Afirma o “Público” que, segundo um estudo realizado pela GFK, “metade dos portugueses diz que o país está pior do que antes do 25 de Abril”. Algumas notas.
- No texto verificamos logo que não se trata de metade mas sim de 46%, o que é bem menos do que metade. Há que ser rigoroso no modo como se titula.
- Para o estudo ter alguma validade, os interrogados deveriam estar em plena vida activa há 40 anos. Deveriam ter, portanto, mais de 18 anos em 1971, o que significa 58 anos actualmente. Se é esse o universo do estudo - o que seria o correcto - apenas se pode falar em 46% dos portugueses com mais de 58 anos e nunca em 46% dos portugueses. Se não o é, estamos perante um disparate total (acho). Ora, por muito que tenha procurado no texto do "Público", o estudo nada nos esclarece sobre o assunto.
- Quem tem hoje mais de 58 anos seria, como vimos, adolescente ou jovem adulto em 1971. Ora a vida, por muito dura que tivesse sido, é sempre bem mais risonha quando se é jovem e quase todos os sonhos são permitidos. Este é um dado habitual quando se realizam inquéritos sobre o passado longínquo ("a escola era risonha e franca" e o tempo apaga as mágoas deixando apenas as gratas recordações). Quem tiver dúvidas veja o sucesso de "Conta-me Como Foi".
- Quem responde a este tipo de inquéritos tem sempre tendência a “pintar” a actual situação (qualquer que ela seja) com cores mais negras, funcionando a resposta muito como uma queixa “a quem de direito” para tentar a sua vida melhore. Uma maioria dos inquiridos parte sempre do princípio que de nada serve salientar os aspectos positivos, já que nada ganham com isso sendo esses sempre considerados como um direito adquirido. Há que ter isso em conta.
- Por último, um estudo como este não é “neutro”, e quem o encomendou e publica, não sendo muito difícil conhecer ab anteriori, de um modo geral, as suas principais conclusões, pretende com ele atingir um objectivo bem preciso e definido. Longe de mim estar a pretender com esta afirmação exercer qualquer pressão censória. Nada disso: total liberdade à execução e publicação deste tipo de estudos. Mas convém o cidadão que os lê saiba como o fazer, o que os pode influenciar e o que está em causa. Politicamente, claro!
2 comentários:
Estudos, sondagens etc não são inocentes e são sempre feito(a)s por encomenda.
Correctíssima a leitura deste estudo.
Em 1971 estava eu com 17 anos e do que me lembro desses tempos são quase só boas recordações.
Excepção a uma greve que houve na minha região (1966) já eu trabalhava e sem querer passei um mau bocado.
E se nesse tempo uma greve para ir para a frente tinha que ter uma base de razão muito forte, o 25 de Abril troxe-nos um grupo profissional de greves que, baseadas nalguma razão (que a há sempre) são despoletadas quando interessam a grupos políticos.
E se eu defendo o 25 de Abril que vivi com todo o entusiamo durante e nos anos seguintes.
Pena a casta política olhar mais para o seu umbigo e bolsos que para o País e as suas necessidades.
Não é uma questão de serem feitas por encomenda (são-no, efectivamente, mas c/ intenções de rigor e credibilidade dos resultados se efectuados por institutos credíveis, que não se prestam a manipulações): na sua maioria obedecem a critérios rigorosos e nada me faz desconfiar da credibilidade desta (a GFK é uma empresa idónea, acima de qualquer suspeita), com a ressalva, que assinalei, do universo do estudo, mesmo assim por confirmar pois podemos estar perante um mero erro de interpretação do "Público". Quando falo dos resultados não serem neutros, refiro-me, fundamentalmente, às reacções a que podem dar origem ou se prtendem obter. Por exemplo, se as últimas sondagens das presidenciais derem larga vantagem a Cavaco Silva, isso pode dar origem a maior abstenção. Mas, por exemplo, se derem uma pequena diferença entre Cavaco e Alegre as consequências serão diferentes - e por aí fora.
Cumprimentos
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