sexta-feira, setembro 11, 2009

Ainda as PMEs

Finalmente, há uns dias (ou seriam semanas?) vi alguém com responsabilidades chamar a atenção para a falta de rigor da definição PME e a demagogia com que o tema é abordado. Estou a falar de José Luís Saldanha Sanches, que o fez, ou pelo menos tentou fazer porque mal o deixaram, num daqueles “frente a frente”, na sua maioria desinteressantes, da SIC Notícias. Inclusivamente, não deixou de se referir à origem, se não do termo, pelo menos da categoria tal qual ela é, hoje em dia, considerada: o PCF e o “Programa Comum de Esquerda” já lá uns bons quarenta ou mais anos. Pois uma boa oportunidade para deixar aqui excertos de dois “posts” do “Gato Maltês” sobre o assunto, datados de 2 e 19 de Fevereiro deste ano, respectivamente.

"Post" de 2 de Fevereiro de 2009: "A crise financeira e económica trouxe para a ordem do dia as chamadas “pequenas e médias empresas” (PME) concedendo-lhes uma visibilidade e uma oportunidade únicas para aumentarem o seu poder reivindicativo em função do número de postos de trabalho que representam e da sua aparente fragilidade que os pode facilmente pôr em risco. No entanto, dizem-me teoria e experiência que o sector está muito longe de se poder considerar homogéneo, isto é, enquadrável numa categoria que se poderia caracterizar, a traço grosso, por empresas familiares, de gestão incipiente ou pouco rigorosa, antiquada, demasiado centralizada na figura do “patrão” e sem pessoal qualificado, com dificuldades de crédito (a montante) e de acesso aos mercados em condições de competitividade (a jusante). Mais, usando uma terminologia cara ao PCP (aliás, penso que esta definição pouco rigorosa de PME tem origem ou foi desenvolvida no PCF dos anos 60, preparando o caminho para o Programa Comum da Esquerda), sector (as tais PME) vivendo espartilhado, em termos de proveitos e capacidade de desenvolvimento, pelo “grande capital”.

Se este “quadro” poderá ajudar a caracterizar muitas delas, existe um largo número que dele está bem longe: não só possuem uma gestão moderna e eficiente, com pessoal qualificado, como desenvolveram know how avançado no seu sector de negócio e acesso e conhecimento aprofundado dos mercados em que operam. Mais ainda, operam em pequenos segmentos e nichos altamente competitivos e a sua existência e desenvolvimento não só não é espartilhado pelo “grande capital” (ou “capital monopolista”) como o seu crescimento e lucratividade depende quase exclusivamente - também ele - do sucesso das grandes empresas e dos grupos económicos."

"Post" de 19 de Fevereiro de 2009: "Sugerir o apoio preferencial às PMEs é o mesmo do que manifestar solidariedade para com os mais desfavorecidos ou apelar à paz no mundo: fica sempre bem mesmo quando nada mais significa do que a manifestação de piedosas intenções.

A primeira dificuldade é: como definir PMEs? Em função do volume de negócios? Do número de trabalhadores? Poderia parecer um bom princípio, mas... é suficiente? De ambos e, simultaneamente, não integrarem grandes grupos económicos? “Idem” e por serem empresas maioritariamente de capital nacional? Por serem empresas familiares? Uma história ridícula e que revela essa dificuldade: trabalhei na subsidiária portuguesa de uma multinacional líder no seu sector de actividade que recebeu financiamentos do PEDIP por ser considerada, em Portugal, uma PME!

Segunda dificuldade: uma vez ajustada a definição, é o sector homogéneo? Claro que não. Como
aqui afirmei, coexistem pequenas empresas familiares, de gestão incipiente, produzindo bens de baixo valor acrescentado, sem trabalho qualificado, condenadas a prazo e empresas tecnológicas de gestão eficiente e altamente qualificada, capital intensivas, pertencentes a grandes grupos económicos ou a sectores emergentes, de enorme potencial futuro. Da economia do conhecimento. De multinacionais. Altamente competitivas em mercados exigentes. Respeitadoras do ambiente e sustentáveis. Misturar “alhos com bugalhos” só poderá levar ao descalabro e a falta de rigor nunca foi boa conselheira.

Tendo dito isto... Devem ser apoiadas de igual modo? Mesmo tendo em conta a necessidade de manter o emprego, no curto prazo, a níveis razoáveis, a resposta só pode ser uma: claro que não. Caso contrário estaríamos a financiar a ineficiência, o desperdício, a falta de qualidade e a má gestão, o passado e não o futuro. Isto é, a desperdiçar o dinheiro de todos nós, contribuintes, em projectos inviáveis.

Uma provocação em relação à questão das quotas sugeridas pelo PSD: se um ministério quiser encomendar uma campanha de publicidade deve fazê-lo a uma dessas pequenas agências de “amigos”, muitas vezes constituídas apenas para esse projecto, ou a uma outra, profissional, pertencente a um grande grupo de comunicação? E se uma autarquia quiser montar ou reestruturar a sua rede informática? A quem é competente, assegura um serviço de qualidade, ou a uma pequena empresa amadora, de alguém relacionado com o presidente da câmara local?

Sim, eu sei que são pequenas provocações. Mas necessárias para chamar a atenção de que nem tudo que luz é oiro, nem tudo o que parece é. Por vezes, é mesmo o seu contrário e trará consigo consequências perversas."

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