Infelizmente, e apesar do desassombro - que saúdo - do artigo de Daniel Oliveira, a questão da enorme exposição mediática de alguém que, sendo um excelente empresário, é também um iletrado político, acumulando nesta área afirmações disparatadas, não se restringe ao crescimento dos extratos bancários dos jornalistas ou às oportunidades de carreira que um empresário como Soares dos Santos pode oferecer. Aliás, seria bem mais simples se assim fosse, embora saiba e admita tal terá o seu peso, não sendo, como o não são, os jornalistas "virgens vestais". O problema é mais vasto e tem a ver com o modo como a ideologia ultraliberal impregnou todo o pensamento político (?) e sobre a política - desvalorizando-os bem como ao papel do Estado - e fazendo, em sua substituição, das empresas e da sua gestão exemplos e modelos que apenas se tornaria necessário copiar e ampliar para a escala de um país e/ou de uma sociedade para que ambos pudessem ser tão bem sucedidos quanto um grupo empresarial. Assim sendo, nada como, sob a capa de um saber baseado no sucesso competitivo, dar voz política (repito: política) a empresários, apresentado-os e às suas propostas e soluções, credibilizadas por esse sucesso empresarial, como modelos que os países deveriam seguir e adoptar para que igual êxito lhes batesse à porta. O que dizem pode ser um "chorrilho" de disparates? Na maior parte dos casos é isso que acontece, mas como as afirmações servem ou estão próximas do "pensamento dominante", lá estão jornalista e "meio" para lhe concederem a credibilidade necessária. Aliás, as analogias não se ficam por aqui e é frequente também assistirmos, principalmente quando se fala do chamado "ajustamento", à comparação entre as opções de natureza económica a tomar pelo Estado e pelas "famílias", em situações que nos são apresentadas como semelhantes, no que constitui mais um exemplo do pensamento redutor. Onde estão, neste e noutros casos, os arautos tão anti-igualitários" do "tratar de modo diferente o que é diferente?
Concordando ou discordando do que escrevem e/ou do posicionamento político e ideológico de cada um deles, é o combate a esta "ideologia dominante", ao "pensamento único" de desvalorização e da autonomia da política, que se deve saudar em gente tão díspar nas suas ideias como o são, entre os comentadores, Daniel Oliveira, Pedro Adão e Silva e Pedro Marques Lopes e poucos mais; e, entre os políticos, retirados ou no activo, nomes como Mário Soares, Pacheco Pereira, Bagão Félix, Manuela Ferreira Leite e Adriano Moreira, que lá vão fazendo um esforço para tornar o espaço mediático num lugar um pouco mais recomendável. Valha-nos isso e , no momento actual, convenhamos que já não é pouco.
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