No sábado à tarde, em casa de amigos para almoço e assistir ao Geórgia – Portugal em rugby pela televisão, dei por mim, depois do jogo e de zapping apressado, a sintonizar algures um jogo de hóquei em patins, jogavam Benfica e Porto. Por pouco tempo, diga-se, pois é desporto que nada me atrai e o qual não sigo. Sei que Portugal, Argentina, Espanha e Itália dividem entre si as candidaturas a títulos, mas se me perguntarem quem é o campeão nacional, do mundo ou da Europa, só por acaso acertarei. Reparei, isso sim, que estariam no pavilhão do Benfica não mais do que umas mil pessoas, número este que pecará bem mais por excesso do que por defeito. Depois de me interrogar quem pagará por estes devaneios (a audiência televisiva deve ser proporcional aos assistentes in loco) lembrei-me que nem sempre foi assim. Em tempos, era eu criança, estávamos em plena glória daquilo que eu, mais tarde, passei a designar por “hóquei patriótico”, em que este era o desporto nacional por excelência com direito a relatos pela rádio e manifestações públicas de regozijo, com idas do povo ao aeroporto e tudo, quando o país se sagrava campeão do mundo ou da Europa. Como os relatos eram normalmente à noite, tínhamos o direito de ficar acordados até mais tarde, ouvindo nervosamente as marchas militares que eram o indicativo da Emissora Nacional para os relatos desportivos. Por vezes, desesperávamos, pois a ligação a Montreux (quase sempre era lá, acho) nem sempre era fácil e temíamos perder alguns minutos do relato. Por fim, lá vinha o som de Montreux, normalmente com interferências e eco, mas era isso que contribuía também para dar a noção de distância e de epopeia. Invariavelmente, Portugal ia “despachando” os adversários por vários a zero ou a um (“éramos” – assim mesmo, no plural – os melhores), até que vinha o tal jogo com a Espanha - a das bandeirinhas que marcavam as batalhas no mapa - que tudo decidia. Era o “jogo da rádio” por excelência: mais rápido, com o barulho de fundo de pavilhão, a bola a bater nas tabelas e os patins a “guincharem” nas travagens. Mais a mais, era um desporto de classe média, que se jogava na linha de Cascais e em Sintra bem como em outras estâncias turísticas como Herne Bay, Montreux e praias dos arredores de Barcelona, onde existiam ringues de patinagem para os tempos ociosos. Um dia, tudo se desmoronou. Eu, por mim, comecei a interrogar-me quando, pai regressado de viagem a Paris e tendo eu, entusiasmado, comentado que “tínhamos” sido campeões, talvez do mundo, ele, não disfarçando algum desprezo trocista pelo facto, afirmou que no L’Équipe isso tinha tido direito a três linhas de notícia numa página interior. De seguida, aproveitou para acrescentar que “isso não se jogava em lado nenhum”. No país, o Benfica campeão da Europa de futebol, o Sporting a vencer a Taça das Taças e, por fim, a selecção de futebol em terceiro no mundial davam, juntamente com a implantação decisiva da televisão (no hóquei, na televisão só por sorte se vê a bola) e o “recuo” da rádio, a machadada final no “hóquei patriótico” da minha infância.
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