O ministro Miguel Relvas deveria demitir-se ou ser demitido a provarem-se as alegadas pressões sobre um jornalista do "Público" e sobre o próprio jornal? Enfim, que um ministro actue deste modo, com a agravante de se tratar do responsável pelo o sector em causa, constitui facto grave e inaceitável, mas também todos sabemos, desde que o país vive em democracia, que o caso não é virgem e, podendo estar a ser atraiçoado pela memória, não me lembro que qualquer dos casos anteriores tenha tido, infelizmente, quaisquer consequências depois de esgotado o ruído conjuntural. Certo que também não estamos, de um ou outro lado, a falar de virgens vestais, e se existem vários tipos de pressões e até promiscuidades, com respectivas gradações, que eu saiba nunca nenhum jornalista chegou ao ponto, felizmente, de acordar de manhã com uma cabeça de cavalo entre os lençóis. De qualquer modo, parece-me (e acho já o escrevi a propósito de um outro assunto) acto politicamente bem mais gravoso ameaçar jornais e jornalistas do que contar uma anedota de mau gosto sobre alentejanos ou fazer "corninhos" a um deputado eleito, o que me parece até bem dentro da tradição parlamentar oitocentista. Isto, claro está, já não falando de alguns acontecimentos tão ou mais graves acontecidos no parlamento madeirense; mas a quem gosta de assumir o papel de "louco da aldeia" quase todos parecem dar desconto e ficar felizes por isso.
No entanto, existe neste caso Miguel Relvas um facto novo que, a confirmar-se (repito: a confirmar-se), ultrapassa aquela linha, nem sequer assim tão ténue, que separa a civilização da barbárie, a decência da rasquice, um cavalheiro de um burgesso, a liberdade do totalitarismo, o que é do domínio público e o que diz respeito ao privado e que não pode, sob nenhum pretexto, ser ultrapassada, muito menos por um governante: ameaçar um cidadão com a devassa da sua vida privada. Caso se prove Miguel Relvas ultrapassou esse limite, ameaçando relatar factos da vida privada da jornalista Maria José Oliveira, deverá nesse preciso momento abandonar o governo bem como quaisquer outros cargos políticos públicos. Caso contrário, já não é apenas a decência (uma questão moral) governamental que está em causa, mas a natureza democrática de um governo que se permite acolher entre os seus quem tais actos pratica.
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