quinta-feira, janeiro 17, 2008

Da música popular portuguesa - resposta a Pedro Freitas Branco (1)

Pois responde no Ié-Ié o Pedro Freitas Branco (aka "Filhote") a este meu post publicado aqui no dia 25 de Abril de 2007 sobre a música popular portuguesa (MPP). E responde muito bem, claro, que isto de polémicas educadas e fundamentadas é coisa que me está nos genes. Mas vamos lá tentar dar a tréplica, explicando melhor as razões que levaram PFB a replicar.

Pois diz o Pedro que a minha opinião “não escapa a uma certa parcialidade”. Claro que não, nem pretenderia fosse de outro modo: assumo, de modo firme, os valores que moldaram a minha personalidade neste campo e eles são, fundamentalmente, os da revolução musical e social que constituiu o "rockabilly" e o "rock & roll" (e aqui estou também a falar de "blues") e os da radicalidade, se quiser também do elitismo, que parametrizaram o “Em Órbita”. Claro que haverá outras (ninguém escapou ao Brel e à canção de texto francesa, por exemplo), mas estas são as fundamentais, quase as do berço apesar de andar ainda na 1ª classe quando Elvis Presley gravou “That’s All Right”. Having said this, não estranhe portanto o Pedro que eu “afunile” um pouco (ou muito) as minhas preferências no que diz respeito à MPP, e também as radicalize, centrando-as naqueles que, quanto a mim, protagonizaram um corte (uma revolução, se quiser) muito mais do que uma evolução ou, até, um pequeno salto em frente. De igual modo poderá compreender que, também neste campo da música popular, esteja mais próximo de algumas formas musicalmente consideradas mais primitivas, mais simples, do que de outras musicalmente mais elaboradas ou evoluídas, digamos assim, até poeticamente. Haverá excepções, claro está, mas este é o meu território e é melhor marcá-lo desde já.

Não se admire, portanto, o Pedro da minha preferência pelo fado vadio, rasca, dos prostíbulos e das tabernas, do povo e da aristocracia que com ele convivia (e o dominava...). Não se espante, também, pelo tributo que sempre presto àquele que considero o primeiro grande inovador da MPP e, a par com José Afonso, a maior personalidade dessa música popular no Portugal do século XX: Alfredo Rodrigo Duarte (“Marceneiro”). Exagero? Não acho... Por isso, caro Pedro, a minha preferência no fado (e também nos "blues" – ver neste blog a rubrica respectiva) vá mais para os seus cultores do passado, para as suas formas mais simples da primeira metade do século XX, do que para as suas evoluções mais intelectualizadas, não partilhando o seu entusiasmo por Carlos do Carmo, mas sim pela Amália dos anos 50, a do “Café Luso” (o resto é para esquecer e quanto mais depressa melhor), por Maria Teresa de Noronha e por muitos mais que o espólio de Bruce Bastin trouxe agora à luz do dia.

Bom, se teve paciência para ler todo este arrazoado, não vai estranhar que passe um pouco ao lado de alguma evolução que os “Festivais da Canção” do final dos anos sessenta/início dos anos setenta trouxeram á música ligeira portuguesa (aqui, a utilização do termo “música ligeira” e não “música popular” é propositada), principalmente ao nível das “letras” e do tipo de interpretação. Desculpe lá, mas bem dentro dos padrões de actuação do PCP – que aqui era dominante - foi bem mais uma infiltração nas estruturas existentes do regime do que qualquer outra coisa! Mas já ouviu “Sol de Inverno” e “Vocês Sabem Lá” de Nóbrega e Sousa? Não gostávamos (os da minha geração), pois era a música dos nossos pais - com quem estabelecemos um corte geracional - e também porque a identificávamos com o regime, mas também antes do "rock & roll" havia na América alguma boa música ligeira ("melodias bem construídas" - não sei se a frase é sua e peço desculpa por isso) e não havia ditadura. Havia segregação... e depois guerra no Vietnam, e o "rock & roll" teve aí uma intervenção bem preponderante e decisiva.

Sobre José Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Sérgio Godinho, José Mário Branco, Carlos Paredes e, depois, o GAC (mesmo o da “Luta dos Bairros Camarários” e afins, que inova ao integrar o canto e a música naquilo que os grupos M-L designavam na altura como “lutas populares”) não vale a pena acrescentar mais nada: estaremos ambos, e não só, de acordo, acho. Vamos antes ao que nos separa, não sem deixar de focar que o fado ou balada coimbrã, na génese da grande revolução da MPP, não são muito mais do que o fado de Lisboa levado para Coimbra pelos estudantes e adaptado e aberto à sua vivência e iniciativas. Já reparou que os “futricas” estão à margem dele?

(continua)

2 comentários:

filhote disse...

Já li a primeira parte.

Não é assim tanto o que nos separa. Na essência defendemos o mesmo. As minhas paixões primordiais são o "velho" Rock'n'Roll, o Rockabilly, os Blues, o Garage...

Apenas uma coisa nos divide, de facto. Não tenho especial afinidade pelo Fado. Excepção para a Amália do início de carreira e o Marceneiro.

Nem gosto especialmente de Carlos do Carmo. Referi "O Homem e a Cidade" somente por tratar-se de um disco diferente.

"Melodias bem construídas"... duvido que essa frase possa ser minha!!!

JC disse...

Desculpe se a frase não é sua. Sei que li no IÉ-IÉ, num comentário, e vinha a propósito. Quanto ao fado, tb é o que eu gosto, mais coisas do acervo do Bastin. Tudo me separa do fado mais intectualizado, ou do chamado fado-canção. Enfim, continuo amanhã.
Obrigado pela oportunidade e pelos s/ comentários.
JC