quinta-feira, junho 24, 2010

Queiroz...

Será possível pensar um pouco sobre o perfil de Carlos Queiroz sem nos entrincheirarmos em barricadas opostas a lançar pedras sobre o “inimigo”? Sem “Benficas”, Sportingues” e “Portos” e sem opções partidárias a toldarem-nos o raciocínio? Sem ódios, sem Scolaris e sem o seu “peão de brega” (de Queiroz) Rui Santos a moverem-nos na nossa pretensão? Pelo menos, acho vale a pena tentar, pelo menos numa breve abordagem. Vejamos...

Queiroz não tem CV que se veja? Nunca ganhou nada de relevante como treinador sénior? Verdade: nas suas passagens como treinador principal por clubes, mesmo pelo Real Madrid e pelo SCP, e selecções de segunda linha nunca venceu uma prova importante. O contraste com José Mourinho chega a tornar-se cruel e o povo, nas suas análises, é tão cruel e impiedoso como as crianças quando marginalizam o “gordo” da turma.

Os seus títulos de sub-20 pouco ou nada valem? O seu valor é relativo se consultarmos a lista de selecções que venceram títulos na categoria - onde não constam Itália, Inglaterra, Holanda, França e a Alemanha já desde o longínquo ano de 1981, ainda como RFA - e o método utilizado para os conquistar: Queiroz, ao mau estilo terceiro-mundista, retirou os jogadores aos clubes durante longos períodos de estágio e, desse modo, fê-los ganhar consistência de equipa e evoluir prematuramente. De qualquer modo, veremos de seguida como esse trabalho e essas conquistas se enquadram bem no seu perfil.

Significa isto que Queiroz "não percebe nada de futebol" e é apenas um treinador para os “miúdos” ou um bom adjunto? Mais devagar. Carlos Queiroz é, com certeza, um profundo conhecedor do futebol. Possui uma licenciatura adequada com especialização na área, treinou em grandes equipas do primeiro mundo futebolístico, conviveu com excelentes treinadores, clubes com uma estrutura organizada, selecções nacionais, etc, etc. Então o que tem falhado?

Em minha opinião, Carlos Queiroz parece ter fundamentalmente o perfil de um académico, e como acontece frequentemente com os académicos, alguns deles brilhantes, é primordialmente um homem de “back office” tendo dificuldade em assumir o papel de “executivo”, de líder e decisor de um grupo. Falta-lhe carisma (algo que lhe tem sido frequentemente apontado), lida mal com as ”luzes da ribalta”, tem dificuldade em encontrar um discurso motivador e mobilizador (a “gaffe” da “porcaria” da FPF acompanhá-lo-á para toda a vida) e em passar para a opinião pública uma ideia-força (quando o tenta, soa “pífio”). Sobra-lhes – aos académicos - normalmente em conhecimentos e profundidade de análise o que lhes falta em capacidade para hierarquizarem os problemas e soluções, definindo o que é fundamental e o que se revela apenas acessório, o que dificulta a abordagem dos problemas e o subsequente encontrar de soluções. Como são preferencialmente estudiosos, raramente possuem o dom da comunicação e o “povo” prefere todos os José Hermano Saraiva deste mundo a alguém como José Mattoso, por exemplo. Por possuírem este perfil, esta personalidade e características, têm dificuldades trabalhar sujeitos a “deadlines”, em perceber que o tempo é um bem escasso no mundo dos não-académicos e sentem-se incompreendidos e inseguros, têm pouca paciência quando questionados pela “pessoas comuns”, por quem os pressiona e quer resultados em tempo considerado útil. Enfim, poderia continuar mas tornar-se-ia fastidioso.

Este parece-me ser o perfil que mais se enquadra na personalidade do actual seleccionador nacional, assim sendo, alguém mais talhado para um cargo de director técnico de uma federação do que para um lugar de executivo, como o é o de um treinador. Significa isto que nunca poderá ter sucesso como treinador de primeira linha? Num clube, onde tudo é mais frenético, onde teria de conviver com uma hierarquia desportiva e financeira impaciente e por vezes agressiva, com solicitações de vária ordem na área social para os jogadores, onde passaria grande parte do seu tempo a actuar como gestor de conflitos, tenho sérias dúvidas. Numa selecção como a portuguesa, onde a pressão é menor e se tiver tempo para um trabalho estruturado, de organização, pode conseguir deixar alguns frutos em termos de formação e até mesmo, eventualmente,alcançar um ou outro resultado um pouco mais relevante na selecção principal. Veremos se o consegue...

