segunda-feira, junho 18, 2007

A OPA sobre o "meu" Benfica (2)

Jaime Antunes tem razão ao afirmar que a OPA sobre uma parte do capital da SAD do Sport Lisboa e Benfica é “um atestado de desconfiança na actual equipa de gestão que não tem sabido criar valor para os activos de que dispõe”. De facto, só se compreende que um clube com o potencial do Benfica, em termos de número de associados e adeptos, notoriedade mundial e heritage, veja a cotação das acções da sua SAD situar-se ao nível dos seus concorrentes directos (FCP e Sporting), de potencial claramente inferior, em função de resultados desportivos por si obtidos nos últimos anos, bem abaixo desse valor potencial e dos conseguidos por estes dois clubes rivais. Mais ainda, e como agravante, num contexto claramente favorável em que o norte e o Porto-cidade perdem importância política e económica e o FCP e o seu presidente se embrenham em problemas com a justiça. É, pois, a gestão que está em causa, apesar de alguns sucessos limitados conseguidos em áreas que não as dos resultados desportivos, e Joe Berardo terá percebido isso mesmo, já que não será difícil, com uma gestão mais profissional que a posse de 30 ou 35% do capital tornará possível dada a dispersão existente, valorizar os activos do clube de modo a permitir chegar a um valor por acção superior aos 3.50 € oferecidos. Se este valor será suficiente e permitirá o sucesso da OPA, dada a especificidade de uma SAD em que a grande maioria dos accionistas o é por “amor ao Clube” e não espera obter daí quaisquer proventos, é um tema a que o futuro se encarregará de responder. Por aqui, nada de futurologia, muito menos numa actividade como o futebol tão dada a interferências de forças "estranhas"...

E como pode o Sport Lisboa e Benfica valorizar esses seus activos? Bom, dadas as limitações do mercado interno e a impossibilidade legal de os “três grandes” jogarem o campeonato de Espanha (assim tornado mercado interno e que é a solução que preferencialmente defenderia), o que lhes permitiria, num prazo relativamente curto, ascenderem ao nível de Barcelona ou Real Madrid, isso só será possível através de uma política coerente e sustentada de internacionalização, quer através do aumento das suas receitas extraordinárias via valorização e venda dos seus recursos humanos, quer através do aumento das suas receitas ordinárias pela participação regular na Champions League até fases avançadas da competição. Nada de diferente, portanto, dos modelos seguidos por FCP e Sporting, este investindo estrategicamente na formação (a venda de Nani, Quaresma, Cristiano Ronaldo e Simão terá gerado mais de 50 milhões de euros de mais valias para o clube) e aquele, de modo mais casuístico, por via do sucesso internacional da era Mourinho, gerando receitas acrescidas por via do desses êxitos internacionais e assim também valorizando e alienando posteriormente os seus recursos humanos. Nada disto o Benfica conseguiu fazer, apesar do seu potencial e a conjuntura favorável serem de molde, digamos, a lhe possibilitarem ser campeão pelo menos cinco ou seis vezes por década, conseguir a qualificação directa para a "Champions League" em quatro de cada cinco campeonatos e a presença nos oitavos de final da competição em 100% das participações.

Bom, e porque não conseguiu a SAD valorizar devidamente os seus activos? Fundamentalmente devido a uma política de recursos humanos desastrosa, quer na formação (o que dói ver o filho de um dos capitães mais emblemáticos do clube, nos últimos anos, e um jogador de futuro larguíssimo, jogar pelo rival!), quer no recrutamento. O Benfica não só foi o último dos três grandes a construir um centro de estágio como mesmo os poucos valores gerados na formação (Miguel e Manuel Fernandes, que são médios valores) foram geridos de forma a não possibilitar a maximização das mais valias a obter quando das vendas dos respectivos passes. Quanto á política de contratações, não valerá a pena alongar-me muito, já que é aquela que mais está sujeita a um maior escrutínio público. Apenas gostaria de acrescentar que o seu fracasso, para além de limitar os resultados desportivos, tem também impedido que o clube possa prescindir, sem uma enorme perda da eficácia da sua prestação desportiva enquanto colectivo, de jogadores como Simão, dos poucos activos valorizados e susceptíveis de possibilitarem um encaixe financeiro significativo. O que tem sido apresentado como algo de positivo, portanto, é, isso sim, muito mais prova de um fracasso, embora “envolvido” no papel de seda de uma estratégia de comunicação populista.

É aqui, portanto - na sua política de recursos humanos - que o Benfica terá claramente de mudar se quiser valorizar os seus activos. É aqui, portanto, que um futuro investidor do clube, Berardo ou outro qualquer, terá que fazer incidir a sua atenção, já que não me parece, em face dos interesses que se jogam nesta área e do perfil das pessoas envolvidas, que a actual gestão da SAD possa, neste campo, mudar significativamente de rumo. Daí que, pese embora todas as dúvidas que alguém como Berardo possa suscitar – e suscita – a OPA, ou melhor, uma mudança significativa na estrutura accionista da SAD, seja bem vinda. Aguardemos...

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