sábado, março 15, 2008

Ainda a avaliação dos professores

Contrariamente ao que Helena Matos afirmava no “Público” da passada 3ª feira, 11 de Março,

"(Falo da única forma que conheço de avaliação dum serviço: termos a liberdade de o trocar por outro. O critério da escolha das famílias – instituindo o cheque ensino e dando liberdade às escolas públicas para se organizarem consoante as necessidades daqueles que as procuram – é a única forma de se poder avaliar o trabalho duma escola e dos seus professores. Os professores serão avaliados no dia em que numa qualquer escola pública, em Portugal, um encarregado de educação possa dizer que quer transferir o seu filho para a escola Y seja ela pública ou privada, simplesmente porque ela é melhor e que, na sequência dessa transferência, os cinco mil euros que o estado português gasta anualmente com a educação do seu filho passarão a ser entregues na escola Y e não naquela que frequentou até então.

As fichas que tanta indignação têm suscitado não pretendem avaliar professores. São simplesmente um mecanismo de controlo por parte do ministério para com os seus funcionários. Mecanismo autoritário e legitimador de subjectividades várias como sempre aconteceu na relação entre o ministério e os professores. Mas aos pais e aos alunos essas fichas interessam tanto quanto o livro de ponto que os professores têm de preencher.)"

o mercado, mesmo que funcionando de forma perfeita o que só acontecerá na cabeça de Helena Matos ou nos “modelos” económicos que se utilizam como simplificações da realidade (haverá sempre constrangimentos sociais, geográficos, etc e, mesmo que os não houvesse, o resultado final seria sempre “os melhores alunos para as melhores escolas” com toda a discriminação daí resultante que é contrária à inclusão que o ensino público deve promover), apenas poderia avaliar escolas e nunca os respectivos professores, do mesmo modo que esse mesmo mercado pode avaliar empresas, premiando com o sucesso as mais competitivas, mas não cada funcionário e colaborador dentro de cada uma delas, algo que estas não se dispensam de fazer sem que alguém se lembre, talvez com a natural excepção da CGTP, de acusar as respectivas administrações de estarem a recorrer a um “mecanismo autoritário ou de controlo”.

Por muito que Helena Matos não queira ou que os bons samaritanos de momento se esforcem por fazer crer, só existe uma maneira de, em cada escola, avaliar os respectivos professores: através da respectiva hierarquia e por meio de modelos de avaliação pré definidos utilizando critérios vários, subjectivos uns e objectivos outros, pré determinados e cada um deles com a sua valência específica. Tudo o resto, em maior ou menor grau, nada mais é que uma fraude. A hierarquia, os “avaliadores” foram seleccionados por critérios contestáveis? Certamente menos contestáveis do que aqueles que permitem a actual situação de não diferenciação, nunca posta em causa por sindicatos e professores que agora provam do seu próprio veneno.

Claro que os modelos utilizados devem ser suficientemente perfeitos para evitar a aleatoriedade ou o demasiado peso específico atribuído a critérios puramente subjectivos; claro que seria ideal que o modelo fosse suficientemente flexível e as escolas tivessem autonomia suficiente para que a valência de cada critério, o seu peso no total, variasse em função dos objectivos de cada uma, o que não sei se acontece; claro que uma avaliação deste tipo é tanto mais complexa quanto maior for a sua preocupação com o rigor e justiça dos resultados, o significa trabalho acrescido e explica a aparente dificuldade de entendimento do modelo proposto; mas não me parece possa existir qualquer outro sistema credível que se afastasse decisivamente do que aqui descrevo e que é, com variações, o universalmente utilizado nas organizações.

Significa isto que os professores não têm razão na sua contestação? A resposta é sim: de um modo geral, não têm. Significa isto que todos, ou a maioria, estarão mal intencionados na sua contestação? Sou levado a pensar que não, não estarão. O que se passa é que viciados num modelo de funcionamento promovido durante anos pelo ministério que lhes criou uma mentalidade e um way of doing the things muito particular, encapsulando-os e, assim, os protegendo da realidade do mundo e da vida, os professores são agora, de chofre, confrontados com um mundo que não compreendem e para o qual não foram preparados. E, claro está, isso magoa e afastará muitos deles: os menos preparados.

6 comentários:

psergio57 disse...

Bullshit! Ponha-se à frente de uma turma das adoráveis crianças que hoje são despejadas nas escolas durante um só dia que seja e depois venham as 'post'as de pescada...

Stran disse...

"A hierarquia, os “avaliadores” foram seleccionados por critérios contestáveis? Certamente menos contestáveis do que aqueles que permitem a actual situação de não diferenciação, nunca posta em causa por sindicatos e professores que agora provam do seu próprio veneno."

Esta frase mostra a forma preconceituosa com que abordas este tema. Sabes quais foram os critérios? Consegues me responder em que medida é que são menos contestáveis?

Concordo no entanto com a analise que fazes da bondade do modelo proposto por Helena.

JC disse...

Meu caro psergio57: Acha que apenas um realizador de cinema pode ser crítico? Ou que apenas um treinador de futebol possa analisar o trabalho de uma equipa? Ou que apenas um ex-primeiro ministro possa criticar a condução de um governo? Ou tudo isto é bullshit?

JC disse...

Com certeza que haverá injustiças nos critérios; há sempre, principalmente quando se parte de uma situação em que todos, os bons e os maus, eram iguais e, portanto, não existiam quaisquer critérios. Mas isso não pode ser motivo para que nada se faça e se mantenha o statu quo. Uma geração de professores vai ser vítima de injustiças? Provavelmente. Mas injustiça maior do que algumas gerações que nunca foram avaliadas? Certamente menor e, principalmente, paving the way para que as gerações futuras sejam tratadas de forma bem mais justa.

Rui Diniz Monteiro disse...

Venho um pouco atrasado, mas ainda aqui lhe venho lembrar duas coisas:

1º, o que nasce torto (esta avaliação), tarde ou nunca endireita;

2º, a experiência dos antigos "países do leste" mostra que é nos sistemas mais controlados e pesados que campeia a incompetência, a patifaria e a burocracia.

Desculpe: eu acho que os professores têm toda a razão, embora talvez não todas as razões, do seu lado.

JC disse...

Caro Rui:
1. Para além de ser uma afirmação derrotista, na opinião dos sindicatos e dos professores quais as reformas que não nasceram tortas?
2. Quer um sistema de gestão do ensino secundário mais semelhante ao dos antigos países de leste do que o existente nos últimos anos? Basta ver quem o tem apoiado...
Cumprimentos
JC