Considero José Afonso e Alfredo Marceneiro as duas personalidades mais importantes da música popular portuguesa do século XX, só aparentemente tão afastadas como o possa parecer à primeira vista. Ambos nascem no fado: o primeiro no fado/balada de Coimbra, evolução e adaptação do fado de Lisboa levado para o Mondego pelos estudantes, e cuja influência é quase sempre bem visível na sua obra; o segundo no fado de Lisboa, que cultivou durante toda a sua longa vida. Ambos, cada um no género musical que foi o seu, foram inovadores. Ambos cultivaram uma certa “marginalidade e boémia, no caso de Marceneiro a de Lisboa dos fadistas, dos bairros populares, no caso de José Afonso a boémia coimbrã das repúblicas e das serenatas. Ambos foram ferozmente individualistas nas suas opções, embora os puristas de José Afonso possam achar esta afirmação sacrílega face às suas opção políticas. Ambos assumiam tiques de “prima dona”, numa arrogância mascarada de humildade e anarquia. Ambos foram geniais.
Depois e antes deles, quem? Amália foi uma intérprete extraordinária, demasiado breve nas suas opções fadistas, cedo trocadas pela “música de variedades”; pelo “Diga lá Oh Senhor Vinho” com palmas do público a compasso, o que lhe terá rendido a fama, o dinheiro, mas afastado os que põem a música em primeiro lugar. Comparo-a a Elvis Presley, também com uma carreira musical longa, mas demasiado curta enquanto originalidade autêntica: basicamente entre 1954 e 1958, nas suas gravações para a “Sun” e primeiras para a “RCA”. Oiça-se, pois, o extraordinário “Amália no Café Luso” e guarde-se essa memória. Variações foi demasiado breve, na sua genialidade, mas também ficará para sempre. Paredes? Claro, Carlos Paredes talvez seja o que mais perto fique dos dois primeiros, faltando-lhe talvez vida para além da música, que é genial.
Pois, “que vivam mil anos”!... Todos eles.
Eu sou o Gato Maltês, um toque de Espanha e algo de francês. Nascido em Portugal e adoptado inglês.
sexta-feira, fevereiro 23, 2007
A propósito de José Afonso
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2 comentários:
Detesto Marceneiro, precisamente pelos tiques de prima-dona!... ;)
Não valoriza Adriano Correia de Oliveira? Eu acho que há nele algo de um ideal ferido que atravessa a voz de um modo poderoso e único. Claro que, enquanto compositor, fica muito atrás do Zeca.
Quanto a Paredes e a Variações, penso que tem razão nos dois casos... :)
Cara Cinderela:
Há um preconceito de mtª gente em relação ao Marceneiro... Mas é genial. Gosto mtº do Adriano, mas não é tão inovador nem abrangente.. É, para mim, o melhor intérprete de fado de Coimbra.
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