Depois da intervenção televisiva de ontem de Manuela Ferreira Leite, já deu para perceber qual a estratégia de Cavaco Silva na actual crise política (sim, trata-se de uma crise política): manter-se "resguardado" e em silêncio enquanto vai mandando avançar os seus "peões" (Alexandre Relvas, Ferreira Leite, etc) num cerco que se vai apertando em torno Pedro Passos Coelho, tentando forçá-lo à "rendição", isto é, a reverter algumas das suas anunciadas medidas mais polémicas. Depois, caso isto não seja suficiente, sugerir aos deputados, principalmente aos da maioria, manobrem nesse mesmo sentido. Por fim, tal como já o fez, aguardando seja da iniciativa de alguns deputados o envio do Orçamento de Estado para fiscalização preventiva junto do Tribunal Constitucional. Cavaco Silva tenta assim, manobrando nos bastidores, retomar alguma da influência política perdida nos últimos tempos, e previsível quando um dos mais importantes objectivos tácticos - a eleição de uma liderança "amiga" no PSD - acabou por falhar com a derrota de Ferreira Leite. No fundo, aproveitará a actual fragilidade do governo para reforçar o seu peso político junto deste e evitar perder o PS como aliado. Mas, e porque não assume Cavaco Silva uma posição mais clara e de primeira-linha, como aconteceu quando, ao longo do tempo, actuou no sentido de desgastar os governos de José Sócrates levando este, por fim, à demissão? Bom, por várias razões, e não apenas pela existência de uma proximidade ideológica, que não só não será muito clara como me parece até descartável para o actual Presidente da República.
- Em primeiro lugar porque, estando o país sob intervenção externa, Cavaco Silva, enquanto Presidente da República, não pode nem quer ser acusado de ser o causador de uma crise política grave.
- Em segundo lugar, e face ás debilidades e divisões no PS, Cavaco Silva não vê aí - e se calhar com razão - uma alternativa credível.
- Em terceiro lugar porque, de uma ou de outra forma, Cavaco Silva é o "pai" (melhor dizendo, o "padrasto") deste governo e, de forma indirecta, também da actual liderança do PS, para a qual, levando a anterior direcção do PS à demissão (independentemente dos erros desta), muito contribuiu. Não se irá desautorizar a si próprio.
- Por último, e face à gravidade da situação económica do país e à contestação que a "austeridade", o ajustamento" e o empobrecimento" geram, Cavaco Silva quererá sempre resguardar-se, cultivando a sua imagem favorita de "estar acima dos partidos e dos políticos" e assim passar, mais uma vez, entre os "pingos da chuva".
Em resumo, parece-me ser este o guião", e desiludam-se os que esperam um Presidente da República com uma actuação mais activamente visível nesta conjuntura.
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