quinta-feira, fevereiro 07, 2008

Aqui se explica a JPP porque para o "bom povo" (e não só) a licenciatura do 1º ministro e as suas casas tipo "maison" não são bem a mesma coisa

Ontem, na “Quadratura do Círculo”, Pacheco Pereira interrogava-se com estranheza sobre as razões pelas quais uma investigação bem fundamentada, publicada pelo jornal “Público”, sobre os projectos assinados por José Sócrates para a Câmara da Guarda teria obtido uma repercussão bem menor do que se esperaria, bem longe da conseguida com o caso da sua licenciatura. As razões são muito simples; tão simples que custa a crer Pacheco Pereira, ao interrogar-se, não tenha alcançado rapidamente as conclusões.

Em primeiro lugar, para o “povo” uma licenciatura “comprada” ou “de favor” - licenciatura para muitos inatingível e que corresponde ao passaporte para uma vida mais desafogada e para a ascensão social - é algo só ao alcance dos ricos e poderosos, daqueles a quem o dinheiro ou o relacionamento social, cuja obtenção é muitas vezes vista como ferida de ilicitude, concederam esse privilégio. Mais ainda, é olhada como uma concorrência desleal por quem, por ausência de meios ou de capacidade, não tem possibilidades de a obter, ou tendo-as, constata uma dualidade entre os sacrifícios por si feitos, em seu favor ou dos filhos, e as facilidades concedidas a outrém. Portanto, o “esquema” que parece transpirar do processo de licenciatura do primeiro-ministro é algo que os fere no mais íntimo do seu ser, perante o qual sentem uma mal contida repulsa epidérmica.

Já na questão dos “projectos” a realidade é bem diferente: trata-se de um pequeno estratagema, como tantos outros, algo nas margens da legalidade mas a quem todos já recorreram ou sabem um dia poder vir a ter de recorrer para lhes resolver um qualquer problema na Câmara, na “Junta”, na “regedoria” se ainda a houvesse. É algo do dia-a-dia, com quem têm uma relação de proximidade e sabem é comum e tacitamente aceite. Que faz parte da sua vida, que também lhes pertence. Aliás, basta olhar para as fotografias das casas para perceber isto mesmo, como isto faz parte do seu pequeno mundo, tal como também o faz a pequena corrupção local, nas Câmaras e nas “Juntas”, mas de que são também elemento essencial e tantas vezes beneficiários para “ultrapassar a burocracia desses gajos lá de Lisboa que nunca aqui vieram e não conhecem a realidade do país”.

É claro que a um outro nível, o das elites urbanas e educadas, o facto de o jornal ser propriedade de quem é e isso, verdade ou mentira, poder pressupor pressões e desígnios “insondáveis” (mesmo que se esteja a ser injusto no julgamento) também em nada ajuda á valorização da notícia, como não ajuda o facto de ser a segunda investigação ao passado do primeiro-ministro com idêntica origem, mesmo que ambas sejam, como de facto o são, peças jornalísticas de qualidade e bem fundamentadas que em nada se confundem com o sensacionalismo tablóide.

É esta a realidade, mais do que qualquer tentativa governamental de desvalorizar e calar o assunto - que, claro, tudo leva a crer também exista. Uma injustiça, talvez, mas como seria o mundo sem elas? Provavelmente, sem qualquer tipo de “charme”.

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