Aproveitando o jogo de futebol FCP–Chelsea, o novo Rádio Clube Português emitiu hoje o seu programa matutino do Porto-cidade, do estádio dito do “dragão”, elegendo como tema do dia a alegada discriminação no investimento público de que o norte se diz vítima. E lá tivemos que ouvir um ror das queixas do costume, choradinhos “caliméricos” das forças vivas do norte (leia-se Porto e arrabaldes), incarnadas em personagens tão habituais como a antiga governante Elisa Ferreira e o comentador do “Trio de Ataque” Rui Moreira (os outros, se os houve, não me lembro). Só faltou Manuel Serrão, para ser um ramalhete de respeito! A “história”, mais coisa menos coisa, resume-se em duas palavras: o investimento público (claro!) deveria compensar a quebra do investimento privado na região e, assim, fomentar o crescimento do PIB regional. “Porque o novo aeroporto vai ser na OTA (ficamos a saber que o problema não é o novo aeroporto mas sim o facto de ser mais ou menos em Lisboa), o TGV vai para Madrid (calculo que se fosse do Porto para Vigo, com paragem em Custóias, Mafamude e apeadeiro na Cedofeita, o caso mudaria de figura) e o metro do Porto é descriminado". Enfim... o costume: que dê um passo em frente o candidato a Alberto João lá do sítio.
Ora vamos lá ver:
O declínio da região norte (e estou a referir-me à área do Porto litoral acima e abaixo do Douro e que vai até Braga/Guimarães) era previsível já há, pelo menos, vinte anos, tal como o do modelo de desenvolvimento que lhe deu origem e o sustentou. E é na estrutura, ela própria, desse modelo de desenvolvimento que encontramos as razões da sua ascensão, apogeu e declínio. Quando do 25 de Abril, a estrutura empresarial nortenha beneficiou das suas características (micro e pequenas empresas, distância ao centro de efervescência e decisão política e económica, trabalhadores ainda muito influenciados pela ruralidade o que dificultava a intervenção dos sindicatos e a influência dos partidos como o PCP e os situados à sua esquerda) para a “escapar” à vaga de nacionalizações, ocupações, saneamentos, intervenções estatais, etc. A seguir ao 25 de Novembro era a estrutura empresarial que restava fora do Estado, e de onde veio a nascer a 1ª vaga do empresariado português no pós revolução (Belmiro de Azevedo, Ilídio Pinho, Américo Amorim, para só citar alguns). O facto de se tratar de uma estrutura empresarial baseada fundamentalmente na indústria transformadora vocacionada para a exportação (hoje em dia, fonte de uma boa parte dos problemas que agora enfrenta) foi ao tempo uma vantagem acrescida, quando os problemas crónicos de balança de pagamentos tornavam imperiosa uma maior dinâmica nesta área. A menor pressão sobre os salários (factor de produção mais importante na sua estrutura de custos), fruto da menor influência sindical sobre os seus trabalhadores e de, muitas vezes, estes partilharem o trabalho na fábrica com alguns proventos de uma actividade agrícola de subsistência, e a desvalorização constante do escudo (a célebre “crawling peg”, lembram-se?) foram elemento decisivo na manutenção da sua competitividade e, logo, do status quo. Foram portanto razões históricas e um forte apoio estatal baseado na desvalorização da moeda e na contingentação das importações (o que é isto senão apoio estatal!?...) que viabilizaram este “modelo”. E temos de ser claros e afirmar que este não foi, de facto, um “modelo” de modernidade”, antes o possível, tendo correspondido mesmo a um retrocesso real face à estrutura empresarial anterior à revolução, o que fez o país abordar a integração na então CEE em condições bastante desfavoráveis. Essa integração, primeiro, a entrada na moeda única, a globalização e, antes disso, as privatizações, principalmente do sector financeiro, colocaram esse modelo num beco de que não me parece, felizmente, venha a sair... Quem previu o seu fim e teve oportunidade de se reconverter (o caso de Belmiro de Azevedo é o mais emblemático: a Sonae era uma empresa de laminados e aglomerados) não deixou de o fazer... Sobreviveu e fortaleceu-se!
E vamos lá ao investimento público... Independentemente das asneiras que se fizeram e, inevitavelmente, se irão continuar a fazer (espero que em menor grau e número); independentemente do dito investimento público poder e dever servir também de compensação e correcção de algumas assimetrias regionais, ele não pode deixar de, em certa medida, acompanhar também, no seu crescimento, o maior dinamismo de algumas regiões. Isto significa que, no fundo, se uma determinada região tem mais tendência para crescer fruto do dinamismo do sector privado ou da apetência das empresas para nela preferencialmente se instalarem, o investimento público estruturante, de forma proporcional ou não, à priori ou à posteriori, poucas vezes poderá escapar, pelo menos em parte, a esta mesma lógica. Portanto, o “norte”, que gosta de se fazer notar pelo seu tradicional liberalismo e empreendorismo, acaba por estar agora a pagar, também ao nível do investimento público, o preço de um “modelo” – baseado numa estrutura empresarial ainda maioritária - que durante algumas dezenas de anos lhe trouxe um apoio do Estado, directo e indirecto, então inquestionado e inquestionável. É a modernidade que o está finalmente a pôr em causa... Como dizia alguém que não deixou muitas saudades, “é a vida”...
