quinta-feira, julho 31, 2008

Ferreira Leite e a comunicação do PR

Tanto quanto me pude aperceber, o PSD foi o único partido a comentar a comunicação ao país do PR através de declaração formal e em directo do seu líder, Manuela Ferreira Leite, tentando deste modo ensaiar uma “colagem” à instituição e figura presidenciais. Já deve ter concluído que fez mal, uma vez que a comunicação de Cavaco Silva se revelou pouco consensual e um acto falhado face às expectativas geradas por Belém e à importância que os portugueses normalmente atribuem a uma intervenção presidencial com os contornos da que tinha sido anunciada.

Les Belles Anglaises (IV)







Triumph TR2 (1953-1955)

Cavaco Silva "à posteriori"

Uma nota de alívio sobre a comunicação do Presidente da República: afinal nada de muito grave se passava, mas, apesar disso, a intervenção de Cavaco Silva também nada continha em si que pudesse ser relacionado com qualquer pulsão populista. Ainda bem!

Uma nota de preocupação: mas será que a Presidência da República tem a clara noção da importância de cada tema na vida nacional, da especificidade e adequação de cada "media" ao conteúdo desses temas e da capacidade dos cidadãos para entenderem e interpretarem os diversos assuntos da governação?

Algumas considerações antes da comunicação ao país do PR

Pertenço à minoria que pensa que, após o período de transição dos finais de setenta e início de oitenta em que as lembranças da I República e a necessidade de normalização do regime recomendavam a adopção do semi-parlamentarismo ou semi-presidencialismo (não são bem a mesma coisa), como veio a acontecer através da manu militar de Ramalho Eanes, nada justifica que Portugal não caminhe para um regime parlamentar após o mandato e período de reeleição do actual presidente. Na Europa, para além da França da V República em que o actual regime semi-presidencialista tem na sua génese a visão messiânica de poder do general de Gaulle num período de guerra na Argélia e iminência de golpe de estado militar no país, e da Finlândia, nenhum outro país oriundo do chamado “mundo ocidental” o adopta, quer sejam monarquias constitucionais (o que está no cerne da sua própria existência) ou repúblicas. Esta posição valeu-me em tempos a crítica dos meus amigos “mais à esquerda”, convencidos da “tal” maioria sociológica de esquerda. Vale-me, hoje em dia, idênticas críticas dos que estão “mais á direita”. Posições oportunísticas, direi.

Serei pois dos que pensam que, mesmo no actual quadro constitucional, o PR apenas se deverá dirigir directa e formalmente aos portugueses (entenda-se: sem a intermediação parlamentar), e fora das suas habituais alocuções em datas como Natal, Ano Novo, curtas intervenções de oportunidade, etc (no 25 de Abril dirige-se ao Parlamento), em situações limite de grave emergência nacional (guerra, catástrofe, intervenção importante em teatro de operações estrangeiro, estado pré-insurrecional ou de grave dificuldade de manutenção da ordem pública, etc, etc) ou de vazio ou decisão de mudança no poder parlamentar (dissolução da A.R., demissão do governo e outros de cariz semelhante, não querendo ser exaustivo ou entrar em questões demasiado técnicas não sendo jurista, muito menos constitucionalista). Não querendo sequer sugerir que a actual PR caibam quaisquer intenções pouco claras no sentido de uma interpretação populista e/ou “caudillista” do poder, em abstracto, ou no seu papel enquanto Chefe de Estado, em particular, penso que sendo o PR eleito por sufrágio directo e universal poderá sempre existir algum perigo latente de fomento de algumas pulsões desse tipo na vulgarização da sua comunicação directa e mediática com os cidadãos, tão mais comum em regimes plebiscitários do que em democracias parlamentares consolidadas. Aguardo, pois, com interesse o que, de tão importante e grave, terá Cavaco Silva para nos dizer.

quarta-feira, julho 30, 2008

Perversidades da "Moderna"

A propósito do encerramento compulsivo da Universidade Moderna, convém lembrar que qualquer seu licenciado que concorra a um emprego no Estado o faz em perfeita igualdade de circunstâncias com qualquer outro com idêntico grau académico atribuído por uma Universidade prestigiada, pública ou privada. Claro que nada de semelhante se passa no sector privado, em que uma licenciatura pela “Moderna” equivale, nada mais nada menos, do que ao 12º ano com a respectiva nota final, necessariamente baixa pois apenas lhe terá dado acesso a essa Universidade.

Jack Arnold Sci-Fi (8)

"Monster On The Campus" (1958)

terça-feira, julho 29, 2008

Jack Arnold Sci-Fi (7)

"The Space Children" (1958)

Willie Dixon's Blues Dixonary (8)

"Seventh Son" (Willie Dixon)
Willie Mabon - Vocals & Piano
Restantes músicos não referenciados
Gravação de 1955

Johnny Rivers - "Seventh Son" (Willie Dixon)

Os portugueses e os seus prémios Nobel

Durante anos Portugal viveu incomodado por não ter um Nobel desde Egas Moniz e mesmo esse “a meias” (mais a mais, com alguém cujo nome era Walter Rudolf Hess – mas este era suiço) e controverso pela técnica científica que presidiu á sua atribuição. Aspirou-se a ele tanto como a um Oscar, de preferência na cultura e nas artes, pois era sabido e reconhecido que dificilmente a evolução sofrida pela investigação científica permitiria a Portugal aceder a um qualquer outro. De repente houve Saramago, e talvez porque o escritor também era, ele próprio, controverso - pelas posições assumidas durante o PREC, por viver em Espanha, pela questão “Sousa Lara”, pela sua ligação ao PCP e, se calhar, por ser arrogante e antipático, algo que os portugueses gostam de agitar quando detestam alguém por outras razões - os portugueses, e com eles Helena Matos sua porta-voz e vanguarda (ver “Público” de hoje, não linkável), voltaram a sentir-se incomodados. São feitios... Maus! Mas é feio e "pouca coisa"... Mesquinho, agirmos assim.

Nota: não simpatizo especialmente com as ideias políticas de Saramago e, daquilo que li, existem coisas que gosto e outras de que gosto menos. Mais: se o seu “Nobel” tem na base uma acção de lobbying eficaz, ainda bem. Melhor isso do que passarmos a vida a queixarmo-nos da nossa incapacidade para agir nessa área.

segunda-feira, julho 28, 2008

Jack Arnold Sci-Fi (6)


"The Incredible Shrinking Man" (1957)

Um Benfica preocupante

Falta ao Benfica uma ideia, um conceito, um modelo de jogo a partir do qual tudo se constrói. Contratar alguns jogadores e testar outros sem uma definição clara desse modelo, isto é, sem ter definido como se quer que a equipa jogue, é condenar os intérpretes a uma prestação não representativa e a equipa ao fracasso. E, note-se, não estou a falar de um “sistema”, pois esse parece ser o 4x4x2 (no início, ontem, parecia mais um 4x6x0) e o modelo precede-o no tempo e pode permitir vários sistemas alternativos. Mas, pergunta-se: o Benfica quer jogar num modelo que privilegie a posse e circulação de bola ou as transições rápidas, por exemplo pelos extremos? Com um ponta de lança de área mais fixo (Cardozo ou Makukula), utilizando extremos mais clássicos, e outro móvel (Nuno Gomes ou outro) ou com dois “móveis”, dispensando os extremos tradicionais? Qual o papel reservado ao “pivot defensivo”, o que define bastante o modelo de jogo e o tipo de jogador para essa posição, tão importante no futebol moderno (que teria sido a Espanha sem Marcos Senna?)?

Demasiadas perguntas e, até agora, nenhuma resposta. Preocupante.

Parece que o governo decidiu convocar o "Congresso da Asneira"

Em crianças e adolescentes, quando lá por casa as discussões entre nós, os mais pequenos, deixavam de ter o cérebro como “comandante supremo” o meu pai tinha por hábito interrompê-las, chamando-nos à pedra e à razão, com a lapidar frase “entrámos no congresso da asneira”. Pois parece que foi isso exactamente o que aconteceu ao PS com a silly season, que já não pode servir de desculpa para tudo e para todos. Mas vamos por partes.

A resposta à argumentação racional (pode ser questionável e rebatível, mas é racional, isto é, parte da razão) de João Cravinho sobre a questão da corrupção, utilizando (essa resposta) uma argumentação(?) baseada num qualquer superioridade moral, não se sabe, neste caso, conquistada onde ou quando, peca por dois motivos básicos: não parte do racional, da razão e do raciocínio, contra-argumentando politicamente, e esquece que foi em nome de superioridades morais várias que se cometeram algumas das maiores atrocidades da História. Em democracia dispensa-se bem tal arma de arremesso. “Congresso da Asneira” nº 1, pois.

