domingo, janeiro 14, 2007

Os erros de José Mourinho

Sou um admirador confesso de José Mourinho. Mais, acho que a sua importância e a da sua personalidade transcendem em muito o campo limitado do futebol, enquanto actividade profissional e mediática, e são mesmo um excelente exemplo extrapolável para outras actividades e base sólida para análises mais alargados do comportamento geral dos portugueses. Mourinho é a antítese do português médio: é rigoroso e persistente; acredita no trabalho organizado e metódico; é estudioso e perfeccionista; faz prevalecer a estratégia sobre a táctica; acredita no grupo enquanto estrutura, com um "leader" e e sub-leaders, com uma hierarquia. Cultiva a imagem e tem a arrogância de quem se reconhece com valor, face à “humildade” (muitas vezes falsa) que o português típico gosta a apregoar como sua qualidade. Tem convicções de que dificilmente abdica. Por último, alicerça o seu “carisma” na base sólida que todas estas características configuram.

Dito isto, lembro-me de dizer, no círculo restrito dos meus amigos mais ligados a estas coisas da “bola” e quando os jornais discutiam as suas possíveis opções “Chelsea” ou “Liverpool”, que Mourinho tinha feito uma má escolha. Primeiro, porque o Chelsea é um clube sem “heritage”, sem a tradição e “cultura” de um Manchester United, Arsenal, Liverpool ou até mesmo de um Newcastle United, sem querer estar a ser exaustivo. Mesmo restringindo-me a Londres, o Chelsea será quando muito o terceiro clube, depois do Arsenal e Tottenham, ou talvez o quarto, se incluirmos o West Ham que eu conheço pior pois as minhas andanças londrinas nunca me levaram muito para os lados, demasiado excêntricos, de Upton Park. Ao escolher o Chelsea de Abrahamovich, Mourinho arriscaria a entrar numa “bolha” que poderia vir a rebentar cedo, por inchar demasiado. Por outro lado, devo dizer que desconfio do “dinheiro novo”, mais a mais - no caso - de origens mais do que duvidosas, normalmente ligado a modelos de gestão (não sei se posso chamá-los assim) demasiado pessoalizados e caprichosos, volúveis e erráticos, centralizados e dependentes de uma vontade mais do que de uma qualquer lógica. Tudo isto já se voltou contra Mourinho na “Champions League”, com algumas arbitragens um pouco duvidosas. Não pelo “efeito” José Mourinho, como a maioria dos jornais portugueses quiseram fazer crer com a sua proverbial magalomania de achar que Portugal é importante e quase o centro do mundo, mas pelo facto de ser o Chelsea de um tal Roman Abrahamovich. E este Abrahamovich será, com certeza, uma personalidade forte e dominante. Demasiado presente. Quanto tempo demorará até ela se chocar com a de José Mourinho?

Passando aos factos mais recentes, para agravar a situação parece que Mourinho decidiu abandonar aquele que era um dos princípios basilares do seu modelo de gestão, mantido, com as devidas distâncias orçamentais, no FCP e no Chelsea: contratar bons jogadores, para um determinado modelo de jogo, mas não as chamadas grandes estrelas. Depois, maximizar a sua performance, inculcando-lhe os seus princípios de jogo, à partida muito bem definidos. Se Ricardo Carvalho, Arjen Robben ou Didier Drogba, por exemplo, já eram jogadores reconhecidos internacionalmente, não eram estrelas de primeira grandeza do futebol mundial. O mesmo em relação a jogadores como John Terry e Frank Lampard. Com a contratação, forçada ou não, de Michael Ballack e Adreji Shevchenko, Mourinho transmite a ideia de ter abdicado desses princípios. Pela mesma razão, parece também ter posto de parte o seu conceito de grupo enquanto entidade orgânica, dotada de uma estrutura e com uma hierarquia de valores. Neste caso, é John Terry que a vem tentar repor, fora de campo, e de quem José Mourinho publicamente afirma espera também a tente repor dentro de campo. Todos estes factos enfraquecem a sua posição. O querer forçosamente ir ao mercado e mostrar-se publicamente agastado por não o poder fazer é sinal de desnorte. Back to the basics, seria um bom conselho.

3 comentários:

Capitão-Mor disse...

Excelente texto e excelente bloge meu caro gato maltês.
Tenciono visitá-lo mais assíduamente...

Anónimo disse...

Caro capitão-mor:
Muito obrigado.

JC

Anónimo disse...

É raro, mas desta vez vejo-me forçado a concordar com a totalidade das ideias no artigo. Queria só acrescentar um comentário:
Parece-me que em certa medida esta "crise" do Chelsea deve-se um pouco ao descontrolo do Mourinho. Criticar os seus actuais jogadores e queixar-se de não lhe darem os jogadores que pediu agora no mercado de Inverno é um bocado demais para quem gastou rios de dinheiro na pré-epoca. Um pouco de contenção (financeira e já agora verbal) poderiam ser positivos para o grupo e para a sua própria imagem.