Se o discurso de um dos vencedores da noite (Rui Moreira) foi politicamente vazio e apelou a um certo bairrismo populista, deixando no ar suspeitas de que poderemos estar perante um mero fenómeno passageiro, uma espécie de fogo-fátuo, o de um dos perdedores da noite (João Semedo) foi pouco menos do que patético. Ao optarem por pôr o assento tónico na derrota dos "partidos do governo", para a qual pouco ou quase nada ontem contribuíram, tentando daí colher louros indevidos, Semedo e o BE esqueceram-se, de repente, das sérias responsabilidades que tiveram na queda do segundo governo de José Sócrates, desse modo acabando por ajudar os agora por si tão atacados PSD e CDS a chegarem ao poder. Aliás, face à acentuada decadência do Bloco de Esquerda, e para não ficarmos apenas pelo campo do "achismo" mais ou menos fundamentado, seria interessante indagar junto dos seus eleitores dos últimos dez anos, principalmente entre os que deixaram de lhe entregar o seu voto, o que esperavam do partido e quais as razões da sua decepção e mudança de sentido desse mesmo voto. Na ausência, infelizmente, desse estudo e dessa evidência, permito-me especular (e agora desculpem o "achismo") que esses mesmos simpatizantes e eleitores esperariam fosse o BE um género de "grilo do Pinóquio" do Partido Socialista, uma espécie de consciência crítica que evitasse uma maior "centralização" do PS e fosse capaz de pressionar e negociar com este partido para acordos onde as ideias de esquerda pudessem fazer o seu caminho. Digamos que assumisse a nível nacional, e no campo político estrito, papel semelhante ao que a comissão de trabalhadores da AutoEuropa assume no campo das relações laborais, privilegiando o diálogo, a negociação e, sempre que nisso existam vantagens claras (e isto é indispensável), um acordo que considere vantajoso.
Voltando ao campo da política "pura e dura", enquanto tudo se passou no campo da matéria de costumes (IVG, casamento "gay", etc), o BE lá foi conseguindo exercer o seu papel com alguma eficácia e sucesso; uma vez resolvidas - e bem - estas questões, cada vez mais o BE, por manifesta incapacidade de resolver as suas contradições internas e renegar as origens dos partidos que o compõem (pode alguém ser quem não é?), se remeteu a um papel que fez dele uma espécie de "PCP dois", talvez com uma imagem um pouco mais jovem, urbana e "pós-moderna", mas sem a História, a coerência, a solidez ideológica e cultural e a implantação no terreno do verdadeiro PCP. Digamos que perdeu o seu "posicionamento" enquanto marca, a sua razão de existência. No meio de tudo isto, Louçã afastou-se (talvez prevendo a débâcle), Catarina Martins é uma irrelevância política sem o sex-appeal de Joana Amaral Dias ou o "je ne sais quoi" e a experiência de Ana Drago e a solidez de João Semedo esbarra na sua falta de carisma. Prevejo venha a ser bem difícil para o BE sair do poço onde se deixou cair.
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