Como vimos, nem Deus nem Diabo.

7 comentários:

Anónimo disse...

Caro JC

Discordo, mas só em parte, da sua fundamentada análise.

Na minha modesta opinião, o episódio da m... da Federação e o recente ataque à FIFA e arbitragem, a propósito de uma ligadura, evidenciam características ainda mais desaconselháveis para um cargo de grandes responsabilidades não executivas, que a circunstância de não ter um único título competitivo para treinar de seniores.

Como treinador ainda poderia surpreender tudo e todos, ao conhecer, finalmente, o caminho do sucesso ( dispõe agora de oportunidade única ).

Porém, com as referidas atitudes, CQ já tratou de minar, na “praxis”, a possibilidade de um cargo federativo que o Caro JC fundamentadamente lhe confere, e que eu, em teoria, também reconheceria, digo mais, se fossem aquelas as suas reais qualidades então deveria ter sido “ab initio” contratado para tais funções e não como treinador.

É que, como titular de responsabilidades federativas não executivas, exige-se bom trato, diplomacia ( a FPF só pode ter interesse numa boa relação com a UEFA e FIFA até para mostrar que está à altura de organizar um Mundial) bom senso para ultrapassar conflitos e não invectivas ou atitudes drásticas.

Se não for bem sucedido neste Mundial para o cargo que foi contratado, mais dificilmente se vislumbra o merecimento para um “prémio” federativo daquela natureza.
CQ está ao serviço da FPP e não o contrário.

JR

Queirosiano disse...

Devo dizer que parti para o personagem de forma desapaixonada: nada especialmente contra ou a favor, apenas a expectativa do que iria fazer.

Com o passar do tempo deixou(-me)a impressão de que navega à vista, sem ideias claras, sem uma linha de força que defina a selecção e o seu trabalho, sem capacidade de agir sobre os acontecimentos e sem capacidade de motivar quem com ele trabalha. Esses traços de personalidade parecem-me espelhados nas exibições medrosas e desorganizadas da selecção ao longo de toda a fase de qualificação.

Académico ? É claro que terá alguma qualificação académica, mas não me parece que a pusilânimidade, a indecisão e a falta de um rumo claro sejam uma espécie de "defeito de classe" imputável aos académicos, por contraposição aos "homens de acção" ou "de terreno". Conheço alguns académicos, de áreas variadas, que são exemplos de clareza, de lucidez e de determinação.

A meu ver, ele é, em grande medida, produto de certa "imprensa" marginal, extasiada com o facto de usar o título de Professor - passam a vida a encher a boca com isso -, de ter passado pelo estrangeiro (a tal imprensa é irremediavelmente salioa) e de parecer que sabe falar inglês (posso confirmar: fala uma espécie de pidgin english).

Pena é que não saiba falar Português. Provavelmente os problemas de comunicação dele começam por aí.

Parece-me também muito pouco cosmopolita para alguém que tem corrido mundo. Sintoma de que não aprendeu grande coisa...?

Será a selecção capaz de nos surpreender ? Não enjeito a possibilidade, atendendo às surpresas que têm vindo a acumular-se neste mundial. Pessoalmente, penso que as expectativas são baixas, mas, como diria o outro, reunidas as condições ideais de temperatura e pressão...

Independentemente do que venha a acontecer - e mesmo que, por absurdo, Portugal viesse a ser campeão do mundo - julgo que se trata simplesmente de um "jeitoso" à escala nacional, que beneficiou de alguns preconceitos favoráveis e que teve um ou outro momento de esperteza (chamemos-lhe assim) - como o exemplo que deu das selecções juvenis.

Parece-me pouco, em termos de substância - ou mesmo de forma - para poder aspirar a qualquer coisa de verdadeiramente consequente. Um treinador, diria, à imagem do que é a federação e mesmo o futebol português.

