Ora vamos lá tentar afastar um pouco o ruído que tem envolvido o caso das "secretas", demasiado centrado, nos últimos dias, nas "pressões" de Miguel Relvas (não que não sejam importantes...), e tentar centrar-mo-nos naquilo que é essencial e está a montante, que determinou, portanto, todo este desencadear de factos e emoções. E aí chegados temos de concluir uma coisa bem simples: segundo tudo leva a crer, estamos perante um caso de utilização de meios públicos, pertencentes ao Estado, à comunidade, para fins pessoais e privados, não substancialmente diferente de quando alguém se apropria de dinheiro ou bens do Estado em proveito próprio ou de terceiros. Quanto a mim, que não sou jurista, um caso puro e simples de crime de "peculato". Pior: alguém se apoderou de uma parte do aparelho de Estado (os Serviços de Inteligência) para, além dos utilizar em proveito seu e de privados, violar princípios básicos do Estado de Direito Democrático, como o são o direito à privacidade e intimidade, outro crime de extrema gravidade. E, se quiserem, pior ainda: tendo como circunstância agravante o facto de se tratarem de serviços de natureza muito particular, destinados à defesa e segurança do Estado Democrático (de todos nós, portanto) e onde a confidencialidade e discrição das actuações deve constituir norma intransigente. Se para tal acção criminosa (repito: acção criminosa) os agentes do crime contaram com a cumplicidade de um ou mais membros deste ou de governos anteriores, é caso para se investigar, mas convenhamos que os indícios e as mentiras são, por si só, aterradores.
Quanto ao ministro Relvas, se se vier a provar ameaçou uma jornalista do "Público" com a divulgação de assuntos da sua vida privada, estamos, neste assunto, e ainda assim, perante o menos grave dos crimes, mas ainda assim crime e agravado pelas funções que desempenha. Mas digamos que em função da gravidade das acções acima descritas e perante os fortes indícios que o poderiam envolver em tais actos, não me admira alguém com a experiência política do ministro tenha perdido a cabeça: a provar-se o seu envolvimento, num país civilizado tal corresponderia ao fim da sua carreira política e constituiria forte machadada na credibilidade do governo. Além de tudo o mais, parece que "espiolhar" a vida privada de jornalistas e dirigentes de grupos de comunicação se tinha tornado no "core business" e "way of doing the things" dos serviços portugueses de inteligência. Fraca inteligência, pois claro, que por isso mesmo não merece tanto dinheiro investido.
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