Conjunto António Mafra - "O Vinho da Clarinha"
Para a maior parte da minha geração - a dos Beatles e da “British Invasion” - tudo o que não fosse música de origem anglo-saxónica, com uma ou outra incursão, nem sempre muito convicta, pela chamada “canção de texto” de língua francesa, era considerado blasfémia, traição à música que moldava e estava na base das mudanças em curso, nos valores e comportamentos. Mais tarde, já pela segunda metade dos anos 60, começámos a ouvir melhor José Afonso, ainda no tempo das baladas coimbrãs, antes da rendição definitiva aos “pais fundadores”, juntando a este, já Abril se aproximava, Adriano, José Mário Branco e Sérgio Godinho.
Mas isto acontecia connosco, jovens urbanos, estudantes pertencentes a uma elite. Havia um outro Portugal, o dos bairros populares, o do folclore rural. Também o da geração dos nossos pais, que venerava Sinatra, Tony Bennett, as grandes orquestras, o festival de San Remo e até talvez tivesse alguma abertura para com os Calvários e Madalenas, o Eugénio Pepe e o Galarza, enfim, a música pré rock & roll.
No meio disto tudo, como classificar António Mafra? Era “bimbo”, claro, com ressonâncias de ruralidade, ou melhor, pertencia àquele território do norte, do Porto-cidade onde a ruralidade ainda se misturava (e, aqui e ali, isso ainda acontece) com uma vivência urbana mal e recentemente assumida. Diria que é um hinterland muito específico, que talvez esteja em extinção e não é possível encontrar em qualquer outro lado. Mas, o tom fácil das melodias e o jocoso, muitas vezes brejeiro, das letras cedo também nos "caiu o goto", num tempo em que pequenas coisas hoje inocentes eram suficientes para afirmarmos a nossa identidade de geração, a nossa irreverência fosse face aos mais velhos ou ao regime. Por isso lhe achávamos graça e, volta e meia, lá se incluía um tema numa festa de garagem ou o trauteávamos, para escândalo geral, no autocarro que nos levava e trazia do liceu. Foi, podemos dizê-lo com total verdade, um antecessor de Quim Barreiros, mas com uma outra elegância, um sentido de humor mais “fino”, como diriam no norte.
Mais tarde, por via do correr dos anos e do nosso envelhecimento, da adaptação de Sérgio Godinho de um dos seus temas (“O Carteiro”), virou kitsch, o “piroso artístico”, como diz um amigo meu. Fosse o que fosse, seja o que seja, quando saiu uma sua colectânea em CD corri a comprá-la e, tal como acontece com os filmes de Vasco Santana e António Silva, não consigo deixar de rir cada vez que oiço um dos seus temas.
Pois aqui deixo a minha homenagem pelo tanto que me divertiram e, como estamos no S. Martinho, nada mais apropriado do que este tema, bem definidor do que era a música do grupo.
Mas isto acontecia connosco, jovens urbanos, estudantes pertencentes a uma elite. Havia um outro Portugal, o dos bairros populares, o do folclore rural. Também o da geração dos nossos pais, que venerava Sinatra, Tony Bennett, as grandes orquestras, o festival de San Remo e até talvez tivesse alguma abertura para com os Calvários e Madalenas, o Eugénio Pepe e o Galarza, enfim, a música pré rock & roll.
No meio disto tudo, como classificar António Mafra? Era “bimbo”, claro, com ressonâncias de ruralidade, ou melhor, pertencia àquele território do norte, do Porto-cidade onde a ruralidade ainda se misturava (e, aqui e ali, isso ainda acontece) com uma vivência urbana mal e recentemente assumida. Diria que é um hinterland muito específico, que talvez esteja em extinção e não é possível encontrar em qualquer outro lado. Mas, o tom fácil das melodias e o jocoso, muitas vezes brejeiro, das letras cedo também nos "caiu o goto", num tempo em que pequenas coisas hoje inocentes eram suficientes para afirmarmos a nossa identidade de geração, a nossa irreverência fosse face aos mais velhos ou ao regime. Por isso lhe achávamos graça e, volta e meia, lá se incluía um tema numa festa de garagem ou o trauteávamos, para escândalo geral, no autocarro que nos levava e trazia do liceu. Foi, podemos dizê-lo com total verdade, um antecessor de Quim Barreiros, mas com uma outra elegância, um sentido de humor mais “fino”, como diriam no norte.
Mais tarde, por via do correr dos anos e do nosso envelhecimento, da adaptação de Sérgio Godinho de um dos seus temas (“O Carteiro”), virou kitsch, o “piroso artístico”, como diz um amigo meu. Fosse o que fosse, seja o que seja, quando saiu uma sua colectânea em CD corri a comprá-la e, tal como acontece com os filmes de Vasco Santana e António Silva, não consigo deixar de rir cada vez que oiço um dos seus temas.
Pois aqui deixo a minha homenagem pelo tanto que me divertiram e, como estamos no S. Martinho, nada mais apropriado do que este tema, bem definidor do que era a música do grupo.
7 comentários:
O antepassado é muitissimo melhor, se é que se podem dizer destas coisas em público. Fez parte da minha formação musical, seja lá o que isso for. Pelos mesmos tempos o "Cojunto da Maria Albertina e tantos outros a passarem pelo cinzento país que éramos, ou que somos, para ir direito à tiste realidade
Como costumo dizer, há coisas que só podem ser do (ou existir no) Porto. Esta é uma delas...
Na mouche, meu caro, na mouche! Aparentemente sou da mesma geração e partilho inteiramente os seus pontos de vista. Eu vou mais longe! Nem do Elvis eu conseguia gostar! Só mesmo Beatles e British Invasion e a tal canção de texto, Zeca Afonso... Lá fui moldando a "minha formação musical, seja o que isso for" e lá me fui adaptando. António Mafra? Pois claro? Trio Odemira? pois claro, às escondidas nos bailes de garagem para "galvanizar".
LPA
Trio Odemira, nem tanto, embora lhes fosse deitado um olhar de alguma curiosidade. Mas, já agora - acho vem de alguma maneira a propósito - uma das minhas "taras" são os "mariachis". Para quando, lá no blog, uma capa?
Abraço
No México, acho que foi o único disco que eu comprei. Vou tratar disso no fim de semana.
LT
Mariachis, América Latina. Ora aqui estão outras músicas que fizeram a minha formaçãp musical, seja lá o que isso for. Num dos 2 ou 3 álbuns gravados em espanhol por Nat "King" Cole, a voz azul que se ouve, dizem, como música de fundo no "Gambrinus", há uma canção "Mañanitas" acompanhada por Mariachis, que é uma daquelas canções que transporto pelos tempos.
Para quem não sabe, se há alguém que não saiba, a palavra "mariachi" deriva do francês "mariage" (casamento), já que os "ditos cujos" grupos musicais têm como origem a sua actuação em casamentos.
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