Caso idêntico se passa com a resposta às considerações de Paulo Portas sobre o “Rendimento Social de Inserção” (RSI). Começo por fazer notar que, ao contrário de PP e do PP, sou um defensor do RSI como último recurso para os que a nada mais podem recorrer. Algo assim ajuda, entre outras coisas, a distinguir a civilização da barbárie. Mas o RSI contém em si algumas perversidades que se podem tornar, perante a sociedade, no seu pior inimigo. Deve, por isso mesmo, estar continuadamente sujeito a escrutínio público e investigação governamental dos seus beneficiários, garantindo a sua genuinidade, direito de acesso e carácter transitório para os que a outra situação estão em condições de aspirar. Caso contrário gera em si mesmo o vírus da injustiça e da sua própria destruição. Pois PP e o PP, muitas vezes culpados, com razão, pela demagogia mais rasteira, têm neste caso todos os motivos para exigir que se investigue e se reduzam ao mínimo as perversidades, o que o governo não deveria deixar de fazer pelas boas razões que presidiram e presidem à criação e manutenção do RSI. Mas parece que, pela resposta, o governo preferiu o “Congresso da Asneira” nº 2. Lamentável

domingo, julho 27, 2008

Les Belles Anglaises (III)











Lotus Elite (1957-1963)

Das Origens da Corrupção no Portugal Democrático

A propósito desta notícia do "Público", e como o Verão é tradicionalmente época de reposições, respigo um post publicado neste blog no dia 15 de Outubro de 2006 sobre o tema da corrupção, mencionado por João Cravinho e que obteve do PS uma não-resposta:
"Sejamos claros: a corrupção está inscrita no código genético da nossa democracia. Pena, mas é assim mesmo.Todos sabemos, excepto talvez George W. Bush e os seus conselheiros políticos, que nenhuma democracia sobrevive sustentadamente sem uma classe empresarial empreendedora e relativamente autónoma face ao estado, e sem uma classe média relativamente ampla e com um razoável nível de preparação educacional. Aliás, é a maior fragilidade destes elementos que faz com que nos países do sul da Europa as democracias tenham, na generalidade, tido mais dificuldade em se implantar e aprofundar os seus mecanismos e formas de funcionamento. Por sinal, são também estes os casos, se exceptuarmos as recentes democracias (ou muitas vezes nem isso) emergentes no leste europeu, em que a corrupção mais se instalou nos aparelhos políticos e no Estado, exercendo, de facto, uma influência política por vezes decisiva.O que se passa em Portugal, a seguir ao 25 de abril de 1974, é que o país tem ainda, apesar do seu crescimento nos anos 60, uma classe média demasiado pequena em número e razoavelmente mal preparada. Depois das nacionalizações dos grandes grupos económicos, vê-se também perante uma classe empresarial em fuga e um tecido económico fragilizado. Após o 25 de Novembro, e se a democracia quer sobreviver nos seus pilares fundamentais, o regime terá de garantir não só um forte crescimento da classe média como enfrentar a necessidade de reconstituição de uma classe empreendedora dinâmica e de um tecido empresarial que o suporte. A adesão à então CEE é um elemento chave nessa estratégia, mas, num primeiro momento, os dois objectivos mencionados serão preferencialmente centrados, no caso do crescimento da classe média, num aumento progressivo do número de servidores do Estado e no desenvolvimento de uma pequena burguesia empreendedora “de província” ligada aos negócios autárquicos; no caso do empresariado, voltado a norte por questões conjunturais, pelo desenvolvimento das indústrias de exportação e das actividades de distribuição, sempre com apoio e protecção estatal acentuados. Para que isto se realize e o objectivo seja alcançado rapidamente, o estado e os governos, a nível nacional e local, terão, na maior parte das vezes, de “fechar os olhos” a actividades menos lícitas ou até pouco legais; outras vezes, mesmo, assumindo uma neutralidade “activa” ou até uma actuação, em menor ou maior grau, colaborante ou mesmo incentivadora. É aqui que se começam a estabelecer as actuais “redes de interesses” e de “tráfico de influência”, que se vão estendendo, aprofundando e assumindo novos contornos e um carácter qualitativa e quantitativamente mais gravoso e notório a partir de 1986, quando começam a fluir os fundos estruturais e a política de obras públicas se desenvolve. É também este ambiente mais ou menos “facilitador”, que abarca, por necessidade de sobrevivência e fortalecimento do regime, vastos sectores da sociedade portuguesa, que vai alastrando e impregnando um pouco “tudo e todos”, acabando por, em certa medida, se tornar normalidade.Grande parte destas cumplicidades e “redes de favores”, que incluem de forma activa ou passiva largos sectores do aparelho político e judicial, subsistem ou deixaram sequelas até hoje, quando os objectivos que as determinaram estão em boa parte alcançados e, assim, a corrupção começa a passar de “solução” a “problema”. Mas dificilmente se pode começar a puxar a ponta do vestido sem que este se desfaça e o modelo fique nu, mostrando um corpo feio e com demasiadas rugas que se calhar ninguém quer ver, porque preferimos continuar a imaginá-lo belo. Ou seja, talvez seja necessário limitar o combate à corrupção (ou mantê-lo dentro de certos parâmetros “aceitáveis”) para que o regime sobreviva e respire sem grandes sobressaltos. Até porque sabemos as alternativas não existem ou são dolorosas podendo conduzir a resultados decepcionantes: o exemplo italiano aí está à nossa frente. Essa, e não outra qualquer, será, e utilizando uma expressão que fez história, a principal “força de bloqueio” desse combate. Suprema ironia..."

Jack Arnold Sci-Fi (5)

"Tarantula" (1955)

Onde se fala das "novelas" do futebol de Verão, de João Moutinho e da hipótese de um "draft" ao estilo NBA

Depois da “novela” Cristiano Ronaldo segue-se, em versão low cost (ou série “B” se preferirem) o “romance” João Moutinho? Não será já altura de FIFA e UEFA começarem a encarar o problema e o modo de o resolver, evitando situações que só prejudicam o futebol e a sua credibilidade enquanto indústria e afastam investidores, põe em causa o investimento dos clubes e a liberdade dos atletas? Claro que jogadores e clubes assinaram um contrato de livre vontade a cujo cumprimento ambos se obrigam. Esta é uma posição de princípio que terá de ser tida em conta. Mas, simultaneamente, parece estarmos aqui perante uma daquelas situações em que a lei já terá sido claramente ultrapassada pelo movimento social e, por isso, nada melhor que legislar sobre o assunto de modo a enquadrar legalmente a situação emergente não a deixando ao "Deus dará".

Como fazê-lo? Francamente, tenho dúvidas, não me parecendo que a liberalização total, com os jogadores livres para se transferirem no final de cada época, deva ser considerada dado o prejuízo que isso acarretaria para o clube de origem e a indefinição que traria à formação e estabilidade dos plantéis. Mas que algo baseado ou influenciado pelo “draft” da NBA, que protegesse jogadores, clubes de origem e de destino, bem como o equilíbrio e qualidade dos espectáculos, devesse vir a ser, com maiores ou menores modificações, considerado, incluindo um tecto salarial que evitasse colocar a indústria demasiado à mercê de um qualquer Abramovich (com este ou outro nome) e valorizasse, isso sim, a qualidade da gestão desportiva e empresarial, já é algo que me oferece poucas ou nenhumas dúvidas. A UEFA e a FIFA, esta tão preocupada com a "escravatura", bem podiam, e deviam, preocupar-se com o caso.

Nota á margem: João Moutinho é indiscutivelmente um bom jogador. Pensa e executa com a rapidez suficiente, consegue manter um ritmo e intensidade de jogo elevados, sabe o que anda a fazer no campo, percebendo o que é uma equipa, um colectivo e um jogo de futebol, e preenche bastante espaço no meio-campo, participando com quase igual aproveitamento nas acções ofensivas e defensivas. Mais ainda, parece ter “cabeça”. Mas é indiscutivelmente frágil do ponto de vista físico-atlético. Jogar num campeonato mais competitivo, como a "Premiership", onde tudo acontece “mais depressa, com menos espaço e tempo e com mais vigor”, numa equipa média como o Everton, seria um bom e definitivo teste para sabermos da sua real capacidade para se impor, ou não, fora do futebol(zinho) doméstico.

sábado, julho 26, 2008

Jack Arnold Sci-Fi (4)

"This Island Earth" (1955)

História(s) da Música Popular (96)


Jimmy Clanton - "Go Jimmy Go" (Doc Pomus-Mort Shuman)
Doc Pomus & Mort Shuman (VIII)
Para acabar bem este capítulo dedicado a Doc Pomus e Mort Shuman, vamos lá voltar atrás, aos idos de 1959 e aos teenage idols área para a qual a dupla escreveu temas de inegável sucesso. É que havia um rapaz lá pela terra dos pântanos (1940 - Baton Rouge, Louisiana, o tal Estado comprado a Bonaparte e que deve a sua denominação a Luís IV) chamado Jimmy Clanton, muito aprumadinho como deve ser e eram todos os rapazes do grupo. O seu maior êxito de então foi um tema de sua autoria chamado “Venus In Blue Jeans”, uma daquelas engraçadas (eu acho, ninguém é perfeito) canções ingénuas da adolescência quando julgamos os grandes amores (na altura, todos) são mesmo para sempre. O problema é que nem à memória resistem...

Bom, mas o que aqui nos traz não são os amores de adolescência (ou também são), mas sim Pomus e Shuman, antes de partirmos para outra. Pois o seu tema-sucesso para Jimmy Clanton foi este “Go Jimmy Go”, uma canção a propósito de um rapaz que era "o maior" lá do sítio a falar, a dançar e a... beijar. O resto a gente não sabe, mas não estamos a falar de ingénuas canções de adolescentes dos late fifties? Que queriam então?

quinta-feira, julho 24, 2008

Anglophilia (49)





Geo F. Trumper

Jack Arnold Sci-Fi (3)

"Revenge Of The Creature" (1955)

Inspector Gonçalo Amaral: um exemplo de empreendorismo!

