quarta-feira, janeiro 16, 2008

Os salários da FP, a inflação e os sindicatos

No jornal “Público” de hoje pode ler-se um trabalho comparando as taxas de inflação e os aumentos salariais da função pública nos últimos dez anos, concluindo, dessa comparação, a perda constante de poder de compra por parte dos trabalhadores nesse período. A conclusão pode até estar certa – não sei - mas os instrumentos de análise que a ela permitem chegar por certo não o estão. Se não, vejamos.

Para se chegar a uma conclusão sobre a evolução do poder de compra dos trabalhadores da função pública – ou de outro qualquer sector de actividade, ou empresa - há que comparar com a taxa de inflação não apenas o seu aumento de salário mas o aumento total da massa salarial, o que inclui as verbas destinadas a promoções, gratificações, subsídios, diuturnidades e outras, principalmente quando sabemos que a evolução das carreiras no Estado é praticamente automática, isto é, que, periodicamente, os trabalhadores recebem não só a verba destinada ao aumento de vencimento da categoria onde estão inseridos mas também o aumento correspondente à promoção obtida. Se quisermos ser mais rigorosos, essa verba (aumento da massa salarial), para efeitos de comparação, deve ser líquida da variação do número de trabalhadores, isto é, para esse cálculo não deve ser contabilizada a parte destinada a pagamentosde salários de novos trabalhadores admitidos ou que tenham abandonado o sector.

Tendo dito isto, por certo concluiríamos que uma comparação efectuada nestes termos, mais rigorosos, por certo permitiria chegar a conclusões um pouco diversas, em favor do poder de compra dos trabalhadores e em desfavor da respectiva perda, embora o congelamento de algumas carreiras, nos últimos anos, por certo tenha atenuado as diferenças entre os valores calculados através do recurso a cada uma das metodologias.

Tudo isto vem a propósito de um subterfúgio a que os governos têm recorrido nos últimos anos para, em virtude do déficit excessivo e na tentativa de o controlar e diminuir, “comprimir” os salários do funcionalismo público estimando sempre “por baixo” as taxas de inflação anuais e não procedendo a acertos posteriores em função das taxas efectivamente verificadas. Digamos que é um mau exemplo, uma pequena desonestidade de onde deveriam vir, isso sim, exemplos de outra índole, mas, se repararmos bem, também os sindicatos têm aceite fazer parte desse jogo sujo e viciado. E porquê? Bom, a diminuição do déficit excessivo implica um controle e diminuição das verbas destinadas ao pagamento dos funcionários públicos – a tal massa salarial -, com peso excessivo nas despesas do Estado (e estas com peso excessivo no PIB), e isso só pode ser feito, no limite, de duas maneiras: ou diminuindo o número de funcionários ou pagando pior aos existentes. Não há volta a dar-lhe! Claro que para os sindicatos, defensores do statu quo, e para os trabalhadores com piores qualificações e resultados o cenário de despedimentos ou afastamentos é seguramente o pior dos cenários, mas, afastando desde já propostas económica e politicamente irrealistas, do tipo ultra-liberal, de despedimento de funcionários em massa, será assim para todos? Penso que não: uma diminuição, se criteriosa, do número de trabalhadores da FP, englobada e tendo por base uma reforma da respectiva administração que valorizasse as avaliações, iria permitir não só um aumento da produtividade como, por via dessa melhoria e da diminuição do pay roll, alguma melhoria progressiva nos salários dos que ficassem e apresentassem resultados. Um cenário que iria retirar poder aos sindicatos e do qual estes fogem como o diabo da cruz ou o Conde Drácula dos alhos, claro.

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