Não sei se Nuno Santos é ou não responsável por ter autorizado o visionamento e/ou cedência de imagens não editadas da manifestação junto da Assembleia da República, e duvido alguém, para lá dos intervenientes directos neste imbróglio, o saiba. Se o fez, incorreu num crime, já que apenas o poderia ter feito em cumprimento de mandado judicial. Se o não fez e foi afastado por motivos políticos, é grave, embora tal não seja caso virgem nem tipo de comportamento ao qual não estejamos, infelizmente, demasiado habituados.
Mas mesmo assumindo que terá sido vitima de uma cilada, o que torna o seu afastamento ainda mais grave, estamos perante um problema conjuntural, isto é, nada que não possa vir a ser corrigido facilmente num futuro mais ou menos próximo por este ou qualquer outro governo. Já a eventualidade do Estado ceder uma parte significativa do capital da RTP a uma entidade privada, coisa que, teoricamente ou em termos puramente abstractos, não me chocaria demasiado, é uma modificação de natureza estrutural, querendo isto significar que modifica a estrutura accionista da empresa, o seu modelo de gestão, a sua relação com os "stakeholders" e pode mesmo ter implicações decisivas na democracia e na presente e futura liberdade de informar, devendo por esse motivo ser objecto de escrutínio rigoroso pela Assembleia da República e por todos os cidadãos. Se essa cedência tiver como destinatário um grupo económico onde o poder é partilhado pela Cofina, detentora do Correio da Manhã com a sua filosofia jornalística(?) e o seu triste registo de conteúdos, aliado a capital de um país onde não existe liberdade de expressão, de informar ou sequer liberdade empresarial, e no qual nada se faz sem ou muito menos contra a elite corrupta no poder, o assunto excede em muito, na sua gravidade, o caso Nuno Santos ou, não querendo com isto aligeirar a sua gravidade (longe disso), quaisquer outros casos conjunturais do mesmo teor. É por isso que, embora se conheça demasiado bem a estratégia do governo em "atirar o barro à parede a ver se pega" e o sem número de opções que já anunciou para o grupo RTP, vejo com alguma estranheza um assunto que é estrutural ser claramente preterido, no seu tratamento político e mediático, em favor de uma questão que pode ser grave, sem dúvida, mas de natureza meramente conjuntural, vendo a árvore mas ignorando ostensivamente a floresta. "Business as usual", compete perguntar?
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