"The Go-Between", de Joseph Losey (1970)
Confesso algum desprezo por aqueles que, pronunciando-se sobre filme, livro, vinho ou peça musical da sua vida (se é que isso existe – o que duvido), citam, sem hesitar, “Citizen Kane”, talvez o “Ulisses” do Joyce, de certeza o “Barca Velha” e, com boa hipótese de não falhar, a 9ª de Beethoven, de preferência numa daquelas interpretações de referência da Filarmónica de Berlim dirigida pelo von Karajan. Acho sempre que são gente pouco vivida, que nunca leu, bebeu ou viu tal coisa ou, se o fez, isso aconteceu por dever e não por gosto, por fastio e não por devoção e descoberta, de certeza por ausência de paixão. Por certo, gente sem alma, que nunca percebeu que a vida (a nossa e a dos outros – a de todos) nos pode conduzir a devoções pouco ou nada consentâneas com a razão – como, aliás, o devem ser sempre – e, assim, tornar nossos objectos de culto pequenas coisas que estão longe de se poderem considerar obras-primas, citadas a “torto e a direito” quando na hora de elaborar rankings de conteúdo mais ou menos magazinesco.
Lembro-me sempre disso a propósito de um dos meus filmes (que é também um romance) de culto, que, longe de ser um filme menor de um cineasta ignorado, nunca aparecerá por certo incluído num desses rankings do século ou da história do cinema, o que quer que seja que isso signifique. “The Go-Between”, de Joseph Losey (ou de L. P. Hartley, se preferirem o romance mas este não “tem” uma Julie Christie lindíssima), é um filme sobre a perda da inocência, que, muitas vezes, começa quando na pré adolescência nos apaixonamos platonicamente por alguém muito mais velho. Mas “The Go-Between” é muito mais do que isso, pois, nele, essa perda de inocência, para além da dor de ver que o “ente amado” usa essa paixão em proveito do seu amor por um terceiro, transformando-nos em mensageiro de e por esse mesmo amor, é acompanhada pela descoberta traumatizante da sociedade de classes e das suas convenções amesquinhantes para quem não pertence ao “topo” e as não domina, pelo desvendar do sexo pelo seu lado pecaminoso e adúltero, pelo suicídio como solução para o que a vida não pode consentir. É uma entrada demasiado brutal no mundo dos adultos, que marcará para sempre a vida de quem assim perdeu a inocência.
O que é para mim curioso é que, apesar de nada, ou muito pouco, no filme ter que ver com experiências por mim vividas enquanto criança, adolescente ou adulto (o que costuma ser essencial neste tipo de ligações), algo de semelhante que me tenha conferido carácter e moldado personalidade, tenha de tal modo compreendido e identificado os seus valores a ponto de filme e livro se terem transformado em objectos de culto que me seguem e seguirão para todo o lado e todo o sempre. Também para aqui, para este “Gato Maltês”, por isso, e disso, deixando aqui testemunho.
Lembro-me sempre disso a propósito de um dos meus filmes (que é também um romance) de culto, que, longe de ser um filme menor de um cineasta ignorado, nunca aparecerá por certo incluído num desses rankings do século ou da história do cinema, o que quer que seja que isso signifique. “The Go-Between”, de Joseph Losey (ou de L. P. Hartley, se preferirem o romance mas este não “tem” uma Julie Christie lindíssima), é um filme sobre a perda da inocência, que, muitas vezes, começa quando na pré adolescência nos apaixonamos platonicamente por alguém muito mais velho. Mas “The Go-Between” é muito mais do que isso, pois, nele, essa perda de inocência, para além da dor de ver que o “ente amado” usa essa paixão em proveito do seu amor por um terceiro, transformando-nos em mensageiro de e por esse mesmo amor, é acompanhada pela descoberta traumatizante da sociedade de classes e das suas convenções amesquinhantes para quem não pertence ao “topo” e as não domina, pelo desvendar do sexo pelo seu lado pecaminoso e adúltero, pelo suicídio como solução para o que a vida não pode consentir. É uma entrada demasiado brutal no mundo dos adultos, que marcará para sempre a vida de quem assim perdeu a inocência.
O que é para mim curioso é que, apesar de nada, ou muito pouco, no filme ter que ver com experiências por mim vividas enquanto criança, adolescente ou adulto (o que costuma ser essencial neste tipo de ligações), algo de semelhante que me tenha conferido carácter e moldado personalidade, tenha de tal modo compreendido e identificado os seus valores a ponto de filme e livro se terem transformado em objectos de culto que me seguem e seguirão para todo o lado e todo o sempre. Também para aqui, para este “Gato Maltês”, por isso, e disso, deixando aqui testemunho.
4 comentários:
Lembro-me perfeitamente deste filme, sobretudo da belissima fotografia. É pena por isso que a edição DVD da zona 2 não seja em widescreen. E acho que nem legendas em inglês tem. Esperemos que qualquer dia apareça uma edição mais condizente com o valor do filme. Mas para mim Joseph Losey atingiu o cume no "Criado / The Servant", este felizmente já disponível no mercado português.
Tb gosto mto de "O Acidente", que infelizmente não revejo há anos. E conrariamente à crítica, achei bem graça a "Modesty Blaise". Mas Losey parece ser um cineasta um pouco esquecido.
Abraço
Joseph Losey? Era um dos meus preferidos! E tive o prazer de o "conhecer" pessoalmente aqui há uns anos, em Londres, numa conferência internacional. Ainda há pouco revi "O Acidente", acho que no Hollywood.
LPA
Vantagens de ser jornalista! Vou ver se encontro o "Acidente" no Blockbuster".
Abraço
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