O inspector Gonçalo Amaral pode não ser um ás da investigação criminal, nem ter sido agraciado por Deus ou pela natureza com células cinzentas ao nível de um qualquer Hercule Poirot: mesmo para quem, da expertise da matéria, só conhece os romances e séries policias, como é o meu caso, todo o desenvolvimento do processo de investigação do caso McCann quase parece um catálogo de medidas destinadas e tipificar o que nunca se deve fazer em casos semelhantes. Digamos que também a sua imagem, mais perto (ele que me desculpe) do agente da PIDE do que do detective clássico, que talvez só mesmo exista na literatura e no nosso imaginário por ela formatado, também pouco ajuda a que dele façamos o nosso Philip Marlowe indígena, neste caso mais afim de um fugidio “caso” amoroso com a Srª McCann depois de uns whiskies nocturnos num bar algarvio do que de uns longos almoços regados bem á portuguesa com os seus colegas polícias - que raio, será que não aprendeu que um detective que se preze é sempre um ser solitário? Mas, ao estabelecer e defender à outrance a tese que coloca os pais da criança no cerne do seu desaparecimento, aquela em que o escândalo e a conspiração, a política e, sabe-se lá?, também a promiscuidade e obscenidade sexual assumem o papel de motor do caso, que assim passa disso mesmo – “caso” - a história de cordel ao dispor de um qualquer Tarantino português, se possível com subsídio estatal e tudo, Gonçalo Amaral revelou que os seus dotes para o negócio, esses sim, bem ao contrário da sua capacidade investigatória, parecem não ser de desprezar, confirmando a tese de António Borges que vê em cada português um empreendedor, um Oliveira da Figueira em potência. Pelo “andamento” que o livro do inspector parece vir a ter, com previsíveis vendas aos milhares e traduções asseguradas, ora aqui está como, desta vez, afinal, o vice-presidente do PSD se não terá enganado no diagnóstico e que, para ficar rico, nada melhor do que fazer tudo mal feito mas estar no lugar certo na altura exacta! Chapeau!!!

quarta-feira, julho 23, 2008

Jack Arnold Sci-Fi (2)

"It Came From Outer Space" (1953)

Queiroz e JVP

A actual campanha para integrar João Vieira Pinto na equipa técnica da selecção nacional (já toda a gente se esqueceu que agrediu um árbitro na fase final de um mundial? Que exemplo assim se estará a dar?) será o primeiro grande teste que Carlos Queiroz terá de enfrentar, e a sua decisão o primeiro grande sinal do que poderá vir a ser o seu “mandato”. Scolari, estou certo, faria orelhas moucas a essa mesma campanha. Veremos se Queiroz será capaz de seguir idêntico caminho ou se, em vez disso, decide começar a atolar-se na tal porcaria que achava era necessário varrer.

terça-feira, julho 22, 2008

O fim da carreira de João Vieira Pinto - um comentário contra a corrente

Nunca fui um adepto de João Vieira Pinto. Sempre o achei um jogador sobreavaliado, levado ao colo que crítica futebolística indígena no seu reiterado papel de Dr. Frankenstein sempre na ânsia de criar novas criaturas. JVP pensava e executava mais rápido do que a maioria no campeonato português, mas essas eram características que já não fariam a diferença, por comparativamente atenuadas, nas ligas mais competitivas onde actuavam os melhores jogadores do mundo. Aí, onde essas qualidades conseguiam ser igualizadas por outros e onde só a habilidade natural não chega, o seu fraco poder físico-atlético, a sua fragilidade (em todos os aspectos), impediriam que estabelecesse a diferença de modo significativo. Acho que JVP sempre teve consciência disso, e depois de uma abortada experiência precoce na segunda equipa de Atlético de Madrid, por cá se deixou ficar, qual menino mimado da crítica e do “major”, sua mãe e pai adoptivos. Acresce que lhe faltava a mentalidade de um Figo ou de um Rui Costa, o profissionalismo e a seriedade competitiva de um Pedro Pauleta, o poder e a força de “antes quebrar que torcer” de um Fernando Couto, para só falar dos da sua geração, o que o aproximava mais de jogadores indisciplinados e com mentalidade provinciana da geração anterior, com percursos internacionais falhados saudosos da sardinha assada e do bacalhau com todos, (estou a lembrar-me de António Oliveira) do que do arquétipo do futebolista português bem sucedido da década de 90 do século XX. Por isso, não me deixa quaisquer saudades...

Jack Arnold Sci-Fi (1)

" Creature From The Black Lagoon" (1954)

segunda-feira, julho 21, 2008

O Fado Republicano

"O Dia do Regicídio" - Fado anti-monárquico interpretado na série pelos personagens "Marrequinho de Alfama" e outra fadista. (1ª parte - basta ver os últimos 2' 30'' do clip)

Idem (2ª parte - basta ver o início do clip)
É comum identificar-se o fado com as ideologias mais reaccionárias, mais “à direita”, talvez porque dezasseis anos de I República, que o atacava por afastar os operários e o povo da instrução, levando-os para as tabernas e prostíbulos, e quarenta e oito de ditadura, que o “castrou” das suas formas mais contestatárias, tenham dado origem a que apenas essas suas formas sobrevivessem com mais pujança, desde o fado aristocrático às suas versões mais fatalistas em que “a vontade de Deus” fazia fé. Mas o que é facto é que o fado, única forma de música popular urbana em Portugal, quer na sua origem lisboeta quer na sua versão coimbrã que viria a estar na origem da renovação da música popular portuguesa dos anos 60 e 70, atravessou toda a sociedade portuguesa e teve um papel importante na luta republicana, na crítica social (fado "jocoso"), no movimento anarco-sindicalista (existia o chamado fado-operário) e, até, socialista. Eduardo Sucena, no seu “Lisboa, o Fado e os Fadistas”, fala, que me lembre, em pelo menos dois cantadores socialistas de nomeada: João Maria dos Anjos, tipógrafo da Imprensa Nacional (os tipógrafos, porque tinham necessidade de saber ler, constituíam uma “vanguarda operária”) e o Milhinho do Murtal.

Bom, vem tudo isto a propósito da série “O Dia do Regicídio”. A série, em si, é sofrível ou até um pouco menos do que isso, mas oferece a rara oportunidade de mergulharmos um pouco no ambiente fadista da época e no papel que este desempenhou na luta anti-monárquica. Numa das suas cenas, temos a rara oportunidade de ouvir, numa tasca frequentada pelos conspiradores republicanos, um cantador (personagem “Marrequinho de Alfama”) e uma cantadora (NN) interpretarem um fado com uma letra claramente anti-monárquica e satirizando a figura do rei D. CarlosI, ajudando, assim, a criar um ambiente social, um “caldo de cultura”, claramente propício ao “golpe”, um pouco como a “balada” do final dos anos sessenta muito bem o fez em relação à ditadura.

Pois é essa mesma cena que agora aqui reproduzo, pedindo desde já desculpa por o fado estar, no You Tube, dividido por dois clips. Para quem tiver mais pressa e menos paciência, digo já que basta ver os últimos dois minutos e meio do primeiro clip e o início do segundo. Divirtam-se e, se possível, acabem com as ideias feitas e os preconceitos sem razão para existirem.

António Borges hoje no "Público"

A página 35 do “Público” de hoje (penúltima), não linkável, não podia ser mais contrastante. Na sua primeira metade (em cima) um artigo sério, rigoroso e até didáctico, como é seu timbre, de Francisco Sarsfield Cabral. Na sua segunda metade (em baixo) um puro e simples texto propagandístico, pobre, sem fundamentação provada (a afirmação de que “Portugal é um país de empresários” fará rir o mais sisudo, já que um dos dramas principais é exactamente o seu contrário) de António Borges, que em nada se distingue de outros do mesmo género oriundos de cronistas de serviço da área governamental. Assim, Sócrates pode ir de férias um pouco mais descansado, já que, com “companheiros” destes, para que precisa Ferreira Leite de adversários?

domingo, julho 20, 2008

História(s) da Música Popular (96)

The Walker Brothers
The Walker Brothers - "Lonely Winds" (Doc Pomus-Mort Shuman)

The Walker Brothers - "Here Comes The Night" (Doc Pomus-Mort Shuman)

Doc Pomus & Mort Shuman (VII)


Tal como aconteceu em relação a Leiber e Stoller, façamos aqui uma pequena incursão, a propósito de Pomus & Shuman, num dos grupos “muito cá de casa”, que só não era assim a modos como uma “British Invasion” in reverse porque os grupos britânicos tiveram sucesso dos dois lados do Atlântico, ao contrário do grupo de que agora falamos, os Walker Brothers, americanos apenas com sucesso relevante no UK. Sobre eles já tenho por aqui falado e como “o que é demais cheira mal” (em muitos casos nunca dei por isso, mas dizem os católicos que “o que é bom ou faz mal ou é pecado”, coisa que também não posso subscrever), não vale a pena tornar-me repetitivo. Vamos antes ao que interessa, sem demora porque se faz tarde.

Pois John Mause, Scott Engel e Gary Leeds também se meteram pelos terrenos de Pomus & Shuman e se “Lonely Winds” não cai necessariamente no “cesto” dos temas mais característicos dos Walker Brothers e dos meus favoritos do grupo, já com “Here Comes The Night”, onde a influência, aliás sempre afirmada por Scott, do “wall of sound” de Spector é notória, o caso muda bem de figura. Pois aqui os deixo, ambos do 1º álbum do grupo "Take It Is With The Walker Brothers".