Cumprimentos

JC disse...

Obrigado pelas v/ opiniões. Apenas uma nota: não desvalorizo os académicos, mtº menos os contraponho aos "homens do terreno". Falo dos académicos em termos médios. Haverá excepções, caro Queirosiano, mas tb mtºs que confirmam a regra. Um exemplo? Guterres foi um dos melhores alunos de sempre do IST e deu num medíocre PM. Mariano Gago, ao que dizem seus colegas, um génio, é um ministro s/ história. E não é preciso acrescentar a inabilidade política Cavaco Silva: fui seu aluno e conheço-o + ou - bem.Quanto aos homens do terreno, mtº menos os valorizo face a quem tem qualificações académicas. Estas são essenciais e não confundo possuí-las com ser "académico". Mourinho possui essas qualificações e não tem quaisquer características de "académico". O mesmo se poderá dizer de Mário Soares, p. exemplo. devo dizer que me identifico bem mais c/ o estilo destes últimos...
Abraço

JT disse...

O homem terá qualidades para ter sido contratado (em duas ocasiões) pelo Manchester United (e por alex Ferguson)

Mas será que alguma vez teria hipóteses de ser o treinador principal do Man United

Já agora qual a opinião do JC sobre outros treinadores portugueses como Manuel José ou Manuel Cajuda (pouco "académicos").

Teriam perfil para seleccionador ?

E o Jesualdo ? (académico como o CQ, mas com provas dadas no SCB e FCP)

JC disse...

1. Como digo no "post", dificilmente teria sucesso como treinador principal numa grande equipa. por isso mesmo, e tendo tb em vista a cultura de clube do Man. United, dificilmente seria alguma vez convidado para passar a treinador principal.
2. Cajuda e Manuel José nem sequer para treinadores dos 4 ou 5 maiores clubes em Portugal têm perfil. São treinadores medíocres.
3: Jesualdo poderia ser uma hipótese futura para a selecção.Tem formação académica e resultados no seu CV. Mas a sua passagem pelo FCP e, principalmente, o ter "assumido as dores de P. da C.", inviabilizam essa solução.

Rui Baptista disse...

Rui Baptista disse...
Neste mar de "elogios" a Carlos Queiroz, ocorre-me um pensamento de António Vieira: "Quando se olha com simpatia para o rato preto até o rato preto nos parece branco; quando se olha com antipatia para o cisne branco, até o cisne branco nos parece preto".

A minha defesa pública (em blogues e artigos de jornais, etc.) de Carlos Queiroz, reporta-se a épocas anteriores à data em que ele foi nomeado seleccionador nacional pela FPF para o Campeonato Mundial de Futebol 2010.

A este respeito, apresento a opinião abalizada de Joseph Blatter, ao tempo secretário-geral da FIFA:"Carlos Queiroz e os seus jogadores praticam o verdadeiro...futebol do futuro" (Entrevista ao jornal "A Bola", 23 de Junho de 91).

Figo, Paulo de Sousa, Rui Costa, João Pinto,etc., bem o demonstraram por esses campos de futebol em que a sua inegável qualidade de executantes se tornou lendária. Inclusivamente na seleccão nacional que, sob a batuta de Scollari, se classificou em segundo lugar no campeonato europeu, onde o Deco apresentou uma forma físico-táctica invejável, bem mais acima que a actual.

Agora, se a intenção for um campeonato de simpatia e popularidade Scollari superioriza-se a Carlos Queiroz. Sem dúvida! E aqui, a minha voz cala-se.

A polémica está lançada numa discussão em que espero que o coração se não sobreponha à razão. Como reconheceu Pascal: "O coração tem razões que a razão desconhece".

Apenas gostaria que se discutisse o académico Carlos Queiroz, e não a sua simpatia ou antipatia. Quantos de nós não tivemos professores medíocres que escondiam a sua mediocridade através de uma simpatia esfusiante?

JT disse...

Cajuda e Manuel José medíocres ????

Já agora qual era a sua opinião sobre Jorge Jesus antes de ser contratado pelo seu SLB ?