Henrique Monteiro, que até foi maoísta e, nessa qualidade, integrou a redacção da "Voz do Povo" (UDP), sendo portanto de admitir tenha pelo menos "passado os olhos" pelos clássicos do marxismo, mostra-se muito admirado por apenas 20% dos portugueses alguma vez ter feito greve. Confesso o que me admira é a percentagem ser tão elevada, num país que desde o 25 de Novembro de 1975 tem uma situação democrática estável e normalizada e onde, desde o 25 de Abril, a esmagadora maioria dos cidadãos viu as suas condições de vida muito melhoradas. Esquece Henrique Monteiro que, exceptuando situações de grave ruptura, revolucionárias ou pré-revolucionárias, a greve é sempre uma questão de minorias lutando por objectivos muito concretos e tentando alcançar vantagens negociais e, assim sendo, excepto se o direito à greve for ilegal, haverá sempre grupos sociais ou profissionais que, por serem mais coesos, exercerem a sua actividade em sectores-chave ou qualquer outra razão de teor semelhante, conseguem tirar mais vantagens do recurso à paralização laboral. Como, de igual modo, haverá no lado dos empregadores sectores que, pela sua situação específica, conseguem obter para si próprios mais vantagens na sua relação com o poder. É assim que acontece nas sociedades livres e, já agora, convém também lembrar Henrique Monteiro que mesmo em situações revolucionárias de "tomada do poder", historicamente, a iniciativa e a direcção dos movimentos pertence sempre a uma minoria tida por mais "esclarecida" e "empreendedora", a chamada "vanguarda". Pretender que metade ou mais de metade dos portugueses já tivessem alguma vez participado numa greve é, portanto, uma utopia e não serve para justificar o que quer que seja.
Outra coisa, bem diferente, é debater a actualidade do recurso à greve como forma privilegiada de luta laboral, a sua capacidade para mobilizar sectores para além de algumas classes e grupos profissionais muito específicos, as suas virtualidades como forma de pressão para obter vantagens negociais, o seu papel no sindicalismo reformista e a situação dos sindicatos na actualidade. Essa é a discussão que vale a pena, muito diferente da demagogia populista de Henrique Monteiro que, embora em versão "soft", não deixa de se integrar na actual campanha que por aí vai medrando contra o democrático reconhecimento constitucional do direito à greve.
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