A existência, à esquerda, de dois partidos radicais anti-sistema, que valem cerca de 18% do eleitorado, dificulta a constituição, nessa área, de governos de coligação liderados pelo PS? Bom, claro que sim, mas não me parece ser esse o problema essencial para colocar o PS em desvantagem face ao seu rival de direita PSD: assim de repente, não me lembro, na Europa actual, mesmo em países onde existam partidos à esquerda da social-democracia talvez menos anti-sistema do que PCP e BE (Die Linke, por exemplo), de coligações nessa área lideradas por partidos que se reclamam da tradição e prática da social-democracia europeia. Acrescento que em Portugal tal não me pareceria também possível, ou mesmo desejável em função do quadro macro-económico vigente nos últimos vinte anos. O problema encontra-se, isso sim, ao centro, onde a inexistência de pequenos partidos como o Lib-Dem ou o FDP, aliando-se alternadamente à sua esquerda ou à sua direita, quase impede, na prática, o PS de formar governos de coligação. Tal inexistência terá origem no facto de, ao contrário dos seus partidos irmãos socialistas, sociais-democratas e trabalhistas, o PS ter crescido "ao centro", de forma demasiado rápida e um pouco artificialmente, fruto de circunstâncias conjunturais durante o PREC e por via da sua luta anti-comunista, sem inserção no mundo operário e do trabalho. Ocupou assim o lugar de pequenos partidos centristas liberais, de raiz e tradição burguesas e urbana, alguns deles pouco mais do que partidos "de quadros". Aquilo que poderia ter sido o CDS de Freitas do Amaral e Amaro da Costa, por exemplo, e cuja melhor expressão talvez esteja, fora do espectro partidário, na SEDES dos anos 70.
Certo, mas apesar disso o PS esteve, nos anos 70 e 80, presente em dois governos de coligação, com o CDS e com o PSD. E, se considerarmos também os governos AD, até meados dos anos 80 a norma em Portugal será a existência de governos de coligação. O que torna isso mais difícil no Portugal dos dias de hoje? Tenho, para mim, que duas coisas essenciais, no fundo reduzidas a uma só: os governos de maioria absoluta de Cavaco Silva. Em primeiro lugar porque se prova, pela primeira vez, que um partido concorrendo sozinho pode alcançar uma maioria absoluta. Em segundo lugar, porque com as grandes obras públicas e os fundos estruturais é nos governos de maioria absoluta (e com maioria absoluta de um só partido) liderados pelo actual Presidente da República que se fortalecem e organizam definitivamente as clientelas partidárias e se sedimenta e cresce a promiscuidade entre partidos e negócios do Estado, passando a competir essas clientelas rivais, distribuídas essencialmente pelos dois maiores partidos, PS e PSD, por um "bolo" que, por definição, é sempre escasso, o que dificulta as possibilidades de entendimento entre esses dois blocos mesmo quando, como agora, essa parece ser uma necessidade quase incontornável.
Existirão, por certo, outras condicionantes, mas não só não me parece questões de personalidade sejam assim tão essenciais, como estas duas razões de fundo me parecem andar bem mais próximas da raiz do problema. Será assim?
Sem comentários:
Enviar um comentário