Pois imaginem lá agora que Fernando Pinto, CEO da TAP, a meio de uma entrevista sobre os planos da companhia aérea a que preside, reconhecia que um avião da transportadora poderia cair e que, embora tal acontecimento não fosse desejável e pudesse mesmo ser considerado catastrófico, seria bom assumir em público tal hipótese e discutir, também em público, o que todos deveriam fazer em tais circunstâncias. Está bem de ver que isso iria gerar alguma (bastante) desconfiança entre os habituais e potenciais passageiros, que diminuiriam os seus níveis de confiança na segurança da TAP, preferindo viajar noutras companhias com os prejuízos daí inerentes para a transportadora nacional. Mas as companhias aéreas, em geral, e a TAP, em particular, não consideram tal eventualidade nem têm planos para agir em tais circunstâncias? Claro que sim, e realizam mesmo exercícios frequentes onde essa possibilidade é reconhecida, sabendo, dentro dos limites do previsível, o que fazer em tais circunstâncias. Mas esses exercícios e estudos são realizados com a necessária e possível privacidade, e a divulgação das suas conclusões é reservada apenas a alguns destinatários, com níveis definidos consoante o seu papel e funções que exercem. Mais: seria impensável ver um alto-responsável de uma companhia aérea vir tecer considerações públicas sobre o assunto no meio de uma entrevista a um orgão de comunicação social.
Bom, pois foi mais ou menos este cuidado que o Conselheiro de Estado Vítor Bento não teve quando decidiu sugerir, numa entrevista ao "Público", que embora a saída do euro não fosse desejável tal deveria ser discutido publicamente. Vítor Bento deveria lembrar-se que já não é um comentador das televisões, um divulgador da ciência económica, um analista dos assuntos relacionados com as finanças públicas; mas um político com a responsabilidade inerente a ter sido escolhido pelo Presidente da República para o Conselho de Estado. Portanto, e em conformidade com as funções que actualmente exerce, deveria Vítor Bento assumir a necessária contenção ao falar deste tipo de assuntos, deixando à reserva e confidencialidade dos Conselho de Estado, Banco de Portugal e Ministério das Finanças a discussão, considerações e decisões sobre um assunto estratégico de enorme gravidade e consequências. E, simultâneamente, deixar a quem compete e não tem responsabilidades políticas - jornalistas, comentadores e académicos - as análises, especulações e criação de cenários sobre o assunto. Ao não o fazer, está a gerar desconfiança entre os seus concidadãos, com todos os prejuízos, fáceis de imaginar, daí resultantes. O problema, o verdadeiro problema é que no caso de Vítor Bento, como em tantos outros, não estamos na presença de políticos, mas de puros fenómenos mediáticos que, por via disso - da notoriedade construída nos "media" -, ascenderam à política "pura e dura" para a qual, independentemente do seu valor académico e das suas qualidades de divulgadores, não estavam preparados ou não terão mesmo qualquer vocação. No fundo, estamos aqui perante mais um dos maus (péssimos) resultados do populismo do "falar verdade" e do "ódio aos políticos" que, com a cumplicidade de tantos e para gáudio de alguns, tem vindo paulatinamente a ser semeado.
2 comentários:
A velha história do sapateiro a tocar rabecão... O problema é que estamos invadidos por sapateiros!
E mtªas vezes, remendões...
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