantasmas, tal como tiveram medo de enfrentar a vida que esses fantasmas agora povoam. Claro que uma herança do salazarismo, do “nojo” da política, de súbditos e não de cidadãos, mas, em certa medida, esse foi também o caldo de cultura que fez medrar e eternizar a ditadura do “Estado-Novo”.

No fundo, ambas são atitudes com a mesma raiz: o subdesenvolvimento gerador da ignorância, do desconhecimento da razão e causa das coisas, do medo, da inveja, da falta ou pequenez de horizontes. Também do sentimento “contentinho da Silva” quando, mesmo que apenas por um fugaz momento, pelos tradicionais “cinco minutos de fama”, se consegue sair do anonimato nem que seja por uma qualquer realização de circunstância ou sem especial valor ou relevância fora do “bairro”, do círculo restrito dos amigos bajuladores que, assim, sentem que também compartilham um pouco dessa suposta “notoriedade”.
Tristeza...

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