terça-feira, setembro 17, 2013

Autárquicas e degradação da política

Um dos elementos que melhor permitem identificar o estado de degradação a que chegaram debate e propostas políticas é a comparação entre os cartazes e "slogans" destas autárquicas e aqueles que eram comuns nos anos seguintes ao 25 de Abril. Sim, eu sei que estamos em período de eleições autárquicas, onde o factor emocional e a identificação e personalidade dos candidatos contam bastante mais do que em outro tipo de eleições, mas também não sei se esta não constitui habitual desculpa esfarrapada, repetida ad nauseam, para desculpar o actual "estado da arte" Também sei que no período que se seguiu ao 25 de Abril estava em jogo o "modelo de sociedade", a escolha de um projecto para o país entre propostas muitas vezes extremadas. Mas esses cartazes e "slogans", bem como a respectiva "assinatura", possuíam alguma "uniqueness" e permitiam, de imediato, identificar um partido e todo o programa político que propunham. Estávamos no tempo do "Socialismo em Liberdade" do PS, do "Rigorosamente ao Centro" que era suposto permitir posicionar o CDS no espectro partidário, do "Poder Popular" do MES e de alguma outra esquerda radical cujo modelo de sociedade se opunha à "democracia burguesa", da "Aliança Povo-MFA" do PCP propondo uma estratégia que pretendia lançar as bases da organização política de um futuro Estado onde o partido fosse dominante, do grafismo do MRPP que, mesmo que sem qualquer "slogan", remetia para a China de Mao, etc, etc. Curiosamente - e isto é um aparte que diz muito sobre o futuro do partido - seria no material do então PPD que teríamos mais dificuldade em interpretar uma ideologia e propostas políticas claras e programáticas. Mas adiante...

E que temos hoje, já sem falar na naïveté e o kitsch dos tais "Tesourinhos das Autárquicas", sobre os quais já me debrucei e mais não são que um fait-divers que nos faz esboçar um sorriso de complacência? Bom, temos cartazes em que os candidatos são o foco e ocupam o centro da imagem, falam das qualidades morais e da personalidade de cada um, de como desejam "o melhor" para a sua terra (alguém pode dizer que não deseja?), mostram a "obra feita" e - e isto já com alguma sorte - de como se propõem construir um jardim público, um "centro de dia" ou um novo "multiusos", mesmo que tal seja manifestamente inviável. Para tornar tudo ainda mais "pastoso", o grafismo e "slogans (ou "assinaturas"), são de tal modo generalistas que qualquer candidatura deles se poderá reclamar. E não se pense que estamos apenas no campo das candidaturas em zonas rurais, fora dos grandes centros urbanos onde habita a grande maioria da população com níveis mais altos de escolaridade e politicamente mais exigente. Basta andar por Lisboa e ver os cartazes das duas principais candidaturas para comprovar o que digo. Uma lástima.

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