Ferreira Leite e o novo aeroporto

Afinal parece que Manuela Ferreira Leite nada tem a opor à construção do novo aeroporto de Alcochete. É pena, pois se isso significa a sua adesão ao conceito “mega-cidade aeroportuária” (aguardam-se esclarecimentos), prova que, de facto, pese embora algumas afirmações avulsas “aqui e ali” de dirigentes do PSD (António Borges, por exemplo), não existe no partido a proposta de um verdadeiro modelo de desenvolvimento alternativo ao que, de uma maneira ou de outra, tem vindo a ser seguido e implementado desde os anos oitenta. É que, partindo do princípio que a ligação à rede ibérica (e não europeia, contrariamente ao que tem sido afirmado) do TGV é indispensável do ponto de vista político e de desenvolvimento peninsular integrado e que a ligação Lisboa-Porto é apenas um brinquedo de meia dúzia de milhares de milhões de euros oferecido em puro desperdício e holocausto ao lobby nortenho, o projecto da nova estrutura aeroportuária é aquele que melhor define e “recorta” um determinado modelo de desenvolvimento e de concorrência para Portugal no seio da Península. Um modelo errado, que nada tem a ver com uma análise rigorosa da situação real e concreta e, a partir dela, de uma estratégia que possa vir a ser bem sucedida. Um modelo para o qual o PSD parece não ter alternativa.

sexta-feira, julho 18, 2008

The Hammer Collection (13)

"The Vampire Lovers", de Roy Ward Baker (1970)

Três pequenas notas s/ o dia de ontem

  • Alguém explica ao PCP que se a taxa de IVA baixa um ponto percentual os comerciantes não são obrigados a fazer reflectir isso no preço final de um produto e podem, pura e simplesmente, optar por manter ou aumentar o preço, melhorando as suas margens? É que não estamos nos "Planos Quinquenais", não é assim?
  • Luís Filipe Vieira afirma que o facto da UEFA manter o FCP na "Champions League" não constitui uma derrota para o Benfica, uma vez que se o FCP fosse afastado LFV preferiria que o seu (e meu) clube não participasse . Ok, tudo bem, embora seja fácil fazer esse tipo de afirmações à posteriori - que, assim, valem o que valem. Mas se recorreu era pelo menos por achar que o FCP não deveria participar, independentemente da decisão de participação Benfica, não é assim? Não há derrota?
  • O PSD acha que o papel da oposição é apenas fiscalizar o governo e não apresentar alternativas. Duvido os portugueses pensem assim, mas também como é possível apresentar alternativas credíveis às políticas do governo sem ter, ou assumir, uma estratégia e um modelo de desenvolvimento alternativo? Sem isso, de facto, quaisquer medidas soariam oco e sem sentido, e o que parece é que o PSD de Ferreira Leite, mais do que não ter, teme apresentar uma estratégia que, necessariamente, o faça baixar nas sondagens e perder votos futuros. Rabo escondido (Ferreira Leite) com gato (António Borges) todo de fora, pois claro.

"Conta-me Como Foi", Carlos Mendes e o "Verão" (2)

Carlos Mendes - "Verão" (José Alberto Diogo-Pedro Osório)
Nos anos 60 Portugal era um país pobre, em grande parte rural, vivendo sob uma ditadura retrógrada que o tornava ainda mais periférico, com uma classe operária cujo grande objectivo era a luta contra a falta de liberdade sindical que lhe tolhia as possibilidades de alcançar melhores condições de vida e uma classe média fraca em número e poder de compra. Com uma guerra nas colónias que tudo condicionava. Não admira, por isso, a quase ausência de reflexos e repercussões internas daquilo que se passava no mundo. No que diz respeito às novas formas de música popular, e apesar dos esforços de alguns pioneiros, ele próprios, na sua maioria, oriundos da classe média urbana e mais identificados com os “teenage idols” e as versões mais soft do "rock" instrumental, de origem britânica, do que com o rock “puro e duro”, tudo ficou demasiado circunscrito aos concursos Yé-Yé (a influência da cultura francesa dominava), às festas de finalistas e a uma ou outra edição, mais ou menos esporádica, de alguns nomes com mais talento e/ou mais sorte (“Conchas”, Daniel Bacelar, o simpático Zeca do Rock, “Conjunto Mistério” e pouco mais). A Televisão, de censura e canal único, colocava os entraves necessários às aspirações desses jovens, que raramente os conseguiam “furar”, e verdade seja dita que o talento também não abundava. Acresce que em Portugal não existiam rádios locais e editoras independentes, responsáveis na América pelo boom do "rock na roll", muito menos um circuito de bares com música “ao vivo” (o que seria, nas condições de então!...) e, por tudo o que se disse, o mercado era assim quase inexistente.

Bom, mas vamos lá ao “Festival da Canção”.

Não me vou referir, de um ponto de vista mais ou menos sociológico, à importância da televisão nos anos sessenta: haverá que conheça muito melhor o assunto para sobre ele se pronunciar, mas era algo que em Portugal tinha apenas nascido em 1957 e constituía o entretenimento familiar preferencial. Quanto ao Festival, acontecimento único no ano televisivo, que faz de 1968 um ano tão único? Pois é a primeira vez que alguém quebra, a esse nível, a hegemonia daquilo a que João Paulo Guerra chamou de “nacional-cançonetismo” (que em Portugal se consubstanciava predominantemente no “Centro de Preparação de Artistas da Rádio, da Emissora Nacional), que não mais era do que a música ligeira do “passado”, com a qual a nova música popular, a nova geração, veio estabelecer uma ruptura. Mais, essa ruptura é feita através da vitória de alguém claramente oriundo do movimento Ié-Ié, com um tema que, embora “suave” e “melódico”, também com ele podia ser claramente identificado nas suas origens, até na imagem e modo de interpretar do então jovem Carlos Mendes. Mesmo na orquestração, com ao destaque dado ao orgão e à bateria. Se formos analisar os festivais anteriores, em todos eles excepto no ano de 1967 com a vitória de Eduardo Nascimento (que considero, com alguma liberdade, algo de híbrido – Nuno Nazareth Fernandes vem da Revista) os vencedores são temas e intérpretes ligados ao tal “nacional-cançonetismo”: “Oração”, com António Calvário (João Nobre-Francisco Nicholson-Rogério Bracinha, nomes do teatro de Revista); “Sol de Inverno”, com Simone de Oliveira (Nóbrega e Sousa e Jerónimo Bragança); “Ele e Ela”, com Madalena Iglésias (Carlos Canelhas). Esta a razão da importância que o Festival assume neste ano e faz dividir a família Lopes (acho que é este o nome; se não é peço desculpa) em “Conta-me como Foi”. É o conflito entre o futuro e o passado em directo e “ao vivo” na TV, o que era algo nunca visto até então. Qualquer coisa que fazia mesmo extremar posições e assumia alguma dose de radicalismo e de conflito geracional – o que hoje nos faria rir, claro. Curioso é verificar que esta terá sido a única verdadeira incursão vencedora do movimento Ié-Ié no Festival da RTP. Os anos seguintes, com excepção de 1970 com a vitória de Sérgio Borges com “Onde Vais Rio Que Eu Canto” (Nóbrega e Sousa), irão assistir àquilo que não se sabia na altura ser um certo domínio dos interesses conjunturais (e culturais) do PCP, na sua versão “frentista” do MDP e com a colaboração de alguns compagnons de route de ocasião, que se torna responsável pela renovação da música ligeira (repito: ligeira, não disse popular) portuguesa muito por via da influência de Ary dos Santos e da conjugação da sua muito razoável qualidade poética com a experiência de publicitário capaz de fazer os destinatários memorizar facilmente uma frase certeira. As suas “letras” reflectem isso mesmo e constituem, na altura, uma pedrada no charco. Aliás, a mesma estratégia de “apropriação” é usada pelo PCP em outras instituições mais ou menos ligadas e nascidas com o beneplácito e sob a égide do regime, desde sindicatos corporativos a associações recreativas e culturais. Esta apropriação “por dentro” de elementos do aparelho político e cultural da ditadura virá a ser-lhe de grande utilidade no pós 25 de Abril.

E pronto, mais não digo. Deixo-os com Carlos Mendes e o “Verão” de José Alberto Diogo (emérito benfiquista) e Pedro Osório.

"Conta-me Como Foi", Carlos Mendes e o "Verão" (1)

Curiosa a importância dada ao festival RTP da canção de 1968 e à canção “Verão” no 1º episódio de “Conta-me Como Foi”, que esta semana tive oportunidade de ver. Não, não me vou debruçar sobre a série, já que não tive oportunidade de ver o suficiente e com a atenção requerida para uma opinião definitiva e baseada; vi apenas uma meia dúzia de episódios e nem todos eles na totalidade. Já tive, no entanto, oportunidade de aqui me pronunciar sobre o que vi, pelo que mais não vem agora ao caso. Vem ao caso, isso sim, tentar pensar um pouco sobre as causas do afirmado no primeiro período deste texto. Ora vamos lá.