Ora vamos lá ver:
O declínio da região norte (e estou a referir-me à área do Porto litoral acima e abaixo do Douro e que vai até Braga/Guimarães) era previsível já há, pelo menos, vinte anos, tal como o do modelo de desenvolvimento que lhe deu origem e o sustentou. E é na estrutura, ela própria, desse modelo de desenvolvimento que encontramos as razões da sua ascensão, apogeu e declínio. Quando do 25 de Abril, a estrutura empresarial nortenha beneficiou das suas características (micro e pequenas empresas, distância ao centro de efervescência e decisão política e económica, trabalhadores ainda muito influenciados pela ruralidade o que dificultava a intervenção dos sindicatos e a influência dos partidos como o PCP e os situados à sua esquerda) para a “escapar” à vaga de nacionalizações, ocupações, saneamentos, intervenções estatais, etc. A seguir ao 25 de Novembro era a estrutura empresarial que restava fora do Estado, e de onde veio a nascer a 1ª vaga do empresariado português no pós revolução (Belmiro de Azevedo, Ilídio Pinho, Américo Amorim, para só citar alguns). O facto de se tratar de uma estrutura empresarial baseada fundamentalmente na indústria transformadora vocacionada para a exportação (hoje em dia, fonte de uma boa parte dos problemas que agora enfrenta) foi ao tempo uma vantagem acrescida, quando os problemas crónicos de balança de pagamentos tornavam imperiosa uma maior dinâmica nesta área. A menor pressão sobre os salários (factor de produção mais importante na sua estrutura de custos), fruto da menor influência sindical sobre os seus trabalhadores e de, muitas vezes, estes partilharem o trabalho na fábrica com alguns proventos de uma actividade agrícola de subsistência, e a desvalorização constante do escudo (a célebre “crawling peg”, lembram-se?) foram elemento decisivo na manutenção da sua competitividade e, logo, do status quo. Foram portanto razões históricas e um forte apoio estatal baseado na desvalorização da moeda e na contingentação das importações (o que é isto senão apoio estatal!?...) que viabilizaram este “modelo”. E temos de ser claros e afirmar que este não foi, de facto, um “modelo” de modernidade”, antes o possível, tendo correspondido mesmo a um retrocesso real face à estrutura empresarial anterior à revolução, o que fez o país abordar a integração na então CEE em condições bastante desfavoráveis. Essa integração, primeiro, a entrada na moeda única, a globalização e, antes disso, as privatizações, principalmente do sector financeiro, colocaram esse modelo num beco de que não me parece, felizmente, venha a sair... Quem previu o seu fim e teve oportunidade de se reconverter (o caso de Belmiro de Azevedo é o mais emblemático: a Sonae era uma empresa de laminados e aglomerados) não deixou de o fazer... Sobreviveu e fortaleceu-se!
E vamos lá ao investimento público... Independentemente das asneiras que se fizeram e, inevitavelmente, se irão continuar a fazer (espero que em menor grau e número); independentemente do dito investimento público poder e dever servir também de compensação e correcção de algumas assimetrias regionais, ele não pode deixar de, em certa medida, acompanhar também, no seu crescimento, o maior dinamismo de algumas regiões. Isto significa que, no fundo, se uma determinada região tem mais tendência para crescer fruto do dinamismo do sector privado ou da apetência das empresas para nela preferencialmente se instalarem, o investimento público estruturante, de forma proporcional ou não, à priori ou à posteriori, poucas vezes poderá escapar, pelo menos em parte, a esta mesma lógica. Portanto, o “norte”, que gosta de se fazer notar pelo seu tradicional liberalismo e empreendorismo, acaba por estar agora a pagar, também ao nível do investimento público, o preço de um “modelo” – baseado numa estrutura empresarial ainda maioritária - que durante algumas dezenas de anos lhe trouxe um apoio do Estado, directo e indirecto, então inquestionado e inquestionável. É a modernidade que o está finalmente a pôr em causa... Como dizia alguém que não deixou muitas saudades, “é a vida”...
2 comentários:
Eu sou pouco entendida em economia.
Mas adoro estas suas análises: parece tudo muito claro, sabe!... :) Fazem muito sentido, e isso é reconfortante.
Lamentavelmente, não aparece ninguém a contraditá-lo, para alargar o círculo de luz!... ;)
ehehe
oh meu filho da puta, só dizes asneiras.
o investimento publico é feito com dinheiros europeus.
os europeus só mandam caroço para apoiar as regioes mais desfavorecidas. que não é lisboa.
sou transmontano, sabes? no dia em que te cobrarmos a electricidade produzida pelas nossas barragens estás falido, ouviste ó cornudo lisboeta?
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