Posso estar enganado, mas não me parece o FMI e a "troika" sejam assim tão estúpidos que pretendam a economia portuguesa se torne mais competitiva através da redução dos salários mais baixos. Assim sendo, o efeito pretendido parece-me ser bem outro: reduzir a procura interna de modo a gerar um excedente nas nossas contas com o exterior, diminuindo e endividamento. Como é óbvio, tal estratégia implica a manutenção de um desemprego estrutural a níveis relativamente elevados, funcionando a emigração não só como uma válvula de escape que impeça a implosão do sistema, mas também como uma contribuição para a redução dessa procura interna. Resulta daqui que toda e qualquer medida que possa, mesmo que de forma ténue, significar alguma pressão no sentido de uma alta de salários, principalmente dos mais baixos onde a propensão para o consumo é maior (subida do salário mínimo, alargamento da contratação colectiva, limitação aos despedimentos, investimento em formação e qualificação e outras do mesmo tipo), será sempre recebida com desconforto, ou até mesmo com um esgar de desaprovação, pela "troika" e pelo actual governo. Como também será fácil de entender, com um mercado interno anémico, sem investimento significativo na formação e requalificação e não constituindo a redução salarial panaceia que possa tornar as empresas exportadoras mais competitivas, é mais do que provável o investimento e algum possível crescimento económico tendam a acontecer principalmente no sector turístico, onde o flexibilidade, a precariedade laboral e o valor da mão de obra no custo total dos serviços prestados possam jogar papel mais relevante. Vistas as coisas deste modo, tudo parece fazer mais sentido, apesar desta leitura enegrecer ainda mais as já de si muito pouco risonhas perspectivas. O "empobrecimento" proposto desde o início pelo actual governo - prova-se - veio mesmo para ficar, e o tão propagandeado "pós-troika" não passa de uma miragem.
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