É comum ler e ouvir a analistas e sociólogos que os portugueses, o povo português, toleram bem, e até se gabam da pequena corrupção, a que se passa ao nível do seu bairro ou rua, dos seus “pares” desde que também dela beneficiem, e apenas a grande corrupção (aquela a que não têm acesso, acrescento eu) é por eles penalizada. Não sei se será bem assim, tendo em conta o modo como, sem hesitar, dão o seu voto político a cidadãos com investigações criminais em curso, alguns já com condenações na 1ª instância. Mas como isso se passa fundamentalmente a nível autárquico, quero acreditar que tal corrupção ainda poderá caber na noção de vizinhança ou bairro e, por isso, levar-me a concluir que o que o “povo da SIC” demonstra não é a sua condenação dos corruptos, mas o seu ódio aos que identifica como “ricos e poderosos”, num país ainda com desigualdades demasiado evidentes, com muita gente a viver no limiar da pobreza e, principalmente, com memórias ainda demasiado vivas de uma ruralidade paredes meias com a miséria do “pé descalço”. Também com muita iliteracia e ignorância a fomentar ódios novos ou a ressuscitar facilmente os antigos, num país onde, demasiadas vezes com razão, se identificam os “ricos e poderosos” como grupo resultante de favorecimentos vários e práticas proteccionistas, sem capacidade ou vontade para devolverem à sociedade uma parte, por pequena que fosse, dos que esta lhes generosamente lhes facultou. Talvez porque, também para eles, essas memórias de pobreza sejam ainda demasiado evidentes e dessa imagem se queiram esquecer.
Mas atenção: não se trata, pelo menos nos dias de hoje, de um genuíno “ódio de classe”, à boa maneira bolchevique da “classe contra classe”, “proletariado vs burguesia”. Nada disso e, apetece-me quase dizer, antes assim fosse: basta verificar a perda de influência do PCP nos meios industriais e operários, fruto da terceirização da organização do trabalho e da sociedade, para entendermos que não é isso que está em causa. Do que estamos em presença é, isso sim, de um radicalismo pequeno-burguês de cariz reaccionário, com características que podemos encontrar na génese dos movimentos nazi-fascistas dos anos 20 e 30 do século passado. E, curiosamente, é no PSD, neste PSD m-l de Pacheco Pereira e Ferreira Leite (a ordem dos nomes não é arbitrária), no PSD que já foi o de um “cavaquismo” gerador de uma cultura nova-rica que criou, tantas e tantas vezes, “ricos e poderosos” de última-hora e nas margens da ética, quando não mesmo da lei, que vamos encontrar uma tentativa de representação, a nível partidário, desse radicalismo de projecção totalitária. Arvorando a “verdade” e a “moral” como programa político, fazendo da tentativa de atropelo às mais elementares normas do Estado de Direito regra de actuação, falando no parlamento na “figura jurídica do crime de perigo... e do pré-crime”, é aí que o PSD se está a colocar a nível de representação política; é essa – digo eu – a verdadeira “deriva conservadora” de que fala a sua ex-dirigente Paula Teixeira da Cruz.
Nada de demasiado novo ao cimo da terra, apetece-me dizer. Esta pulsão reaccionária, radical à direita, pequeno-burguesa, tão visível, entre Sá Carneiro e Cavaco Silva, no tradicional culto do chefe providencial e no anseio sebastianista de um novo e regenerador do partido, sempre fez parte integrante do PSD. Talvez seja oportuno também recordar que foi, em parte, devido a esse radicalismo autoritário, no caso protagonizado por Sá Carneiro, que ficámos a “dever” a ascensão de Vasco Gonçalves a primeiro-ministro, quando daquilo que ficou para a História conhecido como “golpe” Palma Carlos – ou da Manutenção Militar. A política “centrista” do PS de José Sócrates, a crise financeira mundial e o subsequente desespero pela perspectiva de anos na oposição nada mais fizeram do que abrir caminho para que essa pulsão se pudesse tornar hegemónica. Curiosamente, agora que, em maioria apenas relativa, tanto PS e governo precisavam de um PSD diferente daquele que, embora indirectamente, “ajudaram” a construir.
Mas atenção: não se trata, pelo menos nos dias de hoje, de um genuíno “ódio de classe”, à boa maneira bolchevique da “classe contra classe”, “proletariado vs burguesia”. Nada disso e, apetece-me quase dizer, antes assim fosse: basta verificar a perda de influência do PCP nos meios industriais e operários, fruto da terceirização da organização do trabalho e da sociedade, para entendermos que não é isso que está em causa. Do que estamos em presença é, isso sim, de um radicalismo pequeno-burguês de cariz reaccionário, com características que podemos encontrar na génese dos movimentos nazi-fascistas dos anos 20 e 30 do século passado. E, curiosamente, é no PSD, neste PSD m-l de Pacheco Pereira e Ferreira Leite (a ordem dos nomes não é arbitrária), no PSD que já foi o de um “cavaquismo” gerador de uma cultura nova-rica que criou, tantas e tantas vezes, “ricos e poderosos” de última-hora e nas margens da ética, quando não mesmo da lei, que vamos encontrar uma tentativa de representação, a nível partidário, desse radicalismo de projecção totalitária. Arvorando a “verdade” e a “moral” como programa político, fazendo da tentativa de atropelo às mais elementares normas do Estado de Direito regra de actuação, falando no parlamento na “figura jurídica do crime de perigo... e do pré-crime”, é aí que o PSD se está a colocar a nível de representação política; é essa – digo eu – a verdadeira “deriva conservadora” de que fala a sua ex-dirigente Paula Teixeira da Cruz.
Nada de demasiado novo ao cimo da terra, apetece-me dizer. Esta pulsão reaccionária, radical à direita, pequeno-burguesa, tão visível, entre Sá Carneiro e Cavaco Silva, no tradicional culto do chefe providencial e no anseio sebastianista de um novo e regenerador do partido, sempre fez parte integrante do PSD. Talvez seja oportuno também recordar que foi, em parte, devido a esse radicalismo autoritário, no caso protagonizado por Sá Carneiro, que ficámos a “dever” a ascensão de Vasco Gonçalves a primeiro-ministro, quando daquilo que ficou para a História conhecido como “golpe” Palma Carlos – ou da Manutenção Militar. A política “centrista” do PS de José Sócrates, a crise financeira mundial e o subsequente desespero pela perspectiva de anos na oposição nada mais fizeram do que abrir caminho para que essa pulsão se pudesse tornar hegemónica. Curiosamente, agora que, em maioria apenas relativa, tanto PS e governo precisavam de um PSD diferente daquele que, embora indirectamente, “ajudaram” a construir.
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