Que se estava, no final dos anos 50 e nos anos 60, em período de grandes mudanças sociais, culturais e comportamentais, quando a geração dos baby boomers chega à adolescência em pleno período de enorme prosperidade económica e depois de passado o trauma da WWII, embora no período mais gélido da guerra fria, não é nada de novo afirmar. Importante, isso sim, constatar que grande parte da afirmação desses novos valores culturais e sociais, de “viver a vida”, passa indiscutivelmente pela música popular, pelas formas e sons que assume e pela imagem e valores assumidos pelos seus intérpretes. Também será essa música popular que irá por sua vez agir sobre a sociedade, a política e os seus valores vivênciais e aspirações, ajudando a modificá-los. A nova música popular, opondo-se à chamada “música ligeira” herdada do período anterior à guerra, é sinal premonitório de uma sociedade nova que assume o seu lugar expulsando a antiga. Desnecessário falar do papel que as novas formas de música popular irão assumir em acontecimentos tão importantes como o relacionamento entre os sexos, a luta contra a segregação racial e a estanquicidade classista, as manifestações contra a guerra do Vietnam e pela paz, a afirmação dos direitos cívicos, etc, etc. De igual modo, não valerá a pena afirmar que é pela música que a “moda” se afirma enquanto ruptura com o passado (mods, rockers, glam rock, etc). Idem, no que se refere à droga, que dela é indissociável neste período, principalmente o LSD que dá origem a um movimento cultural (o psicadelismo) que tem talvez a sua maior afirmação na música popular. Mesmo outras formas de arte em ruptura com o passado, como éo caso da "Pop Art", não deixam de aparecer também ligadas à música popular.

O que se passa no seio da música ligeira e popular é também interessante e só isso possibilita que ela assuma o papel social e de inovação musical que vem a ser o seu. Pela primeira o seu domínio deixa de ser património dos “músicos”, de quem tem alguma formação específica (sabe ler uma pauta, recebeu lições de canto ou, pura e simplesmente, foi ensinado a aperfeiçoar o seu modo de cantar) e passa a ser património de todos os que querem aprender uns acordes ou exprimir o que lhe vai na alma. Isso deve-o ao "rock and roll", que vai beber a sua inspiração aos blues dos negros, um género musical com uma estruturação muito simples e um canto “sentido” e não trabalhado, próprios de uma cultura que nasce no duro trabalho dos campos e de quem não tem possibilidades de ter qualquer formação musical. De quem também não pode comprar instrumentos caros e que não sejam portáteis (os bluesmen iam cantando de terra em terra e os instrumentos originais eram improvisados), mas que necessita de algo que acompanhe a sua voz: uma guitarra, mesmo que de construção barata, já que ela tem apenas como função, com uns acordes simples, acompanhar e sublinhar a sua voz. O ideal para os adolescentes, com pouco dinheiro e sem paciência para as formas musicais dos pais, que não consideravam como suas, exprimirem as suas aspirações e afirmarem os seus valores pelo contraste. Mesmo quando falamos na dança, principalmente naquele período entre 1958 e 1962 que ficou conhecido como da “dance craze”, assistimos à afirmação uma ruptura igualitária: os pares deixam de dançar entrelaçados, o homem conduzindo a mulher, mas cada um é livre de dançar “como lhe apetecer”. Mais ainda, a música deixa de ter um papel de entretenimento, de “música de fundo” que torna o ambiente agradável enquanto se “fazem outras coisas”, mas ouve-se alto, assumindo um papel claramente dominante no ambiente. No palco as atitudes tornam-se provocatórias, sexualmente explícitas exprimindo uma das lutas do momento.

E agora perguntar-me-ão: mas que tem isso tudo a ver com a Festival RTP da Canção, com o Carlos Mendes e o “Verão”? Pois vem já de seguida... no próximo post.

quinta-feira, julho 17, 2008

O "Gato Maltês" andou hoje por aí

O "Gato Maltês" hoje fez como o Santana Lopes: andou por aí. Mas, neste caso, pelo Portugal (des)conhecido, das churrasqueiras, dos estaleiros de venda de materiais de construção, das variantes (às estradas), das "novas centralidades, dos "stands" ao ar livre de venda de carros usados. Como foi de dia, escapou às casas de alterne. Escaparia sempre por recusa, como escapou a almoçar aquelas coisas "leves" com que os portugueses gostam de se banquetear nos dias de muito calor: feijoada, chocos com tinta, cozido à portuguesa, entrecosto e assim sucessivamente até onde a imaginação nos levar. Ah, e o "Gato Maltês" jura que, apesar da constante melhoria do ar condicionado dos carros, continua a não perceber como há quem goste do Verão sem ser para estar na praia ou na borda da piscina a beberricar um daqueles "brancos" de Verão. Recomendo um bom Sancerre ou um igualmente bom Pouilly Fumé. Dos de cá, que tal um Sauvignon Blanc dos "Lavradores da Feitoria"?
Sendo assim, até amanhã.

quarta-feira, julho 16, 2008

Les Belles Anglaises (II)











Austin Healey 3000

Um sintoma da perda de competitividade do futebol português

Algo que devia deixar os responsáveis do futebol português bastante pensativos e que é um retrato fiel de como Portugal está a perder competitividade nesta área: Daniel Güiza, melhor marcador do campeonato de Espanha e internacional campeão da Europa, foi contratado pelo... Fenerbahçe... da Turquia! É só comparar com as contratações de FCP, SLB e SCP!

terça-feira, julho 15, 2008

O Mundo em Guerra (48)

UK & CW

Táxis partilhados: uma boa ideia

Há pouco, no Telejornal, percebi que já existem em Portugal algumas pessoas que se dispõem a partilhar um táxi como método de combate ao aumento do custo dos combustíveis. É uma boa, uma óptima ideia para os utentes e para a cidade, apesar do individualismo tradicional dos portugueses. Nada como uma crise grave para gerar soluções inventivas e mudar os hábitos no bom sentido... Recordo que há já alguns anos, talvez vinte, em Atenas isso era não só comum como algo institucionalizado, e um táxi podia parar, quando não viajasse com a sua lotação completa, para “meter” mais um ou vários passageiros. Lembro-me pelo menos uma vez isso aconteceu comigo, numa corrida relativamente longa, de Atenas para o Pireu. Sobrevivi sem problemas.

Também me lembro que em Londres, na companhia para a qual eu então trabalhava, nos early nineties, durante uma greve dos transportes de imediato os meus colegas ingleses, da administração ao porteiro, montaram uma organização ad hoc, com inscrições em paineis devidamente criados para o efeito, para transporte nos carros de cada um de e para o escritório, evitando a sub-lotação e o desperdício. Outras mentalidades...

Autarquias...

Hoje em dia, queixamo-nos frequentemente, e com razão, do esbanjamento dos dinheiros autárquicos em obras inúteis, pavilhões e rotundas, repuxos e “novas centralidades”. Mas tudo isso são consequências de um país que já foi pobre e carenciado, e de uma lógica autárquica moldada nos anos oitenta quando, por via dos fundos estruturais, se conseguiram finalmente edificar as obras básicas que a muitas autarquias faltavam, frequentemente de saneamento, de acessos, de novas casas que substituíram aquelas que os seus moradores associavam à pobreza endémica. Foi tudo isso que conduziu ao conceito de “obra feita” e definiu um arquétipo do autarca “fazedor” de obra tangível, moldando uma filosofia e uma cultura que permaneceram muito para além desse período e dessas necessidades. Que custa a ser alterado quando as necessidades são já bem outras.

Clássicos do Cinema (50)



"Frau Im Mond", de Fritz Lang (1929)

Ingrid Betancourt "Pop Star"

Está bem de ver que não me move qualquer simpatia pelas FARC, muito antes pelo contrário: existe nelas qualquer coisa de ETA terceiro-mundista e campesina, de guerrilheirismo datado para o qual quase todos, de uma maneira ou de outra, directa ou indirectamente já contribuímos em tempos longínquos. Saudarei certamente o seu fim e com ele o mundo ficará um pouco melhor. Confesso que desconheço em pormenor as convicções mais ou menos democráticas, como maior ou menor ligação ao narcotráfico, do governo de Álvaro Uribe, mas duvido lhe comprasse um carro em 2ª mão ou lhe emprestasse o meu último euro. Mas confesso, aqui bem confessado, que depois de algum capital de simpatia que em mim gerou a Srª Ingrid Betancourt, durante o seu cativeiro, esta sua transformação súbita de mártir (qual Infante Santo do século XXI ou Cristo crucificado) em ídolo pop - com prometidos filmes e peças de teatro - de “Boudu sauvé des eaux” em rainha do glamour, muito pela mão do marido de Carla Bruni - que também talvez o seja por se dar o caso de ser presidente de França e gostar de se dar ao espectáculo - a que oportunisticamente (como de costume) José Manuel Fernandes aderiu, começa a deixar-me demasiado irritado, incomodado mesmo. Direi que há qualquer coisa de demasiado propagandístico que está longe de me cair bem. Claro que a Srª tem direito à vida, pois claro, e por ter estado refém não lhe estará destinado necessariamente o opróbrio, o convento ou cobrir-se de areia por vergonha tal qual D. Leonor de Sá. Mas, senão alguma contenção, pelo menos algumas ideias políticas, da política pura e dura, no intervalo de homenagens e festins, crónicas e relatos, talvez não lhe ficassem mal e também fossem algo bem vindas. Por mim, seriam com certeza. Fico á espera, pedindo-lhe desde já desculpa se estou a ser injusto.

segunda-feira, julho 14, 2008

Bairros sociais...

