segunda-feira, julho 15, 2013

Do "interesse nacional"

Ora vamos lá ver se nos entendemos, "clarinho, clarinho para militar perceber". Numa sociedade aberta, plural e democrática, os partidos políticos representam interesses e ideologias, diferentes entre si, e tal é da essência da democracia, não existindo qualquer problema em que tal aconteça. Por vezes, esses interesses e ideologias são de tal modo contraditórios e irreconciliáveis, conjuntural ou estruturalmente, que não existe qualquer hipótese de compromisso entre eles; outras vezes, tal é possível e surgem pactos, sejam eles explícitos ou tácitos, acordos, governos de coligação, etc, etc. Por exemplo, na sociedade portuguesa tem existido um compromisso tácito entre PS, PSD e CDS em torno da democracia liberal e da integração na UE e na moeda única,  tidos como de "interesse nacional", sendo que tal é contraditório com aquilo que o PCP e em certa medida o BE defendem para o país. Outro exemplo: existem contradições claras entre o PS e o actual PSD no que refere a importância  e a natureza do "estado social" e o papel que este deve assumir na estruturação da sociedade portuguesa, ou sobre o grau de "austeridade" compatível com o que cada um dos partidos define como sendo o "interesse nacional". Tudo isto, como disse, faz parte da essência da democracia e é tão positivo e digno de louvor existirem acordos conjunturais sobre certas matérias como tal não acontecer. Melhor: a existência de um certo grau de contradição e conflitualidade é mesmo essencial para que uma sociedade "respire" e progrida, devendo esses conflitos ser expressos e dirimidos através dos mecanismos do Estado de Direito Democráticos: voto, liberdade de expressão, associação e manifestação, liberdade sindical, livre iniciativa, independência judicial, etc, etc. Mas o que não existe, de modo algum, é um qualquer "interesse nacional" definido sabe-se lá por quem e acima da pluralidade social e dos interesses contraditórios de cada grupo, classe ou conjunto de classes sociais. Quando alguém, eleito ou não, que se assume como colocado acima desses interesses, define, de modo arbitrário, o que é o interesse nacional e de que modo ele é representado, estamos a deixar o campo da democracia e a resvalar, mais ou menos rapidamente, de modo explícito ou implícito, para uma qualquer ditadura ou totalitarismo. Que não se esqueça.

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