Claro que as migrações dos anos 40 e 50, da província para a cidade de gente que, apesar de tudo, partilhava valores e religião, língua e alguns hábitos, mais pequena-burguesia de funcionários do que qualquer outra coisa, nada tem a ver, até em número, com a actual imigração de gente de etnias, línguas e religiões diferentes, hábitos e valores antagónicos, mas apetece-me dizer que Salazar bem percebia de integração, pelo menos enquanto o regime pôde controlar esses movimentos migratórios nos estreitos limites da não massificação e da sua não disseminação em bairros de lata: bairros sociais com casas individuais, geminadas, quintal, igreja ao fundo... Tudo o que reproduzia a vida da aldeia de origem, da vizinhança, do Portugal rural que o regime importava para pequenas aldeias dentro da própria cidade, assim reproduzindo a sua própria ideologia e contribuindo para a sua perpetuação. A industrialização acelerada, a “malfadada industrialização” geradora do grande crescimento económico dos anos 60, tudo isso levou à sua frente.

As Capas de Cândido Costa Pinto (45)

Capa de CCP para "O Homem Da Cama Nº 10", de Mary R. Rinehart, nº 10 da "Colecção Vampiro"

Alegre e Carvalho da Silva

Confesso achar curioso o fascínio que Manuel Carvalho da Silva exerce sobre a ala conservadora do PS, a ponto de ser personalidade de destaque no primeiro número da revista on-line “OPS" (a propósito, porquê o modelo “estático”, com periodicidade definida, de uma revista em algo como a net que possibilita uma muito maior flexibilidade e dinamismo? Saudades das revistas de debate de ideias no formato do século passado?). Compreende-se: Manuel Alegre vive na saudade de um futuro com uma “frente unida de esquerda” e, portanto, agarra com ambas as mãos tudo o que, vindo dos lados do PCP, tiver um ar de alguma heterodoxia, mesmo que para assim achar seja necessária alguma dose de benevolência. Esquece, contudo, Alegre que, independentemente da competência sindical de Carvalho da Silva, que constitui um facto incontroverso, essa sua heterodoxia, constituindo-se como um valor acrescentado necessário, é muito mais fruto das circustâncias de ocupar o lugar de dirigente máximo de uma central sindical onde coexistem “comunistas, socialistas e outros democratas” (a expressão é do PCP) e da necessidade do PCP assim hegemonizar “amplas camadas democráticas” (idem), do que propriamente por uma linha de pensamento autónoma e consequente, que me parece, a existir, ser desconhecida para além de uma ou outra divergência pontual ditada pelos objectivos acima enunciados. Claro que Carvalho da Silva e o PCP vão continuando a cultivar essa imagem e a potenciar a graça assim recebida. Entretanto, Alegre esquece-se que no "post -modernismo" dos dias de hoje a contradição principal já não é entre o capital e o trabalho, entre o proletariado e a burguesia, mas entre o estado de direito democrático e a economia de mercado (com as suas várias nuances) a ele umbelicalmente ligado, por um lado, e o centralismo estatista que arrasta necessariamente consigo os genes da ditadura, por outro. Também esquece que tanto Carvalho da Silva como a CGTP têm apenas o valor que lhes é conferido pelo PCP. Por “este” PCP, não um outro qualquer imaginado.

domingo, julho 13, 2008

Ainda a propósito da passagem de Bob Dylan por Lisboa...

Bob Dylan - "Visions Of Johanna". Do duplo álbum "Blonde On Blonde" (1966)
Nota pessoal: por vezes hesito quando tenho de escolher um dos temas de Dylan meus favoritos. Mas alguns deles são invariavelmente de "Blonde On Blonde". De acordo com um comentário que o LT me deixou há pouco, este é mais um dos temas que, hoje, seria practicamente impossível ouvir nas play lists da rádio. De acordo; nem as oiço. Mas, meu caro LT, o mundo muda e Dylan e o "Em Órbita" também teriam sido quase impossíveis na AM e sem a FM (uma novidade na altura), Presley sem as pequenas emissoras e as editoras locais dos USA, outros sem a MTV e ainda muitos mais sem a net. Por exemplo, os "Deolinda", dos quais já aqui dei conta pela 1ª vez há muitos meses, teriam sido quase impossíveis sem o My Space, que talvez seja a FM dos dias de hoje. Felizmente, também já não precisamos de ouvir, baixinho, as emissões da BBC em Onda Curta.

História(s) da Música Popular (95)

The Drifters - "I Count The Tears" (Doc Pomus-Mort Shuman)

The Searchers - "I Count The Tears" (Doc Pomus-Mort Shuman)
Doc Pomus & Mort Shuman (VI)
Isto “cada um é como cada qual” e nem sempre conseguimos fazer bem aquilo que queremos: se em alguns casos (“Sweets For My Sweet”) a coisa até sai bem, já neste “I Count The Tears” (1960) não se poderá dizer a mesma coisa. É que não basta chegar a um original americano, neste caso de Pomus & Shuman e dos Drifters, e dar-lhe a roupagem muito característica do "Liverpool Sound" dos Searchers - cheia de uniqueness, digamos - para que tudo saia a preceito: às vezes não sai mesmo e a comparação é um pouco penosa. O problema é que ter um som próprio também não significa “encher chouriços”, que é o que o grupo de Liverpool faz (mais do que menos) aqui neste “I Count The Tears”. Talvez por isso o sucesso tivesse sido pouco, bem mais merecido com outras adaptações. Mas, francamente, de todas as que conheço do grupo de Mike Pender a melhor e única que bate o original respectivo continua a ser a de “Sweets For My Sweet”, apesar da muito razoável adaptação de “Take Me For What I’m Worth” de P. F. Sloan e das já faladas de Jackie DeShannon. Mas pronto, fica aqui ao vosso julgamento, que isso lhes devo.

Les Belles Anglaises (I)











Jaguar XK 150

Cristiano Ronaldo o "melhor do mundo"?

Até há uma semanas, cinco ou seis, se fosse um dos votantes para o “melhor jogador do ano” não hesitaria em votar em Cristiano Ronaldo, mesmo apesar do Europeu relativamente sobre o fraco que realizou. Hoje, em idênticas circunstâncias por certo o não faria, depois da interminável novela que ele, o seu empresário e o Real Madrid têm vindo a protagonizar. Sim, eu sei que o dinheiro vale muito e Cristiano pensa que se protagonizasse a mais cara transferência de sempre isso seria um marco na sua carreira e no caminho para ser considerado “o melhor do mundo”. Que Madrid não é Manchester. Que uns milhões de euros e o protagonismo assumido dariam muito jeito à “vidinha” de Jorge Mendes, que está a prestar um mau serviço ao seu cliente Cristiano. Que, que e também mais que... Mas também sei que para eleger o “melhor do mundo” não chega o comportamento em campo; estamos a estabelecer um padrão, a dar um exemplo e para isso torna-se absolutamente necessário entrar também em consideração com valores éticos, comportamentais e sociais, principalmente os assumidos no exercício da sua profissão e com ela relacionados, e aí Cristiano tem vindo a perder em toda a linha. Por isso, não merece mais a eleição e acho (espero) os votantes tenham também isso em conta.

sábado, julho 12, 2008

A propósito da passagem de Bob Dylan por Lisboa...

"Stuck Inside Of Mobile With The Memphis Blues Again" (do duplo ábum "Blonde On Blonde" - 1966)
Nota pessoal: talvez o meu tema favorito de Dylan e certamente o meu álbum de referência da sua música, que incluo nos 5 melhores de sempre da música popular. Como se dizia no "Em Órbita": "só Dylan é Dylan".

Carlos Queiroz

No dia 30 de Junho do ano passado, tive oportunidade de escrever o seguinte aqui neste blog sobre os títulos conquistados pelas selecções jovens de Portugal.
"Fui dos que sempre considerei sobrevalorizados os resultados conseguidos pelas selecções portuguesas de futebol nas categorias de formação, dos quais os títulos de 89 (Arábia Saudita) e 91 (Portugal) foram os mais expressivos. Em primeiro lugar, porque sempre considerei que sendo categorias de formação os títulos não seriam o mais importante, dando como exemplo os poucos títulos conquistados nesta categoria (sub-20) pelas principais selecções europeias, algumas campeãs do mundo absolutas por várias vezes. Em segundo lugar, porque era de opinião que esses títulos tinham sido obtidos na base de uma certa "terceiro-mundização" do futebol jovem em Portugal, juntando jogadores em estágios intermináveis tal como, com o objectivo de sobressaírem politicamente através da conquista de títulos, o fariam as selecções de fora da Europa. Era, em certa medida, uma reincarnação futebolística do hóquei em patins “patriótico” dos anos 40 e 50 do século XX, modalidade que se sonegava aos portugueses ser de expansão e expressão reduzidas ou quase inexistentes. Ao “navegar” pelo site “Mais Futebol”, a propósito do Mundial de sub-20 que começa por estes dias, extraí, em prova da minha tese, as seguintes conclusões:
  1. Nunca a Itália (4 vezes campeã do mundo absoluta) ganhou a prova. Nem sequer esteve presente em qualquer final.
  2. A Alemanha (tri campeã do mundo absoluta) venceu apenas uma vez: no longínquo ano de 1981 venceu por 4-0 o Qatar(!) na final. Participou em apenas mais uma final, em 1987 no Chile, tendo perdido com a Jugoslávia 5-4 (gp).
  3. Para além de Portugal (vitórias citadas) e da Alemanha, apenas a URSS, em 1977, a Jugoslávia, 1987 e a Espanha, já em tempos “históricos” - 1999, foram campeãs, esta vencendo na final o Japão(!) por 4-0.
  4. Potências do futebol europeu como a França, a Holanda (ambas com pergaminhos na formação) ou a Inglaterra nunca estiveram sequer presentes numa final. Já não falando de médias potências como a Suécia, Dinamarca, Roménia, etc.
  5. Os grandes vencedores são países não europeus: Brasil e Argentina somam 9 vitórias, contra 6 dos europeus.
  6. Por fim, dos jogadores portugueses mais votados para eleger o melhor do torneio, nenhum deles fez uma carreira de sucesso: Emílio Peixe foi considerado o melhor em 1991, Paulo Torres o 3º no mesmo ano e Dani o 2º em 1995."

Hoje, posso acrescentar o seguinte:

Acresce que muitos dos jogadores responsáveis por alguns dos melhores resultados das selecções nacionais não são sequer oriundos da chamada (impropriamente) "geração de ouro" (isto é, não pertenceram às selecções sub-20 de Riad ou Lisboa) e, de cor e só para citar alguns, lembro Costinha, Nuno Gomes, Pauleta, Cristiano Ronaldo, Miguel, Dimas, Paulo Bento, Maniche, Ricardo Carvalho, Jorge Andrade, Deco e Sérgio Conceição.

Tendo dito isto, falemos então de Carlos Queiroz e da sua contratação como seleccionador nacional. Em primeiro lugar, convém lembrar o modo deselegante como deixou o cargo: ao falar “de limpar a porcaria que existia na FPF”, C.Q. poderia estar cheio de razão, mas a afirmação feita a quente no final de um jogo que ditava a eliminação de Portugal da fase final de um Mundial é não só sintoma de algum descontrole emocional, inadmissível nas funções, como de uma de duas coisas: ou que não soube agir “politicamente” para conseguir o poder necessário para “limpar essa porcaria” ou que, não o tendo conseguido por questões que transcendiam o seu campo de actuação, se deveria ter demitido de imediato perante essa mesma inexistência. Imaturidade, talvez. Verdade, também, que nunca conseguiu algo de relevante nas suas experiências enquanto treinador principal e que, portanto, o seu crédito nasce apenas das já referidas conquistas enquanto responsável das selecções jovens e de uma bem sucedida experiência como adjunto do Manchester United (o que é razoavelmente diferente de ser “manager”). Diga-se também, em abono da verdade, que o selecção sul-africana e o Real Madrid eram presentes razoavelmente envenenados.

Bom, em função do que acima afirmei a escolha de C. Q. é uma má escolha? Apesar disso, não o será tanto assim. De acordo com o perfil que aqui tracei como necessário (e é assim que o assunto deve ser analisado) C. Q. tem, hoje em dia, uma maior maturidade e uma personalidade forte. Tem ideias e duvido se vergue aos poderes mesquinhos do futebol português. Conhece bastante bem o futebol internacional, do 1º mundo futebolístico e não do Egipto ou do Burkina Faso, incluindo, por dentro, aqueles que são, talvez, os dois maiores clubes do mundo. Embora nunca tendo conquistado nenhum título de relevo no futebol sénior como treinador principal (algo em seu desfavor) e não se lhe reconheçam ideias claras em relação a princípios e modelo de jogo, vem com o poder que lhe é concedido pelo reconhecimento de uma personalidade como Alex Ferguson, de um salário excepcional (também conta), e de uma quase unanimidade nacional em torno do seu nome. Tem experiência da Premiership, da Champions League e o reconhecimento dos principais jogadores, já que tem uma vivência cosmopolita semelhante. Tem formação escolar adequada, o que não constando do perfil que tracei será factor preferencial. Único ponto fraco: não tem experiência de comando de uma selecção sénior em fases finais de Europeus e Mundiais, embora isso possa ser parcialmente (repito: parcialmente) corrigido pela sua experiência nas fases finais da Arábia Saudita e de Portugal com as selecções jovens. Nas circunstâncias actuais, seria muito difícil fugir à sua indigitação, mas é bom que tenhamos uma noção clara da realidade: não é um treinador de renome internacional e com títulos conquistados que o coloquem acima de qualquer suspeita, e se os resultados não aparecerem já em Setembro... Da minha parte, tem o benefício da dúvida.

Nota final: sendo Rui Santos reconhecidamente um membro do lobby Queiroz e gastando 90% do seu tempo a "dizer mal" (é mesmo o termo adequado) da FPF e de Madaíl, o patrão de C. Q., será que vai ficar desempregado ou apenas mudar de registo?

Onde se fala de Robin dos Bosques, do Sheriff de Nottingham, de Guy de Gisbourne, de Lady Marianne e de uma tal "taxa"


Quem conhece a vida das empresas sabe que, salvo caso de força maior (muito maior), devida e fundamentadamente justificado, não é aceitável um decréscimo, de um exercício para outro, na “margem” dos produtos produzidos. Isto significa que se um dos factores de produção (matéria-prima, “hora-homem” ou “hora-máquina”) vê o seu custo aumentar, de imediato se procura uma compensação na redução de um ou de outros custos e/ou então tender-se-á a fazer reflectir no preço, na medida em que o mercado o permita, o agravamento de custo verificado. Frequentemente, mesmo, são estas situações de agravamento de um ou vários custos que conduzem à inovação (“a necessidade aguça o engenho”), com benefícios inequívocos para o consumidor e para a empresa, claro.

Bom, quando acontece um agravamento em alguma das rubricas daquilo que se designa no calão da vida empresarial por “overhead expenses” (custos fixos, em termos bem mais corriqueiros se bem que talvez não tão rigorosos), a tendência será semelhante, levando a empresa a reduzir esse custo, de forma mais ou menos proporcional, em outras rubricas (muitas vezes recorrendo a contenção salarial do pessoal administrativo ou até procedendo a despedimentos, cortando nas viagens e em outras despesas correntes, publicidade e promoção, etc) ou a tentar aumentar a “margem” dos produtos produzidos no sentido de “melhor” absorver esse agravamento ocorrido nas tais “overhead expenses”, quer através do aumento de preços quer através de processos de inovação no sentido de reduzir os custos do processo produtivo.

Tendo dito isto, a taxa “Robin dos Bosques”, sendo à partida uma boa ideia (faz pagar a quem lucra com a alta dos preços do petróleo, prejudicial para o país no seu todo, uma taxa acrescida no sentido de beneficiar quem com esse aumento mais sofre – fácil e justo lembrarmo-nos das últimas afirmações de Fernando Ulrich sobre a necessidade de fazer recair sobre quem pode um agravamento fiscal por questões de coesão social), funciona para as empresas sobre as quais incide (petrolíferas) como um custo acrescido, que, à partida, irá “pesar” sobre os seus lucros antes de impostos. Sendo as ditas “overhead expenses” (custos fixos, pronto!) algo que, por definição, oferece muito poucas hipóteses de flexibilidade e adaptabilidade conjuntural, muito de semelhante se passando com eventuais processos de redução de custos, poderemos estar certos que a pressão para fazer reflectir o agravamento provocado pela nova taxa nos preços dos combustíveis pagos pelo consumidor será tremenda. Mais ainda, sabendo todos, e as empresas petrolíferas e o Estado cobrador de impostos mais do que quaisquer outros, que a gasolina e o gasóleo serão dos bens com uma menor elasticidade na relação procura/preço, isto é, cuja procura, pelo menos no curto-prazo, menos reage, no sentido negativo, a um agravamento dos preços.

A pergunta que fica por fazer é portanto a seguinte: está o governo a prever todas as implicações desta sua decisão (insisto: em teoria, uma boa ideia) e tem instrumentos para assegurar aos cidadãos consumidores que não está a brincar de aprendiz de feiticeiro e que as petrolíferas não vão arrecadar com uma mão o que entregaram com a outra? Ou seja: que o pobre do “Robin dos Bosques” não vai acabar por ficar prisioneiro do Sheriff de Nottingham, de Guy de Gisbourne e perder as boas graças de Lady Marianne? Espero bem que isso não aconteça... pois sempre gostei de romances de aventuras em que os "bons" ganhem e obtenham a devida recompensa. Que não seja o governo a retirar-me esse prazer!

sexta-feira, julho 11, 2008

A propósito dos disparates de Joseph Blatter

Escrito aqui, no "Gato Maltês", no passado dia 6 de Junho:
"O jogador Cristiano Ronaldo tem um contrato válido com o clube Manchester United, membro da Premier League e da FA e, através desta última, da UEFA e da FIFA - que, ao que se sabe, tem sido cumprido integralmente por ambas as partes. O referido contrato tem validade por mais umas épocas (não sei exactamente quantas, mas isso não é relevante). Portanto, não assistindo a qualquer das partes razões para a respectiva denúncia, ambas estão obrigadas ao seu cumprimento integral, o que inclui os deveres de lealdade, respeito e sigilo, para além de, no caso da entidade patronal, proporcionar ao jogador Cristiano Ronaldo todas as condições para que possa exercer na plenitude a profissão para a qual se encontra habilitado e, no caso do jogador, que este ponha ao serviço do clube toda a sua capacidade técnica, física e atlética. Acontece que me parece ter ultimamente o jogador, com as suas declarações pelo menos dúbias e eticamente reprováveis, colocado em causa os deveres de lealdade e respeito a que se deveria obrigar, pelo respectivo contrato, perante a sua entidade patronal. Também um outro clube, o Real Madrid, membro da Real Federação Espanhola de Futebol que, por sua vez, tal como o Man. United, também faz parte da UEFA e da FIFA, me parece ter incorrido em violação grave da ética e do comportamento que deve (ou deveria) presidir ao relacionamento entre membros dessas organizações e a uma concorrência saudável e leal. É para mim óbvio que esses deveres deveriam estar regulamentados e ser impostos pelas respectivas associações aos seus membros (Premier League, FA, RFEF, UEFA e FIFA) e que a sua violação por parte de qualquer ou quaisquer desses seus associados deveria dar origem a sanções adequadas, o que pelos vistos não acontece. Sendo assim, na situação actual dificilmente o futebol poderá alguma vez ser visto como uma actividade respeitável, bem como uma indústria séria e credível."

quarta-feira, julho 09, 2008

Cinema e Rock n' Roll (19)


"High School Confidential", de Jack Arnold (1958)

1º aviso: não vi o filme. A minha relativa tenra idade na altura e o facto destes filmes sobre "rock n’ roll" e deliquência juvenil despertarem na censura salazarista um apetite de gourmet justifica-o. Provavelmente, nem terá passado nos cinemas, em Portugal, até porque Jerry Lee Lewis e o seu “pumping piano” eram praticamente desconhecidos, mesmo para alguns daqueles a quem o rock de imediato atraiu e para os quais se tornou vício. Bom, mas bem me parece que, pelo menos, o cast justificaria uma visão (Russ Tamblyn é o teenager de serviço), para além do próprio Jerry Lee Lewis e da sua música muito antes de “Great Balls Of Fire” se tornar vedeta de soundtrack por via do sofrível filme biográfico de Jim McBride sobre o mesmo Lewis (também com Winona Ryder no papel da sua prima/mulher teenager) ou do “TopGun” com o execrável Cruise (em compensação tem Kelly McGillis). O realizador é um tal “de” Jack Arnold, homem de serviço em muitas curiosidades e, hoje por hoje, filmes de culto de “Série B” e Sci-Fi. Neste campo, valeria bem a pena uma das nossas TV’s lembrar-se de um pequeno ciclo. Esperanças... No entanto, e curiosamente, o seu filme mais conhecido é “The Mouse That Roared” (“O Rato Que Ruge” - 1959) uma comédia com Peter Sellers que fez algum sucesso em Portugal. Parafraseando já não sei se o Lauro António, se o Laurodérmio, se o Herman José: “Let’s look at the trailer”.

Viva o "carro-eléctrico"!

Sim, eu sei que a escassez e o preço elevado de um bem levam mais rapidamente à procura de um seu sucedâneo, muitas vezes trazendo consigo mudanças tecnológicas e de modo de vida. Foi assim na América do século XIX, em que a necessidade de mão-de-obra nas indústrias do Norte e da criação de um mercado para os seus produtos levou ao fim da escravatura. Sabemos também, desde Charles Darwin, que as espécies se adaptam à evolução do meio, só as mais aptas resistindo a essas mesmas modificações nas suas condições de existência. Também sabemos que o aumento do preço do petróleo e a sua previsível escassez tornam rentável a utilização de outro tipo de energias, dando origem a modificações significativas num mesmo modelo de desenvolvimento e até ao surgimento de outros. Ou, mais perto da nossa vida de todos os dias, a modificações nas fontes e no modo como se gera a energia.

Também sabemos, pelo menos todos aqueles que minimamente se interessam pelo modo como funciona um automóvel, que o motor de explosão, de êmbolos alternativos, é, com mais ou menos aperfeiçoamentos, uma tecnologia herdada do século XIX e que todas as tentativas de fazer mover automóveis de outro modo (turbina – a Rover fez em tempos uma experiência - , êmbolo rotativo – existiu um NSU e um Mazda, não me lembro se mais algum), mesmo que utilizando combustíveis fósseis, por uma ou outra razão, que desconheço, foram votadas ao fracasso. Mas confesso, confesso mesmo, que esta história dos automóveis eléctricos em Portugal, anunciada assim do “pé para a mão” pelo primeiro-ministro sem qualquer explicação sobre as questões técnicas que, até aqui, se levantavam aos projectos de automóvel movido a electricidade (não sou “esperto” no assunto, mas o peso e o carregamento das baterias, o espaço ocupado por estas, a autonomia, as “performances” e a praticidade eram questões ainda não resolvidas), sem qualquer ideia sobre preço, manutenção, mercado e por aí fora, mesmo que pela sua reduzida dimensão geográfica Portugal se preste bem a “país-teste”, parecem-me incluir uma boa dose de propaganda, bem a jeito do “choque tecnológico” ou, para ser mais simpático, apenas mais um exemplo para ilustrar o conceito “wishfull thinking”. Bom... mas longe de mim acusar por isso o governo... É que bem Portugal precisa de algum optimismo... Oxalá não morra é de overdose. E como, neste caso, estamos a falar de algo para daqui a poucos anos... espero cá estar para ver, sem precisar de repetir a conhecida história de Salazar pretender assistir à morte da tartaruga.

terça-feira, julho 08, 2008

O relatório da SEDES

O problema com os vários diagnósticos sobre o país, como o da Sedes com cujo conteúdo, exceptuando no caso da crise dos camionistas, não tenho qualquer desacordo de fundo, é que são efectuados por entidades que não têm responsabilidades políticas executivas, de governo, e, por isso, não necessitam de as aplicar em condições determinadas por uma dada relação de forças e com consequências políticas, económicas e sociais que esse mesmo executivo terá de saber e conseguir enfrentar. Esse é, de facto, o problema fundamental. Como se diz nas empresas em tempos de execução e revisão de budgets e planos estratégicos, “o papel aceita tudo”! O “pior” é o mercado! Ou seja, no caso do país e da política: o pequeno problema é o que se passa no país real! Quanto ao resto...

A Guerra Aqui (mesmo) Ao Lado (34)

[Editorial Castro, S.A. Order the novel "Tempest Over a Throne: From the Regency to the Republic," by eminent authors Cristobal de Castro, Dionisio Pérez, Pedro de Répide, Luis deOteyza and Diego San José].
Hernandez Palacios. Editorial Castro Lithograph, 7 colors; 44 x 31 cm.

"This poster is an advertisement for a serial novel, Tempestad Sobre Un Trono, published in Spain shortly before the war (circa 1931) when the government of the Second Republic was established. The tri-color flag held by the women and her red cap are all symbols of Republican Spain. The novel may have been an attempt to rouse support for the Republican cause by harkening back to the early 1930s. It may have also been part of the variety of propaganda campaigns encouraging reading, in general, and the reading of communist or anarchist literature, in particular.
Although little information could be found on the novel itself, there exists some information on its authors. First, Cristobal de Castro (b. 1878) is most remembered as a journalist who published articles in several of Madrid's most important periodicals of the late nineteenth and early twentieth centuries. However, he did publish two books of poetry in 1903, Cancionero galante and El amor que pasa, as well as a third dramatic poem in collaboration with López de Alarcón in 1908, Gerineldo. Castro also published a few novels of which his 1921 La interina is most remembered. Pedro de Répide (1882-1947) was a madrileño and worked both as an historian and a novelist in his lifetime. He received some training at the Sorbonne in Paris and worked at the Library of Isabel II there. In the 1930s, he published two historical works one, not surprisingly, on Isabel II (1932) and another on Alfonso XII (1936). In addition, he wrote several novels reflecting on life in Madrid. Diego San José (b. 1885) served as the editor or a collaborator on several periodicals and magazines throughout his lifetime. He also wrote poetry and published a number of historical novels in the 1920s including La carte del rey embrujo (1923), Una pica de Flandes (1925), and De capellán a guerrillero (1929). Information on the other two authors of Tempestad Sobre un Trono Dionisio Pérez and Luis de Oteyza (1883-1964) was not found.
Little information is available on the artist Antonio Hernandez Palacios except that he continued his artistic career after the war in designing film posters and comics."

segunda-feira, julho 07, 2008

História(s) da Música Popular (94)

The Searchers - "Sweets For My Sweet" (Doc Pomus-Mort Shuman)

The Drifters - "Sweets For My Sweet" (Doc Pomus-Mort Shuman)

Doc Pomus & Mort Shuman (V)

Ora a propósito de Pomus e Shuman, vamos lá aqui fazer um paralelo entre a música negra norte-americana da East Coast, do início dos sixties (mais ou menos influenciada pelo "Doo Wop" – neste caso dos Drifters acho que menos), e o Liverpool Sound, aqui representado pelos Searchers (sim, o nome foi mesmo influenciado pelo título do filme homónimo de John Ford – um excelente filme, claro), um dos poucos grupos do merseybeat que não era gerido por Brian Epstein mas que também andou a fazer pela vida lá pelos bares de Hamburgo. Os maiores sucessos dos Searchers foram, de facto, covers de originais americanos e, que eu saiba, apenas um dos seus #1 (Don’t Throw Your Love Away) não o era (corrija-me se estou errado, LT, já que a "British Invasion" é mais a sua especialidade): “Needles and Pins” era um original de Sonny Bono e Jack Nitzsche, interpretado por Jackie DeShannon, e este “Sweets for My Sweet” foi escrito por Doc Pomus e Mort Shuman e originalmente interpretado pelos Drifters, agora já com Rudy Lewis no lugar de Ben E. King. Devo dizer que, ao contrário do que acontece com “Needles and Pins” e “When You Walk In The Room”, em que prefiro as interpretações originais de Jackie DeShannon, neste caso a minha opinião é mais favorável aos Searchers. No próximo post teremos “I Count The Tears” por ambos, neste caso um maior sucesso para